Coronavírus ameaça PIB chinês e economia global

Analistas estimam impacto de até 1,2 ponto percentual na atividade do país asiático

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São Paulo

Após um salto de mais de 40% no número de mortos e infectados de domingo (26) para esta segunda-feira (27), analistas passaram a avaliar um impacto no crescimento chinês causado pelo coronavírus que pode ser superior a um ponto percentual.

Como a China é a segunda maior economia do mundo, um crescimento menor poderá ter impactos globais, especialmente na Ásia, onde o turismo nos últimos anos é dependente, em grande parte, dos viajantes chineses.

O FMI previa, em 20 de janeiro, que a China cresceria 6% neste ano. Em 2019, o país cresceu 6,1%, seu pior índice em 29 anos.

 
Para a agência de classificação de risco S&P, o crescimento do PIB chinês pode cair cerca de 1,2 ponto percentual em 2020 caso os gastos de consumo, especialmente em transporte e diversão, caiam 10%. Ou seja, considerando a previsão do FMI, o PIB chinês poderia avançar só 4,8% em 2020.
Foto de 27 de novembro mostra um trabalhador na linha de produção da Dongfeng Honda em Wuhan
Foto de 27 de novembro mostra um trabalhador na linha de produção da Dongfeng Honda em Wuhan - STR/AFP

Na avaliação de analistas, o dano econômico pode ser maior do que a epidemia de Sars (síndrome respiratória aguda grave) que deixou centenas de mortos em 2003. Naquele ano, o país desacelerou de 11,1% a 9,1% entre o primeiro e o segundo trimestre. No ano, cresceu 10%. 

Especialistas dizem que ainda é cedo para medir o real efeito que o coronavírus irá deixar na economia, mas que algum impacto é certo.

Segundo a Rico, se o coronavírus estender seus efeitos, os indicadores econômicos do primeiro trimestre podem ser “duramente impactados”.

“E, com os juros tão baixos mundo afora, os bancos centrais podem ter menos ferramentas para estimular as economias”, afirma o texto.

A Sars veio após uma grande crise, quando as economias iniciavam um movimento de expansão. “Hoje, o mundo está exatamente na direção oposta, com as grandes economias lutando para impedir que uma desaceleração mais forte na atividade possa se tornar uma recessão”, diz relatório da Rico.

 
Para Tommy Wu, da Oxford Economics, o impacto econômico pode ser forte, mas terá curta duração —e será menos severo do que antes— porque desta vez a resposta das autoridades foi mais rápida do que antes. Isso apesar de autoridades terem escondido dados sobre o avanço do vírus.

Já para William Castro Alves, estrategista-chefe da Avenue Securities, o coronavírus deve reduzir o avanço chinês em no máximo 0,5 ponto percentual, porque a economia do país está maior do que era em 2003.
“Contudo, qualquer mudança no crescimento chinês, por menor que seja, impacta muito a economia mundial”, diz. 

Para restringir a propagação do vírus, o governo suspendeu viagens dentro da China e para o exterior, afetando o turismo, peso-pesado da economia com 11% do PIB em 2018, segundo cifras oficiais.

Essa suspensão vai afetar ainda países vizinhos, como Camboja, Hong Kong, Tailândia, Japão e Singapura, cujos gastos de chineses, lembra a consultoria Capital Economics, são importante parte do PIB. 

Em 2003, com a Sars, por exemplo, o número de passageiros aéreos na Ásia caiu 45%. Hoje, o turismo na região está ainda mais dependente da China. Se o efeito se repetir, “levaria a uma queda entre 1,5 e 2 pontos percentuais do PIB dos países mais vulneráveis”, diz a Capital Economics.

Em 2018, 8,4 milhões de chineses visitaram o Japão —1 de cada 4 turistas no país, segundo a Organização Nacional de Turismo Japonês. Eles compram 90% dos cosméticos vendidos a turistas no país, aponta relatório do Mitsubishi UFJ Morgan Stanley.

Na Tailândia, onde o turismo representa 18% do PIB, o impacto pode ser ainda maior. Chineses são mais de 25% dos visitantes. No pior momento da Sars, afirma a Capital Economics, o total de chineses e de vendas no varejo no país caíram pela metade.

O temor causado pelo vírus fez o mercado financeiro ter um pregão de forte aversão a risco nesta segunda-feira (27).

A Bolsa brasileira teve queda de 3,3%, a maior desde junho de 2019, a 114.481 pontos. Juntas, Petrobras e Vale, que caiu 6%, perderam R$ 34 bilhões em valor de mercado.

O dólar comercial, que chegou a bater nos R$ 4,23 durante o pregão, fechou em alta de 0,5%, a R$ 4,21, maior valor desde 2 de dezembro. O dólar turismo está cotado em R$ 4,38. O grama do ouro subiu 1,65%, para R$ 215,51.

Em momentos de aversão a risco, o investidor tende a vender ações e comprar ativos mais 
seguros, como ouro e dólar. Para Lucas Tambellini, estrategista do Itaú BBA, o temor com o avanço do coronavírus foi um motivo para investidores embolsarem ganhos. 

Nas últimas semanas, Ibovespa e índices americanos chegaram às máximas históricas. “O mercado estava em trajetória de resultados muitos bons. Faltava um gatilho para a realização de lucro”, diz.

Bolsas de Valores de todo o mundo tiveram forte queda. Europa e EUA registraram os maiores recuos em mais de três meses: Londres, Paris e Frankfurt caíram 2,5%, e Dow Jones e S&P 500, 1,6% cada uma. A Nasdaq cedeu 1,9%, e a Bolsa de Tóquio teve queda de 2%.

O mercado acionário chinês segue fechado pelo Ano-Novo Lunar até 3 de fevereiro. A princípio, as atividades retornariam na quinta (30), mas o governo estendeu o feriado.

Para conter o vírus, Pequim também adotou medidas de confinamento para a região metropolitana de Wuhan, berço do coronavírus, assim como quase toda a província central de Hubei, a que pertence.

Wuhan é uma megalópole industrial, entre dois eixos importantes: Yangtzé, o rio mais longo da Ásia, que atravessa a cidade de oeste a leste, e o eixo norte-sul do trem que vai de Pequim a Hong Kong.

Além disso, de lá partem voos diretos para Europa, Oriente Médio e Estados Unidos, o que pode ter contribuído para a propagação do vírus.

 
Devido à sua localização estratégica, vários consulados estão em Wuhan (França, Reino Unido, Estados Unidos). 

Pelo menos 106 pessoas morreram e mais de 2.700 foram infectadas na China desde o surgimento do coronavírus no final de dezembro. Desde então, se espalhou pela Ásia, Europa, Estados Unidos e Austrália.

Confinada, Wuhan, uma importante cidade industrial —tem cerca de 160 empresas japonesas— e uma das maiores da China, está com atividades paralisadas. De lá saem 60% dos trilhos de alta velocidade chineses. Importante centro automotivo, é berço da Dongfeng, segunda maior montadora do país e parceira das japonesas Nissan e Honda.

Além da paralisação das indústrias da região, companhias de outras partes do país estenderam o recesso do Ano-Novo chinês, provocando uma forte queda no preço de matérias-primas. Nesta segunda, o barril de petróleo Brent caiu 2%, abaixo de US$ 60 pela primeira vez desde outubro, derrubando as ações da Petrobras em 4,3%.

Com agências de notícias

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