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'Disco Boy' destaca bom Franz Rogowski, mas é déjà vu de boas ideias

Longa de Giacomo Abbruzzese força espelhamento entre soldado da Legião Estrangeira e líder de grupo rebelde

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Disbo Boy: Choque entre Mundos

  • Quando Em cartaz nos cinemas
  • Classificação 12 anos
  • Elenco Franz Rogowski, Morr N'diaye, Laetitia Ky, Leon Lucev
  • Produção França, Itália, Bélgica, Polônia, 2023
  • Direção Giacomo Abbruzzese

O alemão Franz Rogowski é um ator de figura estranha. Tem uma cicatriz no lábio, um nariz desajeitadamente adunco, olhos enigmáticos. Seu rosto parece uma mescla entre os de Joaquin Phoenix e Vincent Gallo, mas uma mistura que não deu lá muito certo.

Ou talvez tenha dado, já que o ator tem sido recorrentemente requisitado para filmes de diretores de primeira grandeza nos últimos anos, de Michael Haneke a Ira Sachs, passando por Christian Petzold e Terrence Malick.

Cena do filme 'Disco Boy: Choque Entre Mundos', de Giacomo Abbruzzese
Franz Rogowski em cena do filme 'Disco Boy: Choque Entre Mundos', de Giacomo Abbruzzese - Divulgação

Esses cineastas devem ver algum charme especial em sua insólita expressividade —qualidade que Rogowski, inclusive, sabe explorar bem em suas performances, como comprova "Disco Boy: Choque Entre Mundos", primeiro longa de ficção do cineasta italiano Giacomo Abbruzzese.

O ator dá vida a Alexei, um bielorrusso que atravessa a fronteira da Polônia com um grupo de torcedores de futebol, como se fosse ao país vizinho apenas assistir a uma partida e voltar logo para casa. O rapaz consegue um visto para ficar três dias na União Europeia, especificamente em território polonês. Só que ele mal chega e resolve se mandar para a França, atrás da famigerada "vida melhor" longe de sua terra natal.

Ele decide entrar para a Legião Estrangeira francesa, em busca de se tornar legalmente cidadão daquele país —qualquer homem, após alguns anos de alistamento, pode conseguir cidadania por esta via.

Após treinamentos rígidos, Alexei é enviado a uma missão na Nigéria, onde ele e seus colegas devem resgatar dois franceses sequestrados por guerrilheiros que tentam impedir a exploração de petróleo por multinacionais na região.

A certo ponto, Alexei se separa dos demais militares e fica cara a cara com Jomo, o líder dos rebeldes. O legionário mata o oponente, e desde esse episódio seu comportamento muda por completo; é como se Alexei passasse a viver sob influência espiritual do homem que assassinou.

A trama é fictícia, mas o grupo revolucionário nigeriano de fato existe, chama-se Mend (Movimento para a Emancipação do Delta do Níger), que desde os anos 2000 se insurge tanto contra o governo da Nigéria quanto contra estrangeiros que se metem a extrair o petróleo local.

Mas o filme não dá muita importância para contextualizar ou detalhar o seu real funcionamento. Mostra-o estereotipadamente, como um bando rebelde que, no fundo, é dominado por aspirações pequeno-burguesas. Jomo diz que, em um contexto fora da guerrilha, gostaria de ser dançarino em uma boate.

Abbruzzese cria um subtexto de natureza mística para criar esse líder revolucionário, mas nunca explica exatamente em que medida seria isso que tornou Jomo o chefe dos rebeldes, ou mesmo qual a relação entre essa sua espiritualidade e sua luta política. O cineasta é mais vago ainda quando sugere que existe algum tipo de paralelo entre o soldado e o guerrilheiro, como se fossem semelhantes, apenas em polos opostos em termos bélicos.

Sim: Alexei e Jomo são dois homens que nasceram em países opressores e que, ao seu modo, tentam superar a sina traçada por seus governantes. Só que, tirando isso, os dois não têm muita coisa em comum, a não ser talvez o fato de serem terráqueos. Mas Abbruzzese insiste em um espelhamento forçado entre ambos, que nunca é convincente.

A trajetória de Alexei nos é apresentada com um fundo musical eletrônico, composto pelo DJ Vitalic. Se esse procedimento já não tivesse sido usado recentemente com tamanha eficiência pelos irmãos Safdie, em filmes como "Bom Comportamento", de 2017, talvez aqui tivesse um resultado mais impactante, com mais frescor.

Também há na câmera de Abbruzzese uma curiosa busca por mostrar uma fisicalidade algo coreografada dos corpos dos soldados, mas também isso, no fim das contas, parece acima de tudo uma derivação de algo já feito —no caso, da maneira como Claire Denis fez em "Bom Trabalho", de 1999.

E o cineasta se põe constantemente a pinçar procedimentos estéticos bem-sucedidos de diversos outros cineastas (notadamente Léos Carax e Mati Diop) para reutilizá-los em "Disco Boy". Em termos de estilo, o filme é cheio de boas ideias, mas que invariavelmente terminam por deixar um gosto residual de déjà-vu.

Não se pode exigir muito de um cineasta de primeira viagem, mas Abbruzzese mostra em sua estreia que ainda precisa encontrar um estilo próprio. E, sobretudo, elaborar histórias menos calculadas e com mais de organicidade em seus filmes vindouros.

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