Câmara aprova texto-base de PEC em 1º turno após desidratação da proposta

Versão amplia teto de gastos apenas em 2023; parte do projeto pode precisar ir ao Senado

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Brasília

A Câmara aprovou em primeiro turno nesta terça-feira (20), por 331 votos a 168, o texto-base da PEC (proposta de emenda à Constituição) da Gastança, que abre espaço no Orçamento para gastos e promessas do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Sem uma base sólida na Casa, o PT teve que recuar e aceitou a desidratação da PEC. A versão que avança na Câmara amplia o teto de gastos em R$ 145 bilhões no próximo ano –e não por dois anos, como previa o texto aprovado pelo Senado no início do mês.

A PEC também autoriza outros R$ 23 bilhões em investimentos fora do limite de despesas. Essa medida não tem prazo de validade.

Rodrigo Pacheco (dir.), presidente do Senado, e Arthur Lira, presidente da Câmara, em evento em Brasília
Rodrigo Pacheco (dir.), presidente do Senado, e Arthur Lira, presidente da Câmara, em evento em Brasília - Ueslei Marcelino - 12.dez.2022/Reuters

O debate perdurou tarde na noite desta terça e foi encerrado por volta de meia-noite, faltando apenas um destaque a ser deliberado.

Numa derrota do PT, a Câmara retirou um trecho que previa que a equipe de transição poderia apresentar sugestões de onde serão usados os R$ 145 bilhões da ampliação do teto de gastos.

Pelo texto, a escolha será feita pelo Congresso e pelo relator do Orçamento, senador Marcelo Castro (MDB-PI). A equipe de transição de Lula ainda pode negociar com o Congresso, mas a sinalização da Câmara foi de que os parlamentares querem exercer a prerrogativa de definir e aprovar as despesas do Orçamento.

Nesta quarta-feira (21) o plenário da Câmara ainda vai analisar este último destaque, que pode alterar o texto aprovado, e realizar o segundo turno da votação, para só então promulgar parte da proposta, caso ela seja novamente aprovada.

Para aprovar a PEC são necessários, pelo menos, 308 votos na Câmara, em dois turnos. Na primeira rodada, apenas o PL, o Republicanos e o Novo foram contra a proposta.

Partidos que negociam espaço no governo Lula apoiaram, em maioria, a PEC, mas registraram votos contrários. É o caso da União Brasil, PSD e MDB.

Na União Brasil, foram 39 votos a favor da PEC e 12 deputados se posicionaram contra a proposta. No MDB, foram 5 contrários, e no PSD, 7.

Lira votou a favor da PEC –ele não é obrigado a votar nesse tipo de proposta. O PP, que tem adotado uma postura de independência em relação a Lula, também apoia majoritariamente o texto, apesar de 15 votos contrários.

Se aprovado em segundo turno, a parte do texto que autoriza o gasto fora do teto de gasto vai direto para promulgação porque já foi analisado pelo Senado.

Um trecho da PEC, porém, voltará para análise dos senadores também nesta quarta, o que distribui os R$ 19,5 bilhões das emendas de relator —que foram declaradas inconstitucionais pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Pelo acordo firmado pela maioria dos partidos no Congresso, metade dessas emendas continua sob o comando do Congresso e a outra volta para o controle do governo.

A redistribuição foi uma das chaves, junto com a diminuição do prazo, para que houvesse entendimento entre os deputados pela apreciação da proposta. Ainda, o texto-base abre uma brecha para que o Congresso mantenha o poder sobre parte do valor realocado.

A PEC é a principal aposta do presidente eleito para cumprir promessas de campanha, como a manutenção do Bolsa Família em R$ 600 e o adicional de R$ 150 por criança de até seis anos. O valor reservado para o programa sem a PEC é suficiente apenas para o pagamento de R$ 405 por família.

Com o espaço total de R$ 168 bilhões a ser aberto no Orçamento de 2023, Lula espera recompor programas como Farmácia Popular e Minha Casa, Minha Vida, e reajustar o salário mínimo acima da inflação.

Apesar da tendência de aprovação da PEC na Câmara, o resultado foi abaixo do que PT pretendia, inicialmente, uma autorização permanente para elevar as despesas federais em aproximadamente R$ 200 bilhões.

Diante da resistência de partidos, como PL, PP, Republicanos e União Brasil, aliados de Lula tentaram reduzir o prazo para quatro anos e, depois, para dois anos. O valor da licença para gastar também caiu de quase R$ 200 bilhões para R$ 168 bilhões.

O texto da PEC permite que recursos parados nas contas do PIS/Pasep há no mínimo 20 anos sejam apropriados pelo Tesouro, e usados para bancar investimentos fora da regra fiscal que limita o crescimento das despesas.

Em agosto, a Caixa Econômica Federal informou que há R$ 24,6 bilhões em cotas do PIS/Pasep.

Outro dispositivo prevê que o Executivo irá enviar uma nova proposta de regra fiscal até 31 de agosto de 2023. Quando aprovada essa nova regra (por projeto de lei complementar), será revogado da Constituição o teto atual.

A aprovação de um projeto de lei complementar é mais fácil (precisa de menos votos) que uma PEC. Este dispositivo, no entanto, é contestado justamente pelo destaque que será votado nesta quarta. Mesmo entre petistas, há a avaliação de que o governo eleito poderá sofrer uma derrota neste ponto.

Em acordo com líderes do Congresso e o PT, a PEC deixou uma brecha para que possa ser aberto espaço no Orçamento de 2022.

O trecho que permite investimentos adicionais quando houver receitas extraordinárias, até o limite de R$ 23 bilhões, pode entrar em vigor assim que for promulgado.

Com isso, há margem para que o governo de Bolsonaro libere emendas parlamentares que estão bloqueadas por causa do aperto fiscal. A articulação para usar a PEC de Lula para destravar as emendas de aliados do mandatário foi revelada pela Folha em novembro.

A PEC também tira do teto de gastos despesas das instituições federais de ensino custeadas por receitas próprias, de doações ou de convênios celebrados com demais entes da Federação ou entidades privadas.

A medida também deve valer para todas as instituições de pesquisa e para a Embrapa e a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz). Doações feitas a fundos de meio ambiente também ficam de fora do teto.

Os gastos extras aprofundam o resultado negativo nas contas públicas previsto para 2023, caso não haja elevação nas receitas ou corte de despesas de forma suficiente. O projeto de Orçamento enviado pelo Ministério da Economia prevê oficialmente um rombo de R$ 63,5 bilhões, mas o atual governo atualizou essa estimativa para um número menor, embora ainda negativo em R$ 40,4 bilhões.

A existência de déficits públicos indica que o governo está financiando despesas por meio de emissão de um volume maior da dívida brasileira. O custo fica próximo da taxa básica de juros da economia, a Selic, hoje em 13,75% ao ano.

"Considerando que o Supremo Tribunal Federal já compreendeu que os recursos para o Auxílio Brasil e o Bolsa Família já estão garantidos, perde o sentido essa PEC. Ela seria, como as pessoas estão dizendo, a PEC da Gastança", afirmou o deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), durante o debate do tema.

"A decisão do ministro Gilmar Mendes libera apenas o adicional de R$ 400 para R$ 600, não libera os R$ 150 para as crianças menores de seis anos e também não resolve o orçamento da educação, saúde e das políticas complementares", disse Reginaldo Lopes (PT-MG), líder do partido na Câmara.

PROMESSAS DE CAMPANHA DE LULA QUE DEPENDEM DA PEC

- Manutenção do benefício mínimo de R$ 600 para o Bolsa Família*

- Benefício extra de R$ 150 por criança de até seis anos no Bolsa Família

- Aumento real (acima da inflação) do salário mínimo

- Ampliação dos investimentos públicos

*O projeto de Orçamento de 2023, enviado por Bolsonaro, tem recursos que bancam apenas R$ 405 de benefício por família

O QUE MAIS A PEC PREVÊ

- Que o aumento no teto de gastos terá validade somente em 2023

- Permite que o governo defina uma nova âncora fiscal por projeto de lei complementar, mais fácil de aprovar que uma PEC

- Altera o indexador do montante total de precatórios a serem pagos. Atualmente, o valor é corrigido pela correção do teto. Para evitar que o aumento do teto seja parcialmente consumido pelos precatórios, alterou-se o indexador do limite de precatórios para o IPCA

- Prorroga a DRU até o fim de 2024. A Desvinculação de Receitas da União permite ao governo usar livremente 20% dos tributos federais vinculados por lei a fundos ou despesas, dando mais flexibilidade para o governo definir a destinação de recursos

- Permite o uso de recursos esquecidos do PIS/Pasep para investimentos públicos

PEC TAMBÉM MUDA REGRAS DAS EMENDAS

- Acordo entre Congresso e PT usa o texto para dividir a verba das emendas de relator, declaradas inconstitucionais pelo STF

- PEC eleva o valor das emendas individuais, cujo teto está previsto na constituição

R$ 19,7 milhões
é o valor atual da emenda individual (que cada deputado e senador tem direito)


R$ 16,3 milhões
é o valor extra da emenda individual após o acordo

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