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Governo cede e negocia transformar MP do Carf em projeto de lei com urgência

Mudança de plano ocorre em meio a alerta de que, diante do impasse sobre tramitação no Congresso, medida provisória poderia perder validade

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Brasília

O governo negocia com o Congresso transformar a MP (medida provisória) que altera as regras do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) em um projeto de lei com urgência constitucional, em uma tentativa de evitar que o texto perca validade em meio às dificuldades em alcançar um acordo sobre o tema e à disputa entre Câmara e Senado sobre o rito de tramitação das peças.

A MP é um dos principais itens do pacote de ajuste fiscal apresentado pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) em janeiro. O texto caduca em 1º de junho.

Pacheco e Lira em cerimônia que confirmou a eleição de Lula. - 12.dez.2022-Ueslei Marcelino/REUTERS

Nesta terça-feira (11), estava prevista a instalação da comissão mista de deputados e senadores responsável por analisar o mérito da MP. Com a sinalização de acordo, no entanto, a sessão não foi realizada.

"A MP do Carf será um projeto de lei de regime urgência [constitucional] apresentado pelo governo. Houve uma manifestação da parte do Ministério da Fazenda, entendimento com o presidente da Câmara [Arthur Lira], com a coordenação política do governo, ministro Alexandre Padilha [Relações Institucionais], de que este era o melhor encaminhamento", afirmou o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).

Randolfe afirmou que Lira se comprometeu a votar o projeto de lei em até duas semanas. A Constituição determina que projetos enviados pelo presidente com urgência sejam deliberados em até 45 dias em cada uma das Casa do Congresso. Se isso não acontecer, trancam a pauta.

Para o senador, a decisão de encaminhar um projeto de lei com urgência constitucional foi a constatação de uma realidade. "Nós não conseguiríamos a instalação da comissão mista MP do Carf. O governo entendeu que era mais conveniente a apresentação de projeto de lei em regime de urgência", disse.

Mais cedo, Padilha afirmou que era "possível" enviar as mudanças no Carf via projeto de lei. "Ela [a MP] não pode ser incorporada às outras MPs. Vamos garantir a votação da lei do Carf, que tem tido impacto muito positivo, da forma mais rápida e célere possível aqui no Congresso Nacional", afirmou. "É possível que a do Carf venha a tramitar como PL de urgência para dar maior celeridade possível."

As negociações começaram em meio ao impasse entre Câmara e Senado sobre a tramitação das MPs. Lira queria manter o rito adotado para possibilitar a votação de medidas provisórias durante a pandemia de Covid-19, segundo o qual a Câmara analisaria primeiro o texto, que, então, seguiria para o Senado. A Constituição determina que as MPs sejam analisadas por uma comissão mista de deputados e senadores.

Diante da resistência, Lira passou a defender nos últimos dias que mais deputados que senadores integrassem as comissões mistas que analisam as MPs –condição que não foi aceita pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Pelas conversas em curso, mesmo com as mudanças, as MPs já enviadas não serão retiradas da tramitação –ou seja, elas continuam produzindo efeitos práticos até a aprovação do projeto de lei análogo (ou após o término do prazo de 120 dias).

Interlocutores da Câmara afirmam que o fato de os textos serem eventualmente enviados por meio de projeto de lei não faz com que eles estejam mais ou menos suscetíveis a alterações durante a tramitação do que no formato de uma MP.

Apesar disso, o simples fato de haver urgência constitucional não assegura a votação da proposta. Durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL), por exemplo, o governo foi obrigado a retirar o carimbo da urgência em determinados projetos diante da falta de acordo na Câmara.

Nesta terça, três comissões mistas foram instaladas: a que trata da estrutura do governo, a que instituiu o novo Bolsa Família e a do novo Minha Casa, Minha Vida. O ex-presidente do Senado e presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Casa, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), será presidente da comissão mista da MP que criou ministérios no início do governo Lula. O relator será o deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), líder do partido na Câmara.

O líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), foi escolhido presidente da comissão que vai analisar o Minha Casa, Minha Vida; e o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) relator.

Já a comissão mista da MP do Bolsa Família foi instalada sem relator e fará uma nova reunião nesta quarta. O líder do PT, senador Fabiano Contarato (ES), será presidente do colegiado, e o deputado Dorinaldo Malafaia (PDT-AP) o vice-presidente.

"Até semana que vem, a ideia é que essas três comissões mistas concluam o trabalho e encaminhem para o plenário da Câmara e depois para o do Senado. Estamos programando até o final do mês a instalação das comissões mistas, pelo menos mais duas MPs, a do Mais Médicos, e a do programa de alimentos", afirmou Randolfe.

Nesta terça-feira também foi instalada a CMO (Comissão Mista de Orçamento), presidida pela senadora Daniella Ribeiro (PSD-PB). O relator será o deputado Luiz Carlos Motta (PL-SP).

A MP do Carf sofria resistência entre lideranças da Câmara. Parlamentares do centrão davam como certa que ela seria derrotada na Casa.

Outra medida que sofre críticas entre parlamentares é a que extingue a Funasa, órgão que historicamente é usado como instrumento de negociação entre parlamentares.

O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), voltou a criticar essa MP em conversa com jornalistas nesta segunda.

"Acho que não é pauta para eu me preocupar aqui na Câmara. É uma matéria que, na minha opinião, não deveria ter vindo para cá. Nem sequer estou preocupado em instalar a comissão e nem vou me preocupar porque é uma matéria que não tem a menor importância para o país, extinguir ou manter a Funasa", afirmou.

Disputa

A tramitação das medidas provisórias tornou-se alvo de disputa entre a Câmara e o Senado e vinha ameaçando que matérias de interesse do governo perdessem o prazo, tornando-se sem eficácia. A polêmica está justamente no rito de apreciação.

Lira gostaria de manter uma regra excepcional instituída durante a pandemia segundo a qual as MPs são examinadas primeiro pelos deputados e depois pelos senadores —eliminando a etapa em que comissões formadas por representantes das duas Casas legislativas fazem a votação inicial.

Já Pacheco ampara-se na Constituição ao reivindicar a volta das comissões, de modo a restabelecer a influência de seus pares na análise das medidas.

Lira e Pacheco expuseram suas razões em artigos publicados pela Folha. O primeiro argumenta que o procedimento anterior à pandemia, além de disfuncional, atentava contra a representação popular ao fixar o mesmo número de deputados e senadores nas comissões.

O segundo defende o respeito à lógica bicameral do Legislativo, pela qual as duas Casas devem ter papel equivalente na confecção das leis.

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