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Tendência de exposições digitais leva multidões a 'entrar' em quadros

Mostras em Paris exibem projeções virtuais de obras de Da Vinci e Van Gogh

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Celina Côrtes

Agora que até a “Mona Lisa”, obra-prima de Leonardo da Vinci, será exibida virtualmente no tradicionalíssimo Museu do Louvre a partir do dia 24 de outubro, não restam mais dúvidas: as exposições imersivas vieram para ficar.

A moda começou a se consolidar no Atelier des Lumières em abril de 2018, com a exposição de Gustav Klimt e Egon Schiele, que em nove meses levou 4 milhões de visitantes ao espaço parisiense. 

O Atelier continua provocando filas com a mostra interativa de Van Gogh, que requer compra antecipada de ingressos. Tudo bem, esse tipo de antecipação também é vital nas concorridas exposições de museus convencionais, mas basta falar em experiência imersiva para despertar o interesse de multidões, ávidas em interagir com as obras.

A experiência digital da “Mona Lisa” permitirá aos visitantes, por meios de óculos especiais, observar minúcias do quadro mais famoso do mundo, com impressionantes proximidade e resolução. Será como se os visitantes ultrapassassem o vidro protetor do museu para verificar os detalhes da obra invisíveis a olho nu. 

A exposição, “Mona Lisa: Além do Vidro”, apresentará descobertas científicas sobre os métodos usados por Da Vinci no quadro pintado entre 1503 e 1506 com a técnica sfumato, além de informações adicionais sobre a nobre italiana Lisa del Giocondo, inspiradora do trabalho.

Da Vinci talvez pudesse ver com alguma naturalidade a exibição virtual de sua obra-prima, dada sua intimidade com a inovação, que incluía até a dissecação de cadáveres para aperfeiçoar seus quadros. Já Van Gogh, que não conheceu sucesso e reconhecimento em vida, ficaria atônito se entrasse na exposição do Atelier des Lumières, montada na antiga fundação de aço da família Plichon, na capital francesa

A sensação de “entrar” em um quadro de Van Gogh é arrebatadora. Um dos pontos altos das imagens projetadas nas paredes de dez metros de altura do galpão é o tremular das águas do quadro “Noite Estrelada”, que dá nome à exposição. A intensidade das pinceladas se torna mais nítida pela ampliação da caótica e poética criação de Van Gogh.

As projeções, iniciadas pelo ambiente na Holanda em que o pintor passou seus primeiros anos de vida, também contemplam outros locais retratados em suas telas, como Arles, Paris e Auvers-sur-Oise.

Tudo isso pode ser apreciado por visitantes em movimento, sentados no chão nos carretéis de madeira espalhados pelo espaço, nas escadas que levam a um segundo piso ou mesmo lá de cima, com vista panorâmica. O público pode filmar e fotografar as imagens, desde que o flash não seja acionado. 

Trata-se de uma situação bem diferente da vivenciada nas passivas exposições convencionais. Além de atraente ao público, a experiência digital pode representar um fator de economia para os museus. Sem a necessidade de ter no acervo as obras reais, eles deixariam de arcar com os milionários custos dos seguros.

Durante 35 minutos, tempo de visitação que cada pessoa pode repetir quantas vezes quiser —eu fiz três passeios consecutivos—, as imagens, estáticas ou em movimento, são acompanhadas por trilha sonora escolhida a dedo pelos realizadores: de Janis Joplin a Miles Davis, passando por Vivaldi e Puccini.

Curiosamente, não há um único francês entre os organizadores da mostra de Van Gogh. Todos são italianos. “Eu quis conduzir os visitantes além da tradicional experiência de observar, levando-os ao coração das obras, de maneira que eles se tornem um componente integral da experiência imersiva”, explica Gianfranco Iannuzzi, coordenador dos espaços imersivos.

E como Van Gogh sofreu fortes influências da arte japonesa e sentiu-se no Japão ao chegar a Provence, a mostra tem uma sequência, “Sonho Japonês, Imagens de um Mundo Flutuante”, cujo auge é uma dança de lanternas japonesas flutuando pelo gigantesco espaço.

O Atelier des Lumières —que guarda a sete chaves qual será sua próxima exposição, em 2020— já tem filiais em Baux-de-Provence, na Coreia do Sul e abre outra no ano que vem na cidade de Bordeaux.

Para a húngara Zuzana Paternostro, radicada no Brasil, que por mais de 30 anos exerceu a curadoria de pinturas estrangeiras no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, “é muito importante que a arte avance além dos muros dos castelos, para aproximar ainda mais o público das obras, rompendo barreiras e fronteiras”.


Celina Côrtes é jornalista e escritora.

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