Governo não incentiva desmatamento, mas não o coíbe como deveria, diz presidente da Suzano

Para executivo, que prega reflorestamento com mata nativa, nenhuma gestão nos últimos 30 anos defendeu a Amazônia genuinamente

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Em meio à mais recente crise do governo Bolsonaro, intensificada com a série de queimadas na Amazônia e sua repercussão internacional, o presidente da fabricante de celulose Suzano, Walter Schalka, 58, tem se notabilizado pela defesa da floresta.

Em discurso em evento em São Paulo na última semana, o executivo conclamou uma plateia de empresários a atuarem contra o desmatamento. 

À Folha Schalka diz que a degradação da Amazônia interessa a poucos, como exportadores de madeira ilegal e grileiros de terra. Ele afirma não acreditar que o governo incentive a derrubada da floresta, mas diz que a gestão Bolsonaro não coíbe o desmatamento como deveria.

Crítico da atual polarização entre direita e esquerda, ele afirma que a omissão do empresariado contribuiu para o clima de flá-flu no país.

Presidente da Suzano desde 2013, Walter Schalka, 58, é engenheiro formado pelo ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) - Zanone Fraissat/Folhapress

Recentemente o senhor falou sobre a importância da preservação da Amazônia e ressaltou que 100% das árvores da Suzano são de reflorestamento. Como tem visto a discussão atual sobre desmatamento? Nós acreditamos que só é bom para nós se for bom pro mundo. Na questão ambiental, temos que preservar ao máximo possível as áreas nativas.

Nossa defesa é uma defesa de 100% da preservação da Amazônia. Não só da Amazônia, mas também da mata atlântica, do Pantanal e de qualquer região. Nós defendemos há um longo tempo a tese de que deve haver um processo de reflorestamento com matas nativas.

Por outro lado, o Brasil não se beneficia com o desmatamento na Amazônia. Pouquíssimas pessoas se beneficiam disso. Basicamente, gente que utiliza madeira obviamente ilegal para exportação, alguns poucos grileiros que usam a área para plantar para gado. Isso não é positivo.

O Brasil tinha um potencial enorme de utilização da Amazônia como prestação de serviço ambiental para sequestro de carbono. Nenhum dos últimos governos valorizou isso de forma adequada.

Como o senhor avalia a política ambiental do atual governo, com o ministro do Meio Ambiente questionando números do desmatamento? O desmatamento no Brasil sempre foi alto e agora aumentou um pouco mais. Não é que não existia e agora voltou. Nós temos que olhar de forma científica para o problema. 

A questão é: como que a gente consegue fazer um processo de preservação? Eu não acredito que o governo brasileiro atual incentive o desmatamento. Ele só não coíbe com a velocidade e com a determinação que tem que coibir.

Infelizmente, nenhum governo brasileiro nos últimos 30 anos fez essa defesa da Amazônia. Isso acabou indo para a imprensa de forma mais forte pelas declarações que foram feitas por membros do governo sobre isso.

A questão ambiental de uma maneira geral tem entrado na polarização política. A defesa do meio ambiente tem sido vista como ideológica por alguns. Como o senhor vê isso? A polarização é ruim para o Brasil, só alimenta uma questão que o país nunca vivenciou, que é a divisão. 

O país tem que ter uma pauta que gere valor para a sociedade. Combater problemas como a desigualdade de oportunidades, trabalhar por um estado mais eficiente, para prestar melhores serviços para a população. Nesse conjunto de situações, existe uma convergência de grande parte da população.

Essa polarização de temas que não deveriam ser ideologizados, que são científicos, deveria ser deixada de lado.

Qual é o papel do empresariado para contribuir para o debate de uma maneira menos ideologizada? A omissão de empresários e executivos brasileiros nos últimos anos é uma das contribuições para levar o Brasil aonde o país está. Como o Estado tem uma alta participação no PIB [Produto Interno Bruto], os empresários têm receio de falar.

As pessoas acham que, dada a polarização e a ideologização, serão consideradas do lado A ou do B. Eu sou do lado Brasil, que quer desenvolver o país no campo ambiental e social, gerar para os habitantes uma melhor qualidade no nível do serviço público.

Para fazer isso, temos que mexer na área ambiental, aumentar a eficiência do Estado. O pessoal fala de reforma da Previdência, que é fundamental, mas também precisamos falar de reforma do Estado brasileiro, que arrecada 40% do PIB e presta um nível de serviço baixo. 

Como o sr. avalia a discussão de reformas como a tributária e a administrativa? A tributária é importante porque precisamos acabar com o complexo sistema tributário que nós temos, temos que simplificar. Custa muito para a sociedade. Infelizmente, na minha opinião, nós vão vamos conseguir reduzir impostos neste momento. 

Haverá uma série de pressões de grupos, inclusive do setor privado, contra essas mudanças. O senhor é otimista quanto a viabilidade dessas reformas? O Brasil é um país corporativista e patrimonialista, e nós precisamos tirar isso da sociedade. Todo o mundo defende reformas desde que não mexam no seu bolso. É impossível fazer isso.

As pessoas vão ter que entender que sim, os mais ricos vão ter que pagar uma parte da conta. E sim, aqueles que estão tendo benefícios que não são equitativos para o Estado vão ter que deixar de tê-los. E que sim, aquelas pessoas que se valem de um sistema corporativista, pode ser o sindicato patronal ou o de trabalhadores, terão que abrir mão dessas posições.

O atual Congresso tem condições de fazer isso? É inevitável que tenhamos um Congresso que sofra influência de vários grupos, mas eu vejo o atual maduro para tomar decisões difíceis. Tomou a da Previdência.

Mas uma nova Previdência sem Estados e municípios e sem mexer nos privilégios de militares. Como o sr. a avalia? Não é a reforma ideal, mas é a possível. A gente não consegue construir uma sociedade em democracia sem ceder. A gente precisa saber onde podemos ceder. Nesse caso, foi feito o possível e é um avanço importante. Talvez nos leve daqui a voltar a discutir o assunto daqui a alguns anos porque não é uma reforma definitiva.

Não endereça o problema demográfico que temos e é seríssimo. As pessoas vão viver mais, e ainda bem, mas há o problema crônico da idade da aposentadoria. A que foi colocada parece correta hoje, mas daqui a dez anos talvez pareça baixa. 

Esse processo gradativo que eu chamo de aproximações sucessivas cria um ambiente que é fértil para atrair novos investimentos, a única fonte para revertemos a crise econômica do Brasil. 

Um país consegue resolver seus problemas [econômicos] de três jeitos diferentes: por consumo, que o Brasil não consegue fazer mais porque as famílias estão endividadas e o desemprego alto; pelo aumento do dispêndio governamental, que não dá para ter mais; e o terceiro, último e mais importante: por investimento.

Tem muita liquidez no mundo e ao atrair novos investimentos, o Brasil vai ter um crescimento sustentável.

 

Temos passado por um processo de desindustrialização. É preocupante? Como reverter isso? Temos uma oportunidade grande de usarmos as novas tecnologias para revertermos isso.

Um problema crônico é a educação brasileira, que é universal, mas de baixa qualidade. Temos que dar um salto e, fazendo isso, gerar pessoas mais bem preparadas que vão poder propiciar a volta da industrialização.

É inequívoco o fato de que só os países que investiram em educação fizeram um grande processo de transformação social. Você pega os países que fizeram investimento em educação, e eles fizeram transformação social. Os que não fizeram, não. 

Quando se fala em robotização, há críticas como a de que ela traz riscos à democracia à medida que o processo elimina postos de trabalho. Como o senhor vê isso? É inquestionável, vai haver perda de postos de trabalho. O Brasil perdeu o bonde digital. Não é líder, é seguidor. Essa perda de empregos tem que ser naturalmente reposta por outras atividades que vão surgir, como serviços.

Se não for suficiente, vamos ter que redesenhar o modelo tributário para poder equilibrar isso. Infelizmente, o modelo que nós criamos é concentrador de renda, e nós não podemos reforçar esse modelo no futuro. 

Temos que buscar uma forma de fazer com que as pessoas tenham acesso [a bens].

Pelo discurso, o senhor acredita que a desigualdade é ruim para a sociedade. É ruim para o empresariado? No longo prazo obviamente sim. No curto, não. Mas temos que olhar como seres humanos como a gente pode ter o maior número de pessoas inclusas na sociedade. O modelo de exclusão, que tem gente ficando para trás na sociedade, tem que ser modificado.

A primeira coisa que temos que trabalhar é a educação, mas não é a única. Temos que trabalhar modelos de negócio em que as pessoas possam gerar renda. A combinação de renda e educação é que vai fazer o Brasil e o mundo mais justos.

E qual o papel das políticas redistributivas nisso? Acho que temos que tributar cada vez menos as pessoas de menor renda, direta ou indiretamente. E cada vez mais tributar as pessoas de alta renda.

Eu sei que é polêmica a minha tese, mas eu sou a favor por exemplo do imposto sobre heranças, que é muito forte nos Estados Unidos, mas muito baixo no Brasil. 

As pessoas falam “Walter, você vai prejudicar os seus filhos fazendo imposto sobre herança.” Eu respondo que meus filhos têm que ter, e já têm, profissão definida. Eles têm que trabalhar e gerar a renda deles.

Vejo muito um processo em que o Estado tenha a obrigação de prestar serviços fundamentais para a sociedade, basicamente educação, saúde e segurança, e propiciar infraestrutura. O Estado deve ter a capacidade de equilibrar a população como um todo, gerando igualdade de oportunidades.

O senhor fala bastante em educação. Muito tem se falado, por parte do governo, sobre a experiência chilena, com vouchers. Qual a sua opinião sobre isso? Temos que fazer essa experiência. Não significa que essa é a melhor solução. 

Eu sou muito envolvido em educação, faço parte do programa Parceiros da Educação. Adotei uma escola pública estadual em Diadema há cerca de oito anos. O nível de ensino era baixíssimo. A escola melhorou ao longo do tempo, mas é insuficiente. O Estado brasileiro, dada a magnitude que tem e as amarras na operação, não provê um nível adequado de serviço.

Escolas de baixo custo e alta qualidade, o que é possível fazer na iniciativa privada, poderiam sim receber vouchers do Estado brasileiro. A forma de fazer eu não sei se é só essa, mas tem algumas questões que são inegociáveis.

Primeiro, a escola precisa ser em período integral. Os estados e cidades que fizeram isso tiveram resultados muito positivos, como o Espírito Santo ou o Ceará.

Depois, precisa ter digitalização na escola, é um pouco do que investi na escola que adotei.

Com essas duas condições, conseguimos dar um grande salto na educação, que vai refletir em um monte de coisas positivas, como melhoria em segurança, eficiência das pessoas, autoestima, possibilidade de renda e geração de emprego.

No debate público sobre educação tem se falado muito em ideologização, em doutrinação, com discursos como o do Escola Sem Partido. Como o senhor vê isso? Sou contra qualquer uma dessas questões de ideologização ou partidarização, ou polarização. Essas discussões não produzem nada. Aumentam o nível de fricção na sociedade e não produzem resultados.

O que nós temos que fazer é o seguinte: como eu produzo os melhores resultados com os recursos que eu tenho. É ganho de eficiência na veia o tempo todo.

Temos que criar valor, e aí não importa se é partido do lado A ou do lado B. Temos que sair dessa discussão que atrapalha o desenvolvimento do Brasil.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.