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Problemas da Oi começaram durante política de campeões nacionais; relembre a 1ª recuperação judicial

Em 2008, Lula, em seu segundo mandato, mudou a Lei Geral de Telecomunicações para que a empresa comprasse a Brasil Telecom.

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São Paulo

Pouco mais de um mês após encerrar um processo de recuperação judicial, a Oi foi à Justiça nesta quarta (1º) para impedir que seus ativos sejam bloqueados por credores, sinalizando que deve entrar com uma nova operação para tentar se reerguer.

A companhia, que declara dívidas da ordem de R$ 29 bilhões, argumenta que a primeira recuperação judicial teve "inquestionável sucesso", mas que sua situação financeira, aliada a fatores imprevisíveis, torna imprescindível recorrer a uma segunda reestruturação.

Caso se confirme, a Oi seria a única entre as grandes empresas a passar por dois processos do tipo. Inclusive, a companhia apareceria duas vezes na lista das cinco maiores recuperações da história do Brasil: em segundo e quinto lugar, respectivamente.

Assembleia geral de credores da Oi realizada em 2017
Assembleia geral de credores da Oi realizada em 2017 para discutir plano de recuperação judicial da empresa - Ricardo Borges/Folhapress

Na primeira vez, a Oi devia R$ 65 bilhões. O caso perde apenas para o da Odebrecht, que soma R$ 80 bilhões em passivo e ainda está em andamento. No entanto, considerando a quantidade de credores (cerca de 55 mil), o processo da tele é tido como um dos maiores da história do Brasil.

A recuperação judicial da Oi começou em 2016, mas a crise que levou ao pedido teve início bem antes, nos anos 2000.

Os problemas financeiros surgiram após uma série de decisões que pretendiam transformar a companhia numa grande líder do setor. O esforço fazia parte da política de campeões nacionais dos primeiros governos petistas.

Em 2008, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva —em seu segundo mandato— mudou a Lei Geral de Telecomunicações para que a Oi comprasse a Brasil Telecom.

Sem passar pelo Congresso, Lula assinou decreto permitindo a fusão das duas empresas. A regra em vigor na época proibia que um controlador fosse dono de duas concessionárias de telefonia fixa.

O argumento para transformar a Oi numa supertele nacional era de que o setor estava sendo invadido por companhias estrangeiras.

Embora criticada, a decisão do governo prevaleceu e a Oi passou a atuar em todo o país, com exceção de São Paulo —um dos principais mercados.

No entanto, no meio do processo de fusão, surgiu uma dívida de cerca de R$ 1,2 bilhão. O problema viria a se agravar anos depois.

Em 2010, a Portugal Telecom comprou 23% do capital total da Oi, culminando na fusão das duas companhias em 2014. Outra dívida, de 897 milhões de euros (R$ 4,894 bilhões), surgiu.

A união das teles ainda envolveu a transferência de ativos das duas empresas para uma nova companhia. Anos depois, minoritários acusaram os portugueses de aportar ativos superavaliados, como concessões na África, e passivos com vencimento no curto prazo.

A operação foi considerada o empurrão para o pedido de recuperação judicial, em 2016.

Para analistas econômicos, o projeto de criar uma supertele nacional gerou uma escalada do endividamento, e o caso foi considerado um marco do fracasso da política de criar campeões nacionais.

O começo da primeira recuperação judicial da Oi

O processo de recuperação correu junto à 7ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, a mesma para a qual o pedido de tutela desta quarta-feira foi enviado.

Na época, a companhia devia R$ 65 bilhões a 55 mil credores credores, como funcionários, fornecedores, bancos e investidores internacionais.

Num primeiro momento, a empresa negociou com cerca de 30 mil pequenos credores, que tinham menos de R$ 50 mil a receber.

O percurso até a aprovação do plano de recuperação foi conturbado, cheio de vaivéns. A assembleia com credores, por exemplo, chegou a ser adiada quatro vezes, por diversas razões, incluindo discordância de algumas partes interessadas.

A reunião foi feita em dezembro de 2017, um ano após o pedido de recuperação, e se tornou a maior assembleia de credores realizada no país. Foram mais de 600 pessoas inscritas, num encontro que durou 15 horas. A operação foi montada num pavilhão de 22 mil metros quadrados no centro de convenções Riocentro.

A assembleia aprovou a proposta apresentada pela Oi e, no mês seguinte (janeiro de 2018), a Justiça homologou o plano.

Marcela Cavallo, especialista em direito empresarial do escritório Zilveti Advogados, fez a defesa de alguns credores da Oi durante o processo.

Segundo ela, a operação correu bem tranquila, a despeito de ter sido a maior recuperação judicial do país. "Processualmente falando, não houve grandes desdobramentos", diz.

A advogada lembra que a Oi tinha a vantagem de possuir muitos ativos para fazer frente à dívida e apresentou um plano sólido de reestruturação.

A venda de ativos foi aprovada pelos credores em setembro de 2020. Três meses depois, em dezembro, a Oi fez leilão de sua rede de telefonia móvel por R$ 16,5 bilhões. Contudo, a divisão entre Claro, Vivo e Tim só foi acontecer em fevereiro de 2022, após longo processo no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica).

Em julho de 2021, a companhia vendeu sua unidade de fibra óptica por quase R$ 13 bilhões. Meses depois, negociou 8.000 torres de telefonia por R$ 1,7 bilhão.

O fim do processo de recuperação

A recuperação judicial da Oi foi encerrada em dezembro, após mais de seis anos de negociações.

"Chega ao fim o mais impactante e relevante processo de recuperação judicial do judiciário brasileiro, e um dos casos mais complexos do mundo jurídico contemporâneo", escreveu, à época, o juiz Fernando Viana.

Em comunicado no site, a Oi disse que o encerramento da operação representava a conclusão de um ciclo, durante o qual a companhia pôde se reestruturar. No entanto, destacou que o trabalho não havia terminado.

"Muito ainda tem que ser feito e a Oi está pronta para explorar todas as alternativas postas à disposição para melhor o seu perfil de dívida", diz o texto.

Ao fim do processo, a dívida líquida da Oi foi reduzida para R$ 18,3 bilhões.

Segundo Cavallo, embora a companhia tenha cumprido o que foi proposto no plano de recuperação, ela saiu muito debilitada.

A advogada lembra que um processo judicial engloba as dívidas que existem até o momento do pedido. Passivos posteriores não entram no acordo.

Por isso, o novo pedido de recuperação judicial, caso aconteça, deve ser focado em renegociar as "novas dívidas" —acumuladas após 2016.

O problema é que, diferentemente da primeira recuperação, a Oi não tem mais uma posição tão confortável em relação aos ativos para fazer frente à dívida.

Segundo Cavallo, um novo processo deve ser mais difícil. Assim como o da Americanas, a companhia deve precisar buscar aportes de investidores. "Dois pedidos tão próximos geram uma desconfiança também", pondera.

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