Fotojornalistas se reúnem na Folha para inaugurar acervo no Google Arts & Culture

Profissionais discutiram a informação por imagens na era das redes sociais em evento do projeto 'Folha: Uma Lente no Brasil'

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São Paulo

No dia 19 de fevereiro de 1921, circulava a primeira edição impressa da Folha da Noite, que anos mais tarde daria origem a este jornal. Devido à época, aquela edição trazia apenas uma imagem, em branco e preto e com pouca nitidez. A reportagem "Um largo pittoresco" falava sobre o abandono do largo de São Bento, em São Paulo.

Chance Coughenour, Gerente de Programa Sênior, do Google Arts & Culture, Henrique Matos, Diretor de Parcerias de Notícias na América Latina, e Sérgio Davila, diretor da Folha, falam sobre o Projeto Folha/Google 'Olhares - Uma Viagem pela História através da Fotografia', no Auditório da Folha de SP - Zanone Fraissat/ Folhapress

"Era uma denúncia, mostrando o DNA do jornal já em sua primeira edição", disse o diretor de Redação, Sérgio Dávila, que deu início ao evento que lançou o "Folha: Uma Lente No Brasil", projeto que disponibiliza 10 mil fotos do acervo do jornal de forma gratuita no Google Arts & Culture —e que ainda irá se expandir.

O passeio virtual pelas imagens históricas foi inspirado em características da edição física do jornal, disse Chance Coughenour, gerente de programa do Google Arts & Culture e arqueólogo digital. "Hoje, a tecnologia permite desvendar mais camadas históricas sem precisar destruir", disse.

Especialista no império Inca, Coughenour descreveu como a arqueologia digital pode, por exemplo, "encontrar um templo em meio à floresta", retirando camadas de folhagens artificialmente de uma fotografia feita do alto.

Segundo Carlos Ponce de Leon, superintendente do Grupo Folha, a iniciativa reforça o compromisso da Folha e do Google com "a preservação da memória jornalística, a valorização do trabalho de todos os repórteres-fotográficos e com a própria história."

"Nossa missão é fazer com que a arte e a cultura sejam mais acessíveis para pessoas ao no mundo", afirmou Coughenour, do Google.

Marlene Bergamo, no jornal há 30 anos, foi a primeira fotógrafa a falar no evento. Influenciada pela marcante fotografia da menina vietnamita correndo de uma bomba de napalm na Guerra do Vietnã, composto à base de gasolina que provoca queimaduras severas, Bergamo decidiu se tornar fotojornalista com a intenção de causar algum impacto social.

Foi então que passou a cobrir a violência policial das prisões e periferias brasileiras. Entre seus cliques, está uma foto dos corpos sem vida de presidiários, assassinados no massacre do Carandiru.

"O governo negava o que havia acontecido", diz. Foi então que ela entrou na fila de familiares dos mortos, no IML, para o reconhecimento de cadáveres —e fez a foto. Quando o clique saiu no jornal, o governo reconheceu publicamente a morte dos 111 homens.

Juca Varella, fotojornalista que cobriu a Guerra do Iraque ao lado de Dávila, estava na mesa. A dupla era a única de jornalistas brasileiros em Bagdá quando o conflito teve início, em março de 2003.

"Quando fomos não tinha uma guerra marcada, mas nos preparamos para isso. Compramos capacetes, coletes e máscaras antiarmas biológicas", disse Varella. "Essa guerra começou por causa da mentira de que Saddam Hussein estava produzindo armas em massa."

Cobrir uma guerra nunca vem como um pedido, mas como convite do editor, que Varella não hesitou em aceitar. "Por 35 dias, mostramos o lado dos bombardeados. Bagdá estava sitiada, não tinha como sair. É como se estivéssemos cobrindo a guerra hoje de dentro de Gaza."

Lalo de Almeida, fotógrafo do jornal responsável por cobrir questões socioambientais na Amazônia há dez anos, lamentou a dificuldade de dar andamento a grandes coberturas hoje, na era da internet que, segundo ele, desestruturou os jornais e suas finanças.

"Trabalhar na Amazônia custa muito. O que está nesse arquivo foi caro para ser produzido, e precisamos pensar em outra maneira de viabilizar esse trabalho", disse.

"Hoje temos pessoas que não leem texto, mas imagens. A pessoa bate o olho e precisa se informar. Não basta dizer o que aconteceu, nossa missão é interpretativa também", afirmou a fotógrafa Gabriela Biló, responsável pela cobertura de Brasília no jornal, sobre a influência das redes sociais no trabalho do fotografo.

Sérgio Burgi, coordenador de fotografia do Instituto Moreira Salles, complementou a reflexão, relembrando que "toda imagem é uma escolha e um corte". "Vivemos um momento de ilustração por algoritmo. Nosso problema de comunicação é social. Nunca fui à Lua, mas acho que não me espantaria se fosse, porque acredito nas fotos."

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