Rentabilidade é prioridade e envolve reajuste em plano de saúde, diz CEO da SulAmérica

Para Raquel Reis, coparticipação e flexibilização de franquia são alternativas

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São Paulo

Para tentar amenizar a crise enfrentada pelo mercado de planos de saúde no Brasil, a presidente da SulAmérica, Raquel Reis, afirma que o setor caminha na direção do aumento de preços.

A meta é elevar a rentabilidade, ainda que isso provoque a saída de clientes. Neste ano, a carteira de planos empresariais da operadora teve reajuste médio de 22,5%. Mas Reis diz que o mercado tem mostrado elasticidade, ou seja, o cliente ainda aceita o reajuste sem abandonar o plano.

"Rentabilidade é prioridade. Ainda que tenhamos de entregar um crescimento menor do que poderia, isso é uma coisa que a gente vai admitir em função da rentabilidade."

A presidente da SulAmérica, Raquel Reis, aparece na foto apoiada na janela do escritório. Não é possível ver a paisagem pela janela. Só os vidros. Ela está de lado, vestida de preto. Tem cabelos loiros
Raquel Reis, presidente da SulAmérica - Adriano Vizoni/Folhapress

O que tem acontecido nas negociações para segurar o reajuste é um aumento da coparticipação, arranjo em que o beneficiário banca parte dos serviços que utiliza do plano. A restrição dos reembolsos também tem avançado, segundo ela.

Entre as alternativas para dar sustentabilidade ao setor, a executiva defende uma flexibilização das franquias, modelo em que é estabelecido um valor no contrato até o qual a operadora não tem responsabilidade de cobertura.

Pelas regras atuais, a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) determina algumas vedações à franquia, como a diferenciação por faixa etária e o financiamento integral do procedimento por parte do beneficiário.

Como a saúde suplementar vai lidar com o dilema da alta dos preços e da sinistralidade?
O mercado teve um prejuízo histórico em 2022. Precisa de um turn around [recuperação de empresas]. O setor já chegou a abarcar 25% da população brasileira e hoje está em 23%. As operadoras têm buscado aproximação do governo. Precisamos discutir juntos.

Quando a pandemia começou, a sinistralidade ficou artificialmente baixa porque a utilização caiu. Estamos pagando o preço da sinistralidade alta neste momento em função da precificação que ficou defasada.

E teve o rebote da pandemia. Tudo o que não foi usado não só voltou a patamares históricos, como houve diagnósticos de câncer tardios e um custo assistencial mais alto, pessoas que tiveram acometimentos graves da parte respiratória e emocional. São efeitos de longo prazo e oneram o setor.

O cenário de inclusão no rol de procedimentos e medicamentos especiais também preocupa, porque uma série de terapias que tinham limite passou a ser ilimitada, como as do espectro autista.

Além disso, há medicamentos entrando no mercado brasileiro com flexibilidade maior do que em outros países. Um exemplo é o Zolgensma, da Novartis, que custa mais de R$ 8 milhões a dose única. Se uma pequena operadora tiver um ou dois medicamentos deste, ela quebra.

Há reclamações contra o que tem sido chamado de higienização de carteira, em que as operadoras cortam contratos de beneficiários para reduzir custo. Essa prática tem sido conversada no setor?
Não. Eu soube disso da mesma forma que o público geral, vendo reportagens. É muito difícil ver esse tipo de atitude por parte de qualquer operadora. O risco de isso voltar por liminar para a manutenção desses beneficiários é enorme. A SulAmérica não faz isso.

Qual é a solução para baixar a sinistralidade?
Rentabilidade é prioridade, ainda que tenhamos de entregar um crescimento menor. Para isso, obviamente, a gente passa pelo reajuste, que tem atingido patamar alto neste ano. A gente sabe disso, em todas as operadoras, em função desse estoque de anos de pandemia que ficaram com reajuste subprecificado.

Passa também por coparticipação. Eu tenho aqui na carteira hoje mais de 75% do estoque dos planos empresariais já com algum modelo de coparticipação. Na venda nova, vem acima de 92%.

Muitas vezes as pessoas acham que o plano de saúde quer economizar. Não é verdade. O que a gente quer pagar é uma investigação bem-feita. É dinheiro mal gasto quando a pessoa faz o exame e nem sequer volta para pegar o resultado. Isso volta depois em forma de reajuste.

Nos planos com coparticipação, as frequências de uso são mais baixas do que naqueles sem coparticipação. Essas pessoas se tratam menos? Não. Elas se tratam melhor. Fazem o diagnóstico do começo ao fim. Isso é bom para o mercado, para os empregadores e ajuda a deixar o preço mais estável.

Se a alta de preço é inevitável, o mercado de planos de saúde pode ficar menor?
O mercado como um todo tem tido elasticidade. O risco maior é uma estagnação. A pauta que deveríamos ter é: como desafogar o SUS? Isso passa pela participação maior do consumidor, como a coparticipação, e por repensar o olhar regulatório.

Hoje, o produto é ilimitado e tem muita judicialização. Será que não poderíamos pensar em alternativas de produtos mais modulares e inserção de franquias? A franquia em saúde existe em vários países e é bem aceita. Existe no mercado de automóvel no Brasil. Por que a gente não pensa na franquia no mercado de saúde?

Como funcionaria?
Se eu tenho um seguro de carro e nele acontecer qualquer evento, por exemplo, até R$ 12 mil, sou eu quem pago. Acima disso, vai para a seguradora de automóvel. É o conceito de franquia. Serve para tirar o risco mais baixo da seguradora e deixar ela se concentrar no grande risco. Traz redução de preços.

Isso existe no mercado de saúde em outros países. A ANS deveria olhar. Vai permitir que o mercado trabalhe com preços bem mais acessíveis e que o setor cresça.

O mercado está demonstrando elasticidade? O consumidor está aceitando a alta de preço?
É isso. No mercado empresarial, que não tem o reajuste regulado, neste ano, estou com um reajuste médio aplicado de 22,5%, sem considerar a variação por faixa etária.

Ainda assim eu tive um crescimento de base de beneficiários superior a 100 mil vidas comparado a dezembro de 2022. Isso mostra que os clientes estão aceitando o reajuste, entendendo o momento.

Mas o cliente tem feito downgrade de plano para conseguir pagar?
Pontualmente acontece, mas eu não tenho vistoe. O que eu tenho visto é aumento de coparticipação, que ajuda a baixar o reajuste.

Se eu tenho um cliente com 10% de reajuste e ele aceita colocar coparticipação de 30%, ele vai ter zero de reajuste neste ano. Outro ponto é a redução dos valores de reembolso ou a retirada do reembolso em alguns procedimentos.

E as fraudes? Como estão investigando e qual é o resultado?
Nesse tipo de situação sempre tem um intermediador. A clínica faz anúncio em rede social chamando para fazer botox ou ácido hialurônico pelo plano com reembolso assistido.

Eles pedem login e senha do aplicativo. Isso é quase como dar a senha do banco. Essas clínicas, muitas vezes, mascaram procedimentos estéticos cobrando outros procedimentos que não aconteceram.

Temos mais de cem notícias-crime realizadas nessas investigações. Muitos beneficiários são coniventes, mas muitos não sabem que estão participando de fraude. Quando eles entendem, ficam apavorados porque também são passíveis de notícia-crime.

Os casos detectados de fraude têm gerado cancelamento do plano?
No individual gera o cancelamento. E nos empresariais, informamos a empresa contratante que essa pessoa não mais será aceita como beneficiária. O que estamos vendo na maioria dos casos é demissão por parte do contratante, a maior parte por justa causa.

Muitos médicos reclamam que os planos lhes pagam pouco por consulta e preferem atender no particular. Aí o paciente pede o reembolso do plano, mas há muitos casos de médicos que emitem mais de um recibo para o mesmo atendimento. O setor está avaliando isso?
Estamos na SulAmérica entre os maiores valores de consulta pagos aos médicos.É claro que sempre tem um ponto a melhorar, e a remuneração sempre vai ser uma das nossas metas.

O médico pode decidir se quer trabalhar com convênio, plano, seguradoras, ou se prefere trabalhar com livre escolha. Agora, uma vez querendo livre escolha, ele tem de dar só uma nota fiscal para cada consulta.


RAIO-X | RAQUEL REIS, 40
Ingressou na SulAmérica em 2011 como gerente e passou por cargos de superintendente, diretora e vice-presidente. Atuou na rede hospitalar por cerca de um ano e retornou à operadora neste ano como CEO de saúde e odonto

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