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PIB Banco Central

Empobrecimento gera nova recessão no Brasil

Analistas esperavam 'efeito euforia' nos últimos trimestres, mas o que ocorreu foi reversão da tendência de alta

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Thiago de Moraes Moreira

Consultor em planejamento estratégico e professor do Ibmec-RJ e do Instituto de Economia da UFRJ

Mais uma vez a economia brasileira entrou tecnicamente em recessão. Depois de um primeiro trimestre de forte expansão (1,3%), tivemos duas retrações consecutivas de -0,4% e -0,1% no segundo e terceiro trimestres, respectivamente.

Contaminados pelo bom desempenho do início do ano, até meados de 2021 ainda predominava a expectativa de que a economia brasileira havia ingressado em uma recuperação mais robusta e não raras eram as projeções superiores a 5,5% para 2021.

O otimismo estava, em grande medida, assentado em um maior crescimento previsto para aquelas atividades de maior interação entre as pessoas e que, portanto, beneficiaram-se do crescente relaxamento das medidas restritivas vigentes ao longo da pandemia. Entre tais atividades, destacam-se o comércio varejista e, principalmente, os serviços.

A despeito da forte segunda onda da pandemia que acometeu o país no início do ano, o volume de comércio varejista mostrou de fato uma tendência de alta, crescendo 5,5% entre janeiro e julho. Já a tendência de alta dos serviços foi ainda mais intensa e durou um pouco mais, estendendo-se até agosto, com expansão real acumulada de 7,2%.

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Fila para atualização de dados do CadÚnico em Salvador, Bahia - Franco Adailton - 11.nov.2021/Folhapress

Na visão dos analistas, com a aceleração da vacinação a partir do início da segunda metade do ano era esperado um impulso ainda maior ao crescimento nos últimos trimestres, principalmente por conta do que poderíamos denominar de "efeito euforia", decorrente do maior controle da pandemia e o retorno crescente à normalidade.

No entanto, o que de fato ocorreu foi uma reversão na tendência de alta, justamente no período de maior otimismo entre os sanitaristas devido ao importante avanço no número de imunizados.

Uma das principais explicações para a recessão confirmada com a divulgação de hoje está sem dúvida no processo de empobrecimento que vem reduzindo o poder de compra de parte expressiva da população. A manutenção da elevada taxa de desemprego (12,6% em setembro) vem provocando uma impressionante precarização do trabalho, com reduções significativas dos salários oferecidos pelos empregadores --salários estes que a imensa maioria daqueles que estão na fila do desemprego não podem recusar.

A situação torna-se ainda mais dramática quando se observa o aumento de preços no mercado interno. Enquanto o salário médio nominal recuou 9,1% entre janeiro e setembro, neste mesmo período a inflação acumulada medida pelo IPCA foi de 6,9%, a qual segue em franca expansão, devendo superar os 10% até dezembro. Salários nominais em queda associados à forte aceleração nos preços significam uma brutal contração no poder de compra, em particular dos menos favorecidos.

Esta situação vem impedindo uma dinâmica mais consistente de retomada do comércio e dos serviços. Vale ressaltar que parte expressiva dos serviços está vinculada a classes de renda mais elevada (turismo, hotéis, restaurantes, serviços de informação), as quais são menos afetadas pela referida retração no poder de compra médio.

Não por acaso, os serviços no terceiro trimestre ainda registraram crescimento na margem de 1,1%. Neste sentido, a queda do PIB teria sido ainda maior não fosse a expansão na demanda pelos serviços por parte dos mais ricos.

Nas atuais circunstâncias, uma recuperação mais consistente depende necessariamente de uma reversão do contexto de forte declínio do poder aquisitivo das faixas de renda média e baixa, permitindo uma retomada sustentada do consumo.

O controle inflacionário por meio da escalada da taxa básica de juros não é a saída para reverter o atual quadro. As origens do processo inflacionário são choques de oferta (nacionais e internacionais) em diferentes setores, os quais deveriam ser combatidos por medidas setoriais específicas.

A grande maioria dos Bancos Centrais decidiram tolerar um pouco mais de inflação e não estão elevando os juros neste momento. O atual ritmo de elevação da taxa Selic tende a deteriorar ainda mais o poder de compra, aumentando os custos do crédito, além de ser extremamente prejudicial à decisão empresarial por novos investimentos produtivos.

Enfim, o prognóstico não é favorável. O crescimento de 2021 ficará abaixo de 5%, com chances crescentes de uma estagnação em 2022. A política de renda básica de R$ 400 proposta pelo governo é sem dúvida importante, mas não suficiente para as reais necessidades da economia brasileira.

A expansão sustentada da renda per capita (e do poder de compra) depende essencialmente de uma retomada dos investimentos (públicos e privados) em infraestrutura e desenvolvimento tecnológico, acompanhada do resgate e do fortalecimento das capacidades industriais.

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