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Biografias recuperam Tia Amélia e Zaquia Jorge, ícones da cena musical carioca

Livros retratam duas mulheres talentosas e modernas que enfrentaram preconceito e se popularizaram nos anos 1950

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Rio de Janeiro

Duas mulheres talentosas e modernas, que enfrentaram preconceito e imposições culturais, foram populares na mesma época, os anos 1950, agora são resgatadas do esquecimento em duas biografias: "Tia Amélia: O Piano e a Vida Incrível da Compositora", de Jeanne de Castro, e "Estrela de Madureira", de Marcelo Moutinho.

A vedete Zaquia Jorge foi biografada em 'Estrela de Madureira', livro publicado na Record por Marcelo Moutinho
A vedete Zaquia Jorge foi biografada em 'Estrela de Madureira', livro publicado na Record por Marcelo Moutinho - Divulgação

Com subtítulo "A Trajetória da Vedete Zaquia Jorge, por Quem Toda a Cidade Chorou", o trabalho de Moutinho é um capítulo do livro que Bentinho, já metamorfoseado em Dom Casmurro e morando no Engenho Novo, prometia escrever sobre a história dos subúrbios cariocas.

A grande cartada de Zaquia Jorge foi fazer o caminho inverso da fama e trocar Ipanema e Copacabana por Madureira. Mas antes ela teve de se tornar uma vedete completa.

O autor explica os degraus do rebolado: a "girl" ocupava o fundo do palco; as "soubrettes" tinham direito a cantar e dançar um pouquinho; antes do estrelato com todas as luzes e o nome em destaque nos letreiros e cartazes passava-se pelo estágio de "vedetinha". Todas tinham de se preocupar com os "corujas", que as abordavam para oferecer carona ou dinheiro, na expectativa de uma noite de sexo.

Driblando o ambiente machista e as adversidades financeiras, Zaquia venceu. Atuou ao lado de Dercy Gonçalves, foi pioneira do teatro de revista, participou de chanchadas e abriu uma casa de espetáculos na zona sul.

Quando migrou para Madureira, instalando um teatro em frente à estação de trem, enfrentou uma sociedade conservadora. Lá, vedete era sinônimo de outra profissão. Mas superou a caretice, valendo-se de diplomacia e tino comercial e, sobretudo, espalhando diversão.

Sua morte, aos 33 anos por afogamento na Barra da Tijuca (ela havia bebido algumas doses a mais de uísque) originou um clássico samba carnavalesco, "Madureira Chorou", lançado em 1958, um ano após a tragédia.

A investigação de Marcelo Moutinho —que consultou arquivos com roteiros de peças, desvelou filmes raros e varejou coleções de revistas do arco-da-velha— reconstitui os bastidores, em 1974, da disputa do samba-enredo do Império Serrano em homenagem à artista.

Gravado por Roberto Ribeiro, "Estrela de Madureira", que ficou em segundo lugar, alterou a história do gênero, tornando-se mais lembrado que o campeão.

Enquanto Zaquia Jorge alegrava os suburbanos, Tia Amélia espantava a vanguarda musical com seu piano cheio de balanço e pegada jazzística.

Amélia Brandão Nery, a Tia Amélia, pianista e compositora
Amélia Brandão Nery, a Tia Amélia, pianista e compositora - Reprodução

Em 1953, aos 56 anos, com visual de "velhinha" —corpo rechonchudo e cabelos presos em coque, camisa de botão escura fechada até o pescoço—, ela conseguia ser uma das maiores atrações do enfumaçado Clube da Chave, boate de grã-finos que funcionava no Posto 6 de Copacabana.

Apresentando-se ao lado da turma da pesada —Tom Jobim, Dolores Duran, Johnny Alf, João Donato, João Gilberto—, Tia Amélia aproveitava para mostrar suas composições, como "Chora Coração", e colecionar admiradores, de Sérgio Porto a Ary Barroso, passando pelo maestro Radamés Gnattali. Encantado, Vinicius de Moraes falava "no equilíbrio do complexo melódico, na sabedoria instintiva da harmonização".

O que pouca gente sabia é que aquela senhorinha simpática não era uma revelação tardia. O nome artístico escondia a pernambucana Amélia Brandão Nery, que na década de 1920 largou não só o marido como a vida num engenho de açúcar, carregou os três filhos e foi tentar a sorte com a música no Recife.

Com seu "piano assombroso", na definição de Ruy Castro, excursionou pelo Brasil, América Latina e Estados Unidos, trocou figurinhas com Ernesto Nazareth, Chiquinha Gonzaga, Pixinguinha, Jacob do Bandolim.

A partir do Clube da Chave e da amizade com a cantora Carmélia Alves, reinventou uma segunda carreira no disco e na televisão, entre 1958 e 1967. Nas emissoras Rio, Tupi e Cultura, comandou dois programas de sucesso: "Velhas Estampas" e "Tia Amélia, Suas Histórias e Seu Piano Antigo".

A pianista morreu em 1983, aos 86 anos. Como homenagem póstuma, ganhou de Egberto Gismonti a composição "Sete Anéis", inspirada "na polirritmia, no sorriso, no entusiasmo e na espontaneidade musical de Tia Amélia". A biografia escrita por Jeanne de Castro recupera a sua importância.

Estrela de Madureira - A Trajetória da Vedete Zaquia Jorge, por Quem Toda a Cidade Chorou

  • Preço R$ 84,90 (182 págs.)
  • Autoria Marcelo Moutinho
  • Editora Record

Tia Amélia – O Piano e a Vida Incrível da Compositora

  • Preço R$ 86 (264 págs.)
  • Autoria Jeanne de Castro
  • Editora Tipografia Musical
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