Novo presidente da Volks veio de fora. Isso é uma vantagem e uma desvantagem

Herbert Diess precisa demonstrar que é capaz de se enquadrar à cultura da companhia

Herbert Diess novo presidente mundial da Volkswagen
Herbert Diess novo presidente mundial da Volkswagen - Fabian Bimmer / REUTERS
Jack Ewing
Wolfsburg, Alemanha | The New York Times

Herbert Diess tem uma grande vantagem, ao assumir a presidência-executiva da Volkswagen, depois de ser nomeado oficialmente na quinta-feira. Ele não vem de Wolfsburg, a sede da montadora.

Mas também tem uma grande desvantagem: ele não vem de Wolfsburg.

Como relativo novato na empresa, o ex-executivo da BMW foi contratado apenas dois meses antes que estourasse o escândalo quanto à trapaça sobre as emissões de poluentes pelos veículos da Volkswagen. Ele não está associado aos delitos que continuam a pesar fortemente sobre a imagem e as finanças da empresa, que é alvo de investigações criminais extensas pelas autoridades da Alemanha e dos Estados Unidos.

Isso diferencia Diess de seu predecessor, Matthias Müller. Embora Müller negue que estivesse informado sobre o software ilegal que permitia que os motores da empresa contornassem a regulamentação quanto a emissões de poluentes, já detinha postos importantes na Volkswagen quando o chamado "dispositivo manipulador" estava sendo desenvolvido e implementado.

Mas ao contrário de Müller, que fez toda sua carreira na Volkswagen e nas subsidiárias da empresa antes de ser derrubado do cargo na semana passada, Diess veio de fora. Apontado para a presidência executiva da Volkswagen pelo conselho da empresa em uma reunião na quinta-feira, ele agora precisa demonstrar que é capaz de se enquadrar à cultura notoriamente insular e hierárquica da companhia.

O conselho da Volkswagen centralizou bastante o poder nas mãos de Diess, como parte de uma grande reorganização também anunciada na quinta-feira. Ele assumirá o controle das marcas SEAT e Skoda, que respondem pelos modelos de baixo preço do grupo, e manterá o controle da divisão que fabrica os carros da marca Volkswagen, que ele já detinha. Diess também terá responsabilidade direta por pesquisa e desenvolvimento.

E a Volkswagen deu a entender que prepararia suas divisões de caminhões e ônibus para venda no mercado de ações, uma mudança de rumo importante, depois de décadas de esforços de expansão por presidentes-executivos precedentes.

Até recentemente, o tamanho tinha valor essencial para a identidade da Volkswagen. A cultura única da empresa predomina não só em seu vasto complexo fabril mas, do outro lado de um canal para barcas, em toda a cidade de 125 mil habitantes que abriga sua sede.

Mudança de cultura 

A Volkswagen é o maior empregador de Wolfsburg, a maior fonte de arrecadação tributária da cidade, e é dona até do time local de futebol profissional.

Status na empresa traz automaticamente status na comunidade. As licenças dos carros de funcionários da Volkswagen seguem códigos cujas letras - compreendidas por todo mundo em Wolfsburg - indicam se o motorista é executivo importante na companhia, ou mesmo cônjuge de um dirigente.

O etos conformista profundamente enraizado na Volkswagen foi visto como uma das causas diretas do escândalo. Foi por causa dele que ninguém contestou os executivos que desenvolveram o software ilegal a fim de encobrir as emissões excessivas de poluentes por alguns motores da empresa, e por causa dele que ninguém reportou os delitos a autoridades externas por quase uma década.

Mudar a cultura da empresa é uma das tarefas primárias de Diess. E é também uma das cláusulas do acordo que a Volkswagen assinou com as autoridades americanas a fim de encerrar os processos civis e criminais associados aos delitos da empresa.

A Volkswagen terá de criar um sistema sólido para denúncia de irregularidades, e convencer seus empregados a acreditar que podem usá-lo.

"Para Diess, mudar a cultura certamente é a tarefa mais difícil", disse Ferdinand Dudenhöffer, professor na Universidade de Duisburg-Essen que pesquisa sobre a indústria automobilística.

Müller assumiu o comando do grupo no final de 2015, depois que o escândalo veio a público, mas parecia ter perdido o pique, nos últimos meses. Ele vinha expressando frustração com a demora em deixar o escândalo para trás.

Diess ganhou prestígio com as famílias Porsche e Piëch, que controlam a maior parte das ações com direito a voto da Volkswagen, ao elevar a lucratividade da divisão que produz os carros com a marca Volkswagen, a despeito do declínio no número de unidades vendidas.

"Ele demonstrou de forma impressionante a velocidade e rigor com que pode implementar transformações radicais", afirmou Hans Dieter Pötsch, presidente do conselho da Volkswagen e confidente da família Porsche, em comunicado.

Mas Dudenhöffer aponta que Diess ainda assim terá de lidar com o poder extraordinário que os trabalhadores da Volkswagen e políticos locais exercem sobre a estratégia da companhia.

O estado alemão da Baixa Saxônia detém 20% das ações da empresa e conta com dois representantes em seu conselho. Representantes dos trabalhadores ocupam 10 dos 20 assentos do conselho, o que significa que sindicatos e o governo estadual, unidos, controlam a companhia.

"Não existe balanço de poder no conselho", disse Dudenhöffer.

Tradução de PAULO MIGLIACCI.

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