Mudança em lei abre portas para o centrão em estatais, e deve passar no Senado

Aposta é que medida seja aprovada por ter potencial para beneficiar aliados em meio a negociações do governo eleito

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Brasília

A mudança na Lei das Estatais, aprovada de forma relâmpago na Câmara dos Deputados nesta terça (13), abre as portas para que o centrão e outros representantes da classe política ocupem cargos estratégicos nas empresas púbicas e em agências reguladoras e, com isso, exerçam influência direta sobre elas.

A votação repentina ocorreu no mesmo dia em que o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), anunciou o nome de Aloizio Mercadante para o comando do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

Segundo especialistas, a indicação do petista entra em conflito com a Lei das Estatais, que proíbe que as diretorias sejam compostas por integrantes das cúpulas dos partidos ou por quem participou de campanha eleitoral nos três anos anteriores.

Em conversas reservadas, membros da equipe de transição, porém, afirmam que a mudança na legislação era uma demanda dos políticos e, especificamente, do bloco do centrão, porque beneficia de forma ampla caciques partidários e parlamentares interessados em negociar tais postos em troca de apoio.

Foto mostra o ex-ministro Aloizio Mercadante, indicado para a presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Ele aparece na imagem segurando um microfone e discursando. É um homem branco, calvo e de bigode. Veste um terno preto, com camisa branca e gravata vermelha
Equipe da Lula defende que nomeação de Mercadante para o BNDES foi cortina de fumaça para mudança na Lei das Estatais, que era desejada pelo centrão - Pedro Ladeira/Folhapress

As mudanças ocorrem no momento em que partidos têm demandado cargos do governo eleito, que costurou uma frente ampla durante a campanha e tem procurado conquistar apoio para votações no Congresso —inclusive a PEC (proposta de emenda à Constituição) da Gastança, em reta final de tramitação, que prevê uma expansão de gastos de R$ 168 bilhões por exercício nos próximos anos (além de outras medidas).

No mesmo dia da votação relâmpago, Lula recebeu em seu hotel, para um café da manhã, o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL). Integrantes da equipe de transição reconhecem que a tramitação do projeto de lei foi discutida no encontro. No entanto, defendem que não houve qualquer tipo de pedido da parte do presidente eleito. Afirmam até que não estava previsto, inicialmente, o anúncio relativo a Mercadante.

O projeto de lei que flexibilizou a Lei das Estatais é de autoria de Celina Leão (PP-DF) e foi relatado por Margarete Coelho (PP-PI), ambas aliadas próximas de Lira.

A indicação de Mercadante, segundo os integrantes da transição, desviou o foco da opinião pública e jogou a responsabilidade pela mudança na lei na conta do PT.

A equipe de Lula tem defendido que havia segurança sobre a legalidade no caso do petista e que a alteração na lei não era necessária para o futuro presidente do BNDES. De qualquer forma, a alteração deve tornar mais confortável a aprovação dele para o posto e, independentemente disso, provoca efeitos mais amplos na política.

Apesar de o PT argumentar que o caso Mercadante estaria pacificado mesmo sem alterar a lei, o partido votou de forma favorável à mudança na Lei das Estatais. Apenas votaram contrariamente os deputados do PSDB e do Novo.

"A alteração na Lei da Estatais é um retrocesso histórico. Saímos de um país avançado que tem estatais, para uma república de bananas, cujas estatais servirão de cabide de emprego para político derrotado e seus afilhados", escreveu em suas redes sociais o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).

"Além disso, é uma burrice, porque o Aloizio Mercadante não precisava disso. Como Doutor em economia, sem mandato parlamentar há muito anos, sendo apenas presidente da Fundação do PT, e não do Diretório, sua indicação tem margem para uma apreciação positiva do Conselho do BNDES", completou.

Alguns parlamentares, mesmo adversários, corroboram o argumento da equipe de Lula.

Atualmente, a Lei das Estatais veda a indicação para esses cargos de pessoas que tenham atuado, nos últimos 36 meses, como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral.

O texto aprovado pelos deputados retira da lei a menção aos 36 meses. Além disso, inclui dispositivo que prevê que, para não haver vedação, a pessoa que tiver atuado em estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a campanha eleitoral deve comprovar o seu desligamento da atividade incompatível com antecedência mínima de 30 dias em relação à posse como administrador de empresa pública ou sociedade de economia mista, bem como membros de conselhos da administração.

A medida ainda precisa ser votada pelos senadores —a aposta é que será aprovada pela maioria. Há expectativa que isso ocorra já na quinta-feira (15). As bancadas do PSDB e do Podemos devem se mobilizar para barrar a medida, mas sem força suficiente para impedir a alteração na legislação.

Entenda a mudança

Lei das Estatais e lei sobre a gestão das agências reguladoras hoje:

Pessoa que atuou, nos últimos 36 meses, como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral não pode ocupar o conselho de administração ou a diretoria das estatais nem o conselho diretor ou a diretoria colegiada das agências reguladoras.

Como ficam ambas as leis com as alterações:

Passam a permitir esses casos, desde que pessoa que tenha atuado nessas situações comprove o seu desligamento da atividade com antecedência mínima de 30 dias à posse no cargo.

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