Jesús Rafael Soto ganha nova exposição em São Paulo em celebração de seu centenário

'Cor, Forma, Vibração', na galeria Dan, traz obras do artista que foi representante importante da arte contemporânea latina

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São Paulo

Uma chuva de barras flexíveis, amarelas, longas e finas está suspensa no ar. Ao caminhar entre elas, essas estruturas pousam sobre quem passa, como se fossem tentáculos —e só se desprendem com o avançar do corpo. Parecem ter a intenção de separar quem entra do mundo externo ou, como seu criador definiu, permitir um "espaço-tempo completamente pleno".

Essa é "Penetrável", uma das obras do venezuelano Jesús Rafael Soto presente na exposição individual "Jesús Soto - Cor, Forma, Vibração", inaugurada neste sábado, na galeria Dan, em comemoração dos cem anos do nascimento do artista.

Obra do artista venezuelano Jesús Soto, na Dan Galeria, em São Paulo
Obra do artista venezuelano Jesús Soto, na galeria Dan, em São Paulo - Divulgação

Depois de estudar as sínteses estéticas de Piet Mondrian e conceitos físicos de cinética, Soto tomou para si o desafio de conferir movimento à arte abstrata. Foi assim que iniciou a fazer esculturas baseadas na sobreposição e repetição de estruturas, criando a ilusão de movimento e desafiando as noções de espaço.

Em "Espiral con Amarillo", uma estrutura amarela cheia de curvas e fabricada em metal parece se fundir a um fundo de linhas, criando uma sensação de desmaterialização do objeto —independente de quão fixamente tentamos observar.

"É neste momento singular de diálogo em que a experiência entre o espectador e a obra permite a multiplicação infinita de pontos de vista", afirma o curador da mostra, Franck James Marlot.

Soto priorizou o uso de materiais como aço, alumínio, nylon, PVC e acrílico na elaboração de seus trabalhos, como é possível perceber nas 30 obras expostas em São Paulo —todas criadas entre 1960 e 2000 e trazidas da França, onde fica o ateliê do artista.

O conceito de "penetráveis" foi amplamente usado por Hélio Oiticica para se referir a instalações artísticas nas quais o público pode, de alguma forma, adentrar nas obras. Não por acaso, Soto teve contato direto com o efervescente círculo artístico brasileiro das décadas de 1950 e 1960, fortemente concretista.

Poucos anos antes, o venezuelano participara intensamente do Salon des Réalités Nouvelles, em Paris, que agitava as criações em torno da arte abstrata. Foi nesse momento que galerias europeias, como a Signal, em Londres, começaram a se interessar pelos artistas latino-americanos e Soto expôs junto de Lygia Clark, Sérgio Camargo e Mira Schendel –com quem conviveu também em suas passagens pelas bienais paulistanas em 1956, 1959 e 1963.

Soto era também violonista e apaixonado por música. Certa vez, durante sua estada na cidade para participar da Bienal de São Paulo, o artista chegou a tocar no bar que ficava em frente à pousada onde estava hospedado.

O artista venezuelano Jesús Soto em 1988
O artista venezuelano Jesús Rafael Soto, em 1988 - André Morain/Divulgação

"Quando seu dinheiro acabou, os músicos do local, com quem ele tinha feito amizade, o convidaram para se hospedar em suas casas" conta Flávio Cohn, diretor da Dan. Em 2002, Cohn organizaria a primeira individual de Soto no Brasil.

Foi por meio do estudo de ritmo e composição musical que o venezuelano conseguiu criar a relação entre linhas em suas esculturas, responsáveis pela sensação de movimento. Exemplos são as obras "La Cajita de Villanueva" e "Espiral Double", ambas de 1955.

No momento em que o observador se move, a sobreposição de dois planos com linhas repetidas e dispostos paralelamente fazem a escultura "vibrar", e já não é possível separar seus elementos visuais. Conhecido como "efeito de moiré", esse fenômeno permite a sensação de movimento rotativo rápido da espiral, sem uso de motorização ou eletricidade.

Apesar de sua aproximação com a arte óptica e cinética, que no Brasil teve Almir Mavignier como expoente, Soto recusou o convite para participar da exposição "Responsive Eye", no MoMA, em Nova York, em 1965. Segundo Cohn, o artista acreditava que seu trabalho, especialmente escultural, não se caracterizava como arte óptica –mas tentava ir além.

"A tridimensionalidade faz dele pioneiro na combinação de arte óptica e cinética", argumenta. Até sua morte, em 2005, Soto expôs em diversos museus e galerias de arte contemporânea pelo mundo; a obra "Penetrável" está no acervo do Pompidou, em Paris.

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