Picapes crescem em participação e se consolidam entre modelos mais vendidos do Brasil

Segmento, que é mais rentável para as montadoras, ganhou força ao longo da pandemia

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São Paulo

Até o fim do ano, ao menos dez novas picapes terão chegado ao mercado brasileiro. Há desde a compacta Chevrolet Montana (a partir de R$ 118,7 mil) até a gigantesca RAM 1500 Limited (R$ 530 mil). Ambas têm caçambas pensadas para viagens e lazer, não para o trabalho.

Essa é a nova tendência do mercado, impulsionada pela busca constante de rentabilidade. As montadoras têm encontrado clientes interessados nesse tipo de veículo tanto por necessidade como por diferenciação.

"A questão da rentabilidade é observada mais nas picapes médias, onde o valor agregado do produto é muito maior do que nos modelos de entrada", diz Milad Kalume, gerente de desenvolvimento de negócios da Jato Dynamics. "É uma estratégia semelhante à adotada com os SUVs."

Picape RAM 1500 Limited
Picape RAM 1500 Limited tem motor 5.7 V8 e preço acima de R$ 500 mil - Divulgação

Os números mostram que o planejamento tem funcionado. Foram vendidas cerca de 330 mil picapes ao longo de 2022, o que fez o segmento atingir uma fatia de 17,7% do mercado de carros de passeio e veículos comerciais leves, segundo a Jato.

No primeiro trimestre de 2023, essa participação chegou a 19,3% do total de vendas no país, que é um valor bem acima da média global de comercialização desse tipo de veículo: 5,8%.

"O grande aumento [das vendas e da participação no Brasil] ocorreu entre 2020 e 2021, que se deve ao fato de as picapes serem menos tecnológicas do que outros veículos e, por isso, terem sofrido menos com a falta de semicondutores", afirma Kalume.

Além de manter um ritmo de produção mais regular em meio à pandemia de Covid-19, esses utilitários –principalmente os movidos a diesel– foram demandados pelo agronegócio, que seguiu ativo. Os produtores rurais têm acesso a descontos para compra de veículos de diferentes segmentos, além de contarem com linhas de crédito específicas.

Outra modalidade é o sistema chamado barter, que são transações baseadas na troca de mercadorias, sem intermediação monetária. Toyota e Stellantis (que reúne as marcas RAM, Fiat, Jeep, Citroën e Peugeot) lançaram essa opção em 2021, sendo possível trocar milho e soja por veículos.

A Mitsubishi aderiu à prática neste ano em sete estados: Bahia, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Piauí e Tocantins. O programa Mit Barter permite adquirir modelos como a picape L200 com pagamento em grãos. O utilitário custa a partir de R$ 244 mil na versão GL a diesel, exclusiva para vendas diretas.

As montadoras também aproveitam eventos regionais para ganhar mercado. A Nissan, por exemplo, ofereceu a Frontier com grandes descontos durante a Agrishow 2023. A feira realizada no início do mês em Ribeirão Preto (interior de São Paulo) teve até pistas de testes off-road. A picape da marca japonesa foi comercializada por R$ 200 mil na versão SE, um abatimento de 25%. O preço de tabela é R$ 267,7 mil.

A alta das picapes se deve também ao segmento de entregas urbanas, que se fortaleceu ao longo da crise sanitária e estimulou a procura pelas opções de pequeno porte.

Entre maio e julho de 2020, o site de compra e venda iCarros, do banco Itaú, registrou uma alta de 62% na busca por picapes em relação ao mesmo período de 2019. O modelo mais procurado foi a Fiat Strada, cuja nova geração tinha apenas dois meses de mercado.

Além do interesse natural pela novidade, havia o aquecimento do delivery como reflexo do distanciamento social.

As vendas decolaram, e o modelo se tornou o carro mais vendido do Brasil, posto que ocupa desde 2021. A versão cabine dupla com quatro portas ajudou a conquistar um novo público, que antes sonhava em ter um SUV compacto.

Mas se por fora o porte da Strada traz a impressão de ser um carro de segmento superior, por dentro o espaço é basicamente o mesmo do diminuto Fiat Mobi. O hatch empresta boa parte de seus componentes para o utilitário.

É nesse ponto que a rentabilidade volta à pauta. A versão mais simples da Strada com cabine dupla custa R$ 112 mil. O sistema de som é vendido à parte, mas há ar-condicionado, direção assistida e airbags laterais entre os itens de série. Seu motor 1.3 flex tem 109 cv de potência.

O Mobi tem motor 1.0 flex (74 cv) e só traz os airbags dianteiros exigidos por lei. Os alto-falantes estão lá, mas o rádio também é vendido à parte. De resto, o pacote de itens de série é semelhante ao da picape, mas o preço é bem inferior: R$ 69 mil, o que significa uma diferença de R$ 43 mil.

Com a falta de espaço em ambos, a vida é ruim para quem viaja no banco traseiro de um ou do outro carro. Ainda assim, é melhor estar no hatch, que tem encosto mais inclinado.

Esse problema vai ser percebido na maioria das comparações entre um automóvel de passeio convencional e sua versão com caçamba. Mas a capacidade de transportar todas as tralhas lá atrás parece convencer o público a gastar mais, mesmo que as sonhadas viagens com o mundo nas costas jamais aconteçam.

Para conciliar conforto e grande volume para cargas, é necessário investir em picapes médias e grandes. São modelos com mais de cinco metros de comprimento e pouco indicados para as cidades –tanto pelo tamanho como pelo maior índice de emissões. No campo, contudo, são objetos de desejo.

A novidade mais cara do segmento é a RAM 1500 Limited, lançada nesta quinta (18). Seus R$ 530 mil incluem luxos como o banco traseiro reclinável, ventilado e aquecido. É item de limusine, mas colocado em um utilitário que nasceu para puxar barcos e trailers pela América do Norte. A vocação justifica seu motor 5.7 V8 de 400 cv, cuja sede de gasolina é proporcional ao tamanho.

São 5,92 m de comprimento, 2,09 m de largura e 1,97 de altura. Ao abrir as portas, o estribo desce automaticamente. É um degrau para facilitar a entrada na cabine, lugar de onde se vê os outros carros de cima. Lá dentro há tela de 12 polegadas para a central multimídia e ajustes elétricos do volante e dos pedais.

Aos olhos da urbe, é um veículo desnecessário e inconveniente. Mas no Brasil abonado do agronegócio, tem fila de espera. O primeiro lote da RAM 1500 Limited, com 540 unidades, foi vendido em poucas horas nesta quinta.

Sua principal concorrente, a Ford F-150 (R$ 480 mil), passou pela mesma situação. No dia 14 de fevereiro, as primeiras 250 unidades foram comercializadas em menos de uma hora. No dia 16, a segunda leva de 250 veículos foi vendida em nove minutos.

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