Relator propõe limitar dívida no rotativo ao dobro da original se bancos não cortarem juros

Teto seria adotado se instituições não oferecerem uma taxa menor em até 90 dias

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Brasília

O relator do PL (projeto de lei) sobre o programa Desenrola Brasil, deputado Alencar Santana (PT-SP), pretende propor um limite para os juros cobrados no rotativo do cartão de crédito. A ideia é que a dívida do cliente não ultrapasse o dobro do valor original. O teto só valerá se as instituições financeiras não estabelecerem uma taxa menor para a modalidade em até 90 dias.

O relatório está em fase final de elaboração e deve ser apresentado ainda nesta semana.

A ideia principal é que as próprias instituições financeiras estabeleçam um teto a ser cobrado no rotativo, que precisará ser homologado posteriormente pelo CMN (Conselho Monetário Nacional). No entanto, se a medida autorregulatória não avançar no prazo de três meses, será imposto o limite global de juros determinado pelo texto do Congresso Nacional.

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Rotativo do cartão é uma modalidade de crédito emergencial - Gabriel Cabral/Folhapress

A proposta usa o mesmo parâmetro do modelo inglês, no qual a cobrança de juros não pode exceder o equivalente a 100% do montante original da dívida do cliente. Na prática, o valor a ser quitado pode ser no máximo duplicado.

O projeto original, de autoria do deputado Elmar Nascimento (União Brasil-BA), aliado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), determina que o CMN iria estabelecer limites para a cobrança desses juros.

"As taxas de juros remuneratórios cobradas na modalidade mencionada no caput não poderão ser superiores a limites já estipulados para modalidades de crédito com perfil de risco semelhante, a exemplo do que já ocorre com as taxas cobradas sobre o valor utilizado do cheque especial", diz um dos pontos da proposta.

A medida, contudo, é classificada como intervencionista e artificial pelos setores envolvidos, que criticam qualquer forma de tabelamento de juros.

O relator também vai incluir na proposta para o rotativo a portabilidade de crédito, que permite a transferência de uma dívida de uma instituição financeira para outra que ofereça melhores condições de pagamento.

No Brasil, a portabilidade é aplicável apenas para outras modalidades, não para o rotativo. Essa medida é vista como uma forma de estimular a competição no sistema financeiro brasileiro, ajudando a reduzir os juros na linha mais cara do mercado.

Em junho, a taxa média de juros cobrada pelos bancos de pessoas físicas no rotativo do cartão de crédito foi de 437,3% ao ano, segundo dados do Banco Central. Naquele mês (último dado disponível), a inadimplência na modalidade ficou em 49,1%.

A portabilidade da dívida do cartão foi uma das alternativas apresentadas por representantes de instituições de pagamento e do segmento de maquininhas de cartão ao ministro Fernando Haddad (Fazenda) na última quinta-feira (17).

Esse também é um dos caminhos defendidos pelo presidente da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), Paulo Solmucci.

"Nossa sugestão é que se abra portabilidade dessa dívida, ou seja, a pessoa que ficou inadimplente possa levar esse parcelamento para qualquer outra instituição que tenha interesse em fazer uma taxa menor, como já acontece com financiamentos de imóveis", disse à Folha.

Na visão dele, é necessário combinar essa medida com o fim do rotativo do cartão de crédito, de forma que quem não pagar a fatura integral do cartão seja automaticamente redirecionado para o crédito parcelado, que possui taxas de juros mais baixas. Desde 2017, o cliente pode passar no máximo 30 dias no rotativo.

"A gente precisa de um ajuste na oferta de cartões, uma competição por meio da portabilidade e o fim do rotativo com juros extorsivos", afirmou.

Para Solmucci, modificações no parcelamento de compras sem juros não deveriam estar sendo discutidas no mesmo âmbito das conversas relativas ao rotativo do cartão.

Defendida por entidades ligadas a setores de pagamentos, comércio e serviços, essa modalidade não será tratada no relatório que será apresentado por Santana na Câmara dos Deputados.

De acordo com o relator, também não haverá mudanças significativas na formatação do Desenrola, programa de renegociação de dívidas lançado pelo governo Lula (PT).

O tema que mexe com o mercado de crédito ganhou mais visibilidade depois que o presidente do BC, Roberto Campos Neto, sinalizou a senadores há duas semanas que o fim do rotativo do cartão era a solução que estava "se encaminhando" no debate de medidas para reduzir os altos juros e a inadimplência da modalidade.

Na ocasião, ele falou também sobre a possibilidade de criar uma tarifa para frear o parcelamento sem juros –caminho que, segundo relatos de pessoas envolvidas pela negociação, não é bem visto nem por técnicos da autoridade monetária.

O chefe do BC contou ter levado um "puxão de orelha" por ter antecipado o tema na sessão especial no Senado. Em suas últimas declarações, Campos Neto evitou novas polêmicas e defendeu que é preciso encontrar um reequilíbrio na equação.

Ele vem destacando que o parcelamento sem juros é "muito importante" para o consumo da população brasileira e que não pode haver rupturas, embora diga que ainda não há uma solução definida para o problema.

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