Descrição de chapéu The New York Times Moda

Entenda como 'And Just Like That' promove grifes na contramão do 'quiet luxury'

Série derivada de 'Sex and the City' não esconde logos de marcas extravagantes dos figurinos e faz contraponto a 'Succession'

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Vanessa Friedman
The New York Times

De uma hora para outra, a "quiet luxury", ou riqueza discreta, estética que viralizou com "Succession" e seus bilionários tóxicos que usam bonés de beisebol Loro Piana e moletons Tom Ford enquanto lutam até à morte, foi varrida da tela.

Julie Halston como Bitsy von Muffling em 'And Just Like That'
Julie Halston como Bitsy von Muffling em 'And Just Like That' - Craig Blankenhorn/HBO

Em seu lugar temos a logomania, a exibição de marcas que podem ser notadas a quarteirões de distância, com acessórios que balançam e brilham sob a luz ofuscante do direito de se gabar.

Estamos falando das roupas de Carrie e companhia na segunda temporada de "And Just Like That", o reboot de "Sex and the City" que chegou recentemente ao canal de streaming HBO Max –o mesmo que nos deu a família Roy, de Succession.

As duas séries são ambientadas em Nova York, cidade de empreendedores e lutadores, de "Washington Square" e Edith Wharton, de castas sociais em constante evolução que investem alto em sua camuflagem identificável.

Se assistir a "Succession" foi em parte como jogar um jogo de detetive para descobrir qual personagem estava usando qual grife, ver "And Just Like That" é como assistir a um festival de grifes. Os duplos Cs, Fs e Gs são onipresentes.

Aviso: spoilers pela frente. Os excessos fashionistas estão de volta, com tudo. Aqueles closets enormes!

É o yin que se contrapõe ao yang de "Succession": uma verdadeira celebração dos sonhos reconfortantes de autorrealização –ou autoescapismo– embutidos em coisas que podem, na realidade, ser a parte mais marcante de uma série que está cada vez mais desgastada. Uma coisa é certa: as roupas são mais memoráveis que qualquer diálogo que ouvimos na série.

Com a possível exceção, no primeiro episódio, de uma fala de Lisa Todd Wexley, papel de Nicole Ari Parker, que virou um clássico instantâneo, quando a personagem estava a caminho do Met Gala, fazendo referência a seu vestido e chapéu de plumas: "Não é maluquice. É Valentino". Mas essa é a exceção que comprova a regra.

Temos Carrie, interpretada por Sarah Jessica Parker, com seus múltiplos Manolos e Fendis, automedicando-se com compras, voltando para casa carregada de sacolas da Bergdorf Goodman.

Charlotte, vivida por Kristin Davis, tem uma bolsa Burberry para cocô de cachorro –além de um avental e protetores de ouvido da mesma marca– e reclama que sua filha adolescente penhorou seu vestido Chanel para financiar suas aspirações musicais.

Lisa Todd Wexley leva seus filhos para o acampamento de férias usando uma jaqueta verde brilhante e cachecol Louis Vuitton.

Seema, feita por Sarita Choudhury, personagem vista como contida em matéria de roupa graças a seu gosto por cores neutras –com uma estampa de oncinha ocasional no meio– , lamenta dramaticamente o roubo de sua bolsa Birkin da Hermès cor caramelo, um de seus símbolos de identidade, arrancado de suas mãos.

Há Loewe e Pierre Cardin, Altuzarra e Dries Van Noten. Há também um esforço para reaproveitar roupas, como o vestido de noiva de Carrie, a fim de promover as virtudes de usá-las novamente, mas isso praticamente se perde no meio da mesmice toda.

Há uma conta no Instagram em que os estilistas Molly Rogers e Danny Santiago compartilham seus achados, com 277 mil seguidores. Já a conta "Successionfashion" tem 184 mil seguidores na mesma rede.

Tudo isso significa o quê, exatamente? A era do luxo discreto, tão recentemente abraçada pelo TikTok, já está no fim?

Nossa atenção, famosa por se debruçar sobre uma coisa por tão pouco tempo, já passou para outra coisa? Terá a física da moda exercido sua força e produzido uma reação igual e oposta a uma ação anterior?

Até parece. De muitas maneiras, a moda em "And Just Like That" parece protestar demais. Em parte porque parece uma regurgitação da curtição que a antecedeu, que já era em si mesma uma reação ao minimalismo do início dos anos 1990 que, ele próprio, nasceu na recessão daquela década.

O fato é que, não importa o quanto se fala de "quiet luxury" ou riqueza discreta ou como você quiser chamá-lo, e de como ela é a "grande tendência recente da moda" de 2023, ela não é uma invenção recente.

Esse conceito existe desde os tempos em que chamado de "elegância surrada" ou "old money" —indicativos de um tipo de produto que não parecia abertamente caro, mas revelava uma genealogia estética.

A diferença entre dinheiro novo e dinheiro herdado, que a moda cooptou e regurgitou para seus próprios fins.

Do mesmo modo como o consumismo mais obviamente sinalizado existe desde que Louis Vuitton primeiro estampou suas iniciais em malas de couro em 1896, ou que Jay Gatsby começou a jogar fora suas camisas.

Há décadas estamos declarando "o fim dos logos" ou então "a ascensão da riqueza discreta".

Há ciclos em que uma coisa está mais presente que outra –geralmente têm a ver com os ciclos econômicos recessivos, quando ostentar riqueza não bem visto– , mas elas existem lado a lado. Uma ajuda a definir a outra.

Considere que, durante a incerteza econômica atual, ambiente favorável para para impulsionar artigos luxuosos discretos, as grifes globais são identificadas mais facilmente. É o caso da Louis Vuitton, Chanel e Hermès.

Em sua estreia recente para a Louis Vuitton, Pharrell Williams lançou uma bolsa chamada Millionaire que custa US$ 1 milhão. Isso mesmo. Ela é amarelo forte com detalhes em ouro e diamantes.

O que é mais interessante, enquanto Carrie e sua turma seguem seu caminho alegre, é como os dois estilos agora parecem performativos, clichês. A partir do momento em que chegam à televisão, é impossível não reconhecer o figurino.

Ou o fato de que, sob qual ótica você olhar, são simplesmente maneiras diferentes de expressar riqueza, em todos seus estratos decorativos. E a riqueza em si nunca sai de moda.

Tradução de Clara Allain

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