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Jeans vive crise de identidade na moda; entenda

Hoje em dia, novos estilos surgem e se reciclam em velocidade estonteante

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Haley Nahman
Nova York | The New York Times

Que tipo de jeans está na moda hoje? Uma pessoa jovem e moderna pode dizer cintura baixa e baggy, enquanto sua irmã mais velha afirma o contrário. Pergunte a especialistas da indústria e eles provavelmente lhe dirão jeans skinny, com números para sustentar essa opinião.

Mas entre em qualquer loja que vende jeans e você encontrará entre as araras uma variedade de silhuetas e estilos: mamãe, papai, namorado, namorada, skatista, chaminé, 1990s, esculpido, cigarette, corte reto, patchwork, contraste, slim, cortado. A pergunta do que é moda pode ser melhor formulada no negativo: o que não é?

Dizem que o ciclo de tendências completa sua jornada a cada 20 anos, e embora haja alguma verdade nisso —os jeans de cintura baixa, por exemplo, não foram populares por tanto tempo—, o adágio começa a parecer datado. Hoje em dia, novos estilos surgem e se reciclam em velocidade estonteante. Tão depressa, na verdade, que às vezes parecem não se mover, como uma roda colorida girando se transforma numa mancha marrom: tudo relevante ao mesmo tempo.

Que tipo de jeans está na moda hoje? - OK McCausland/The New York Times

Essa paisagem, onde nada é tão "in" ou "out", e sim escolhido ou não, apresenta algumas claras vitórias para a moda como forma de autoexpressão. Mas o que mais a variedade de jeans oferecida diz sobre este momento na história? Afinal, o jeans sempre foi um indicador dos ventos culturais.

Os jeans clássicos como conhecemos hoje —azuis, rígidos, com bolsos— foram patenteados por Levi Strauss e Jacob Davis em 1873. Durante décadas eles foram usados principalmente por trabalhadores e modificados para cumprir suas necessidades: costuras a mais para reforço, rebites de cobre para impedir que os bolsos sejam arrancados, passadores de cinto e zíper para facilitar o uso.

Foi somente nos anos 1920 e 30 que os jeans perderam suas estritas associações utilitárias. Ao se aproveitar do vanguardismo implícito nas associações de classe da vestimenta, caubóis de Hollywood como John Wayne e Gary Cooper emprestaram ao jeans um ar de rebeldia romântica. Percorra a história do jeans americano nos cem anos seguintes e você encontrará um esboço aproximado dos iconoclastas do século 20: motoqueiros, hippies, astros do rock, rappers e hipsters.

Este século teve sua parcela de figuras de proa culturais vestidas de brim azul, mas fora a ocasional proibição pelo código de vestimenta do escritório os jeans em geral perderam suas ligações subversivas. Todo mundo os usa.

O comércio eletrônico mudou o jogo. Como disse Lorraine Hutchinson, analista comercial do Bank of America: a capacidade de fabricar novos estilos e testá-los no mercado exige muito menos risco financeiro hoje do que nunca. Então por que limitar as opções?

Vários varejistas de rápido crescimento parecem ter feito isso durante toda a sua estratégia de negócios: Shein, marca de moda rápida popular entre a Geração Z, anunciou que acrescenta cerca de mil produtos a seu site todos os dias —número surpreendente que atraiu a preocupação de ativistas do clima e trabalhistas (na quarta-feira havia mais de 6.000 modelos de jeans femininos em oferta).

Apesar de declarações exaltadas sobre o moletom superar as "calças rígidas", o mercado mundial de jeans só está crescendo. Segundo a Global Industry Analysts, ele valia mais de US$ 60 bilhões (R$ 325 bilhões) em 2020, e há projeções de que crescerá US$ 20 bilhões (R$ 108 bilhões) até 2026. Isso nos deixa onde estamos hoje: todos os modelos de jeans com que poderíamos sonhar, imediatamente disponíveis.

O estilo "pessoal", em oposição ao baseado na tendência, é uma ideia popular hoje, talvez porque sugere uma espécie de progresso social —um movimento na direção de um mundo em que a moda é inclusiva, acessível e menos dogmática. Essa é uma proposta especialmente atraente para consumidores que se sentem ignorados pela maior parte do mercado de varejo.

Lauren Chan, modelo e defensora da inclusão dos tamanhos grandes, disse que quando as consumidoras não conseguem encontrar roupas bem feitas e estilosas para seus corpos "a mensagem que elas recebem é que não são dignas disso". E foi por esse motivo que em 2019 ela fundou a Henning, linha de roupas de tamanho 42 e maiores.

Ao contrário da Shein, por exemplo, onde mais é mais, Chan está no negócio de essencializar: oferecer acesso a produtos de qualidade, e não acesso a tudo. Para a primavera, ela está lançando um único modelo de jeans: tecido rígido e corte reto, de inspiração vintage.

"O mercado tamanho 'plus' é feito principalmente de peças que são semimoda, versões diluídas do que a moda em geral ofereceu no ano passado", disse Chan, "porque a moda tamanho plus muitas vezes está um pouco atrasada para se adaptar às tendências".

As compradoras de tamanho plus têm um longo caminho a percorrer antes que seu acesso reflita o das de tamanho comum —sem dúvida uma evidência da gordofobia generalizada. Mas em longo prazo talvez valha a pena perguntar se ter virtualmente infinitas opções —e infinitas tendências— realmente reflete o ideal da consumidora média.

Em seu livro de 2004 "The Paradox of Choice" [O paradoxo da opção], o psicólogo Barry Schwartz propôs que se a liberdade de escolha é crucial para nosso bem-estar ter opções demais nos deixa nervosos.
"Embora os americanos modernos tenham mais opções do que qualquer grupo de pessoas já teve, e assim supostamente mais liberdade e autonomia, não parecemos estar nos beneficiando disso psicologicamente", escreveu ele.

Em um estudo recente (hoje sob análise dos pares), o psicólogo e seu associado na pesquisa, Nathan Cheek, exploram uma nova hipótese, que Schwartz explicou por telefone: "Quando você dá às pessoas opções de grandes conjuntos de opções, e mesmo conjuntos de opções triviais, como de que tipo de bebida elas gostam, elas veem a opção como uma declaração sobre quem elas são".

Como alguém que adora roupas, eu não preciso dessa pesquisa para saber que o que ele propõe vale para muitas: as inúmeras oportunidades para nos expressarmos esteticamente são ao mesmo tempo uma bênção e uma maldição, capazes de provocar alegria e igualmente temor.

Georg Simmel, que teria publicado uma das primeiras "teorias da moda" oficiais em 1895, acreditava que a moda é definida pelo puxa e empurra entre o desejo de se acomodar e o desejo de sobressair. Essa tensão é crítica, disse ele.

"A moda só existe na medida em que um de dois polos não prevalece no final", escreveu o psicanalista italiano Sergio Benvenuto sobre a teoria de Simmel.

Talvez seja por isso que, como colocou Anna Wintour, "a moda pode deixar as pessoas muito nervosas". Vestir-se é caminhar numa corda bamba onde nós estamos numa ponta e todas as outras pessoas na outra.

Katrina Klein desenha jeans há quase 20 anos —para a J Brand, a Rag & Bone e agora para sua própria marca, ASKK NY. Ela se lembra vividamente de cada microtendência que testemunhou: coloridos, estampados, bordados, destruídos, raspados. Neste momento, disse ela, "a falta de tendência é a tendência". E ela não acha isso ruim.

"As pessoas realmente não querem se vestir igual a todas as outras", explica.

Individualismo: parece um lugar óbvio demais para essa investigação terminar. Se a tecnologia moderna continua oferecendo acesso à abundância enquanto nos conduz a cantos da existência cada vez mais isolados, faz sentido que a moda —famosamente um reflexo do espírito da época— deva seguir uma trajetória parecida.

Mas a busca do estilo pessoal como o ápice singular da moda pode estar levando esse valor longe demais, e o modo como está se metabolizando atualmente tem efeitos ambientais alarmantes.

"Só porque a moda e o consumismo se sobrepõem não significa que sejam sinônimos", disse Drew Austin, escritora que cobre urbanismo, tecnologia e mudança social, em uma entrevista no mês passado. "Cada cultura em toda a história usou a moda para se expressar, e fazer isso talvez seja ainda mais importante nas culturas e subculturas em que a moda é menos capturada pelo consumismo —onde ela desempenha melhor seu papel como meio de comunicação e realçadora do espaço público."

"Vista-se do seu modo" imbui a vestimenta de um objetivo social fora da linguagem da posição social. Mas como uma filosofia de moda inventada tem um preço claro. A opção ilimitada não é uma utopia da moda: nem para os consumidores nem para os trabalhadores da moda ou as cadeias de suprimentos, nem para o planeta. Em outras palavras, mil estilos de jeans não vão nos salvar.

As restrições, por outro lado, podem representar uma oportunidade criativa, disse Schwartz: "Elas são estimulantes de uma maneira que a simples novidade jamais poderia ser".

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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