Drama fútil? Veja músicas de Taylor Swift sobre luto, aborto, misoginia e suicídio

Dona de hits dançantes, cantora ganhou respeito da indústria ao escrever sobre temas difíceis e amadurecer aos olhos do público

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São Paulo

Taylor Swift, que se apresenta em seis shows no Brasil até 26 de novembro, há muito deixou para trás as letras melosas sobre príncipes encantados e pés na bunda que a fizeram famosa em 2006.

Vencedora de 12 troféus do Grammy e reconhecida como uma das compositoras mais talentosas de sua geração, ela ostenta hoje uma base de fãs que vai de adolescentes a doutores em filosofia passando por Cat Power, Drake, Billy Joel, Eddie Vedder e até Paul Stanley, vocalista da banda de hard rock Kiss, que definiu uma das apresentações recentes da turnê "Eras Tour" como "um show fenomenal de uma artista fenomenal".

Taylor Swift em apresentação da "The Eras Tour"
Taylor Swift em apresentação da "The Eras Tour" nos Estados Unidos - Divulgação

Como a cantora conseguiu reunir a admiração de tantas tribos em torno de seu império bilionário? Talvez não seja por falar de amor como uma garota fútil, como apontam alguns críticos à sua música e seus fãs.

Swift cria letras e melodias que espelham com ironia e vulnerabilidade situações familiares: a dor de um coração partido, sim; mas também o medo de envelhecer, o luto, o adoecimento mental, a misoginia, os problemas de autoimagem e as preocupações políticas de sua geração.

Política

"Miss Americana & The Heartbreak Prince", música que abre a turnê atual, aborda a vitória de Donald Trump nas eleições de 2016 através de uma intrincada metáfora em que a corrida eleitoral é retratada como os corredores de um típico "high school" americano.

No documentário "Miss Americana", Swift relata os desafios que enfrentou nos bastidores para se posicionar publicamente a favor dos direitos LGBTQIA+ e para apoiar candidaturas democratas no conservador estado do Tennessee, onde iniciou a carreira.

O filme inclui ainda a faixa "Only The Young", hino político que encorajava jovens americanos a se registrarem para votar nas eleições de 2020.

Muitos fãs também acreditam que "Change", lançada em 2008, foi uma demonstração velada de apoio a Obama. Na época, diz Swift, gravadoras pressionavam cantoras country a não se posicionarem politicamente, sob risco de serem ostracizadas da música —como ocorrera com o trio Dixie Chicks após críticas a Bush.

Onze anos separam "Change" do single "You Need To Calm Down", pop divertido e irônico em que a cantora, já livre das amarras de antes, critica abertamente a histeria moral de conservadores americanos em um clipe colorido e recheado de membros das comunidades gay e trans.

Anorexia e distúrbios alimentares

Foi também no documentário de 2020 que Swift revelou aos fãs sua luta contra a anorexia, notadamente durante o período de divulgação do álbum "1989", em 2015. O período de badalação com modelos da Victoria’s Secret e auge do distúrbio alimentar é retratado nos versos de "You’re On Your Own, Kid", em que a cantora relembra com pesar: "I hosted parties/and starved my body" [eu dei festas/e deixei meu corpo passar fome, em inglês].

A cantora em maio de 2015, durante o Billboard Awards, em Las Vegas - L.E. Baskow

Suicídio

"Forever Winter", lançada em 2021 na versão regravada do álbum "Red", retrata suas tentativas de ajudar um amigo que lidava com depressão e vício. Embora a cantora não fale sobre o assunto, acredita-se que a canção tenha sido composta em homenagem a um de seus melhores amigos, Jeff Lang, morto em 2010, aos 21 anos —quando ainda era "jovem demais para saber que as coisas melhoram", canta Swift.

Depressão e cancelamento

"Evermore", do álbum de mesmo nome lançado em 2021, abarca um período mais recluso, em que a cantora parou de dar entrevistas e de se importar em se explicar para a mídia.

A fase começou ainda em 2016, quando Swift foi cancelada online após um ciclo de muita exposição, alguns términos notórios e uma briga pública com Kim Kardashian e Kanye West. Ela não foi vista em público por quase um ano, e a canção retrata o período —ou, em suas palavras, a violência dos seus dias de fundo de poço.

Em "Castles Crumbling", dueto lançado em 2023 com Hayley Williams, do Paramore, a dupla também reflete sobre a perda de prestígio e fãs após polêmicas públicas.

Traumas e abuso emocional

"All Too Well", clássico entre os fãs que ganhou uma versão de impressionantes 10 minutos em 2022, retrata o término da cantora com o ator Jake Gyllenhaal, em 2011. Ele tinha 29 anos e ela, 20. Há na letra o reconhecimento de que a diferença de idade a fez sofrer um bocado, mas o final é irônico: "Nunca fui boa em contar piadas, mas essa é sobre como eu vou envelhecer e suas namoradas continuarão tendo minha idade", diz a canção. O ator, hoje com 42 anos, namora a modelo Jeanne Cadieu, de 27.

Jake Gyllenhaal e Taylor Swift namoraram entre 2010 e 2011 - Reprodução/Youtube

O cantor John Mayer não teve a mesma sorte de ganhar uma composição com algum humor nos versos de Swift: o relacionamento traumático quando a cantora tinha 19, e ele 32, é registrado em "Could’ve, Would’ve, Should’ve", uma balada angustiante em que a cantora repete à exaustão que se arrepende do "affair" e fala sobre abuso, manipulação, e a perda de sua virgindade e juventude.

Vício

Swift escreveu a triste "This Is Me Trying" sobre a dificuldade de alcoolistas em manter a sobriedade, afirmou em uma apresentação. Não se sabe o quanto da letra é pessoal. "Clean" também fala sobre sobriedade, mas aquela conquistada após um relacionamento inebriante. Fãs americanos, no entanto, tornaram a canção um símbolo da recuperação da dependência química.

Infância e violência doméstica

A cantora retrata com doçura a saudade da infância e o medo de crescer em "Never Grow Up". "Seven", mais obscura, fala sobre a alegria selvagem da infância e a ingenuidade diante da violência doméstica.

Medo de envelhecer

É o tema de "Nothing New", dueto com Phoebe Bridgers em que Swift confessa seu medo de ser substituída por artistas mais jovens e desejáveis. É, afinal, o que viu acontecer com muitas outras antes dela.

O receio ganha seu clímax na ponte da canção, especialidade de Swift em suas composições, em que ela cria a cena de um encontro com uma novidade da música. "[Ela terá] o brilho que você só tem aos 17 anos", diz a canção. "Direi que estou feliz por ela/Depois chorarei até dormir".

Aborto

Swift fala pouco sobre sua vida pessoal hoje, e era ainda mais reclusa durante o relacionamento de seis anos com Joe Alwyn, cujo término foi anunciado em abril.

Ainda vivendo com o ator britânico, a cantora lançou "Bigger Than The Whole Sky", em 2022, e não negou, nem confirmou, a tese de que a faixa aborda seu luto após um aborto espontâneo. Os versos não deixam muita margem para outra interpretação —tanto que fãs uniram-se em campanha para que a canção fosse compartilhada com aviso de gatilho para mulheres que passaram pela experiência.

Câncer e luto

"Ronan", do álbum "Red", é um tributo da cantora a um fã mirim homônimo que morreu com um tumor no cérebro em 2011, aos quatro anos. A mãe do menino, Maya Thompson, também foi homenageada como autora nos créditos da canção.

Em "Soon You’ll Get Better", lançada em 2019, Taylor descreve a batalha de sua própria mãe, Andrea, contra o câncer. Em "Marjorie", apresentada na atual turnê, a cantora relembra a morte da avó, a cantora de ópera Marjorie Finlay.

Já "Epiphany", lançada na pandemia, retrata um profissional de saúde que tenta ajudar um paciente entre a vida e a morte, enquanto espera por uma epifania que possa salvá-los.

Terapia e autorreflexão

Fazer terapia está na moda, e Swift também parece ter deitado-se no divã para lidar com os dilemas existenciais de sua vida incomum —e transformá-los em melodias familiares.

"The Lucky One" reflete sobre a realidade por trás do sucesso e as aparências. "Anti-Hero", single de 2023, capta o momento em que a artista cresce, deixa de culpar desilusões amorosas por sua infelicidade e anuncia que, sim, ela é a razão de seus próprios problemas. E também a solução.

"You’re on Your Own, Kid" —você está sozinha, criança— é autoexplicativa: marca a fase de amadurecimento em que fantasias românticas dão lugar à constatação resignada, mas otimista, da solidão inerente a todo ser humano.

Machismo e misoginia

Swift tem sido uma das vozes mais proeminentes a criticar o machismo e a misoginia em Hollywood. As críticas já estavam presentes, com ironia, nos hits "Blank Space" e "Look What You Made Me Do", de 2014, mas ganharam força com "Mad Woman" (2021), "The Man" (2019) e a nova "Slut!".

Na primeira, nem as mulheres são poupadas. "Mulheres gostam de 'caçar bruxas’ também, e fazer o trabalho sujo para você", canta ela.

Em "The Man", que ganha performance ostensiva na "Eras Tour", Swift veste um terno no palco e ironiza a figura de "Leo [Leonardo DiCaprio, famoso por namorar modelos mais jovens] em Saint-Tropez". E provoca —se fosse um homem com seus feitos e conquistas, ela seria "o cara". Sendo Taylor, é considerada só uma mocinha com dramas fúteis.

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