Setor imobiliário vive 'otimismo moderado' com Selic em queda, novo Minha Casa e Plano Diretor

Perspectiva de juros abaixo de 10% em 2024 dá força a investimentos no setor

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Construção de prédio na r. Campevas, esquina com a r. Bartira, no bairro Perdizes, em São Paulo; primeiro semestre foi de queda nos lançamentos, mas mercado imobiliário já vê reação Danilo Verpa-21.jul.23/Folhapress

São Paulo

O mercado imobiliário brasileiro entrou no terceiro trimestre de 2023 em clima de otimismo moderado, depois de um semestre marcado por juros altos, crédito reduzido e muito malabarismo para convencer o cliente a fechar uma compra que comprometerá parte de sua renda por anos.

O primeiro corte na Selic, a taxa básica de juros da economia, e a perspectiva de novas reduções nas próximas reuniões do Copom (Comitê de Política Monetária) se somaram à queda da inflação, à taxa de desemprego menor e às novas regras para o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida. Esses fatores deram fôlego ao setor.

Além disso, a Reforma Tributária, o novo arcabouço fiscal —aprovado na terça (22) na Câmara dos Deputados— e a revisão do Plano Diretor em São Paulo também influenciam as decisões de incorporadores e construtores para os próximos meses e anos.

Para o CEO da Benx, Luciano Amaral, os humores no mercado estão hoje muito melhores do que estavam no início do ano. A transição de governo e os dados da economia naquele momento –Selic em 13,75%, inflação em 5,77% e desemprego em 8,4%– traziam insegurança ao ambiente de negócios.

Agora, porém, os números são melhores.

Houve queda no desemprego, a inflação medida pelo IPCA bateu 3,99% em julho e a Selic teve o primeiro corte, de 0,5%, e está em 13,25%. "A tendência de queda é muito importante", diz o incorporador.

Construção de prédio na av. Sumaré, em São Paulo; revisão do Plano Diretor movimenta negócios na capital paulista - Danilo Verpa-21.jul.23/Folhapress

Ele cita ainda a Reforma Tributária, a nova âncora fiscal e a retomada das discussões de uma nova regra para o funcionalismo público na reforma administrativa. "Isso tudo traz um horizonte muito positivo para o segundo semestre e para o próximo ano."

Para Daniel Terepins, diretor de incorporações da Nortis, o ambiente menos polarizado politicamente dá aos clientes mais tranquilidade para fechar negócios. "Os ciclos no mercado imobiliário são muito longos. O cenário mais estável favorece a decisão de compra."

A perspectiva de que os juros passem a cair nas próximas reuniões é um "começo de movimento", diz Terepins. A taxa afeta o mercado de imóveis em duas frentes. Do lado do comprador, que perde capacidade de endividamento quando o custo do crédito sobe, e na produção, uma vez que muitas empresas precisam de financiamento bancário para colocar os negócios de pé.

Na abertura de um congresso realizado pelo Secovi-SP (sindicato da habitação em São Paulo) na última semana, Rodrigo Luna, presidente da entidade, disse que "graças a Deus começamos a ver um movimento de redução na taxa básica de juros".

Ele afirmou acreditar que o corte trará nova dinâmica ao setor, principalmente a partir do segundo semestre de 2024. Economistas ouvidos pelo Banco Central no boletim Focus projetam Selic em 11,75% ao fim de 2023 e em 9% no ano que vem.

A primeira metade de 2023 acumulou números ruins para o setor de imóveis. Houve queda de 10,5% nos valores financiados com recursos da poupança, segundo dados da Abecip (Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança). No número de unidades financiadas, a redução foi de 26,5%.

Na capital paulista, os lançamentos caíram 12% de janeiro a junho, na comparação com o mesmo período do ano passado, segundo o Secovi-SP. Em todo o Brasil, até maio, os lançamentos recuaram 7,8%, de acordo com a Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), com base em dados da Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias).

Para o diretor-geral para América Latina da Ivanhoé Cambridge, Adriano Mantesso, o momento é favorável para que as empresas se posicionem no mercado antes de os preços voltarem a subir. No segmento imobiliário, afirma, a dependência das taxas de juros é "extrema".

A perspectiva de redução, diz, é notável para o reaquecimento dos negócios. "Reconheço a importância do timing e do contexto econômico, e estou tomando medidas estratégicas nos nossos investimentos para maximizar os benefícios desse cenário no mercado imobiliário."

Luiz Antonio França, presidente da Abrainc, considera que a aprovação do novo arcabouço fiscal, a Reforma Tributária e a redução dos juros dão movimento ao mercado, que já estaria retomando o volume de lançamentos diante da redução do estoque de unidades prontas.

Ele cita ainda a elevação da nota de crédito do Brasil por agências de rating, como a Fitch. "É um gatilho importantíssimo. Olhando para o futuro, é bastante promissor", afirma.

Bruno Sindona, da incorporadora de mesmo nome, considera que as perspectivas estão boas, ainda que a velocidade das mudanças seja baixa.

"Viemos de um cenário de inflação muito alta que atrapalhou construtoras e incorporadoras, e isso fez com que a velocidade delas para crescer também fosse prejudicada. O otimismo já existe, mas a condição prática de acelerar esse mercado, ainda não."

Sindona vê um conjunto de sinais positivos, como a queda da inflação e a tendência de redução dos juros, que devem aumentar o volume de crédito no mercado. Houve ainda o aumento no subsídio para o Minha Casa, Minha Vida, programa que foi vitrine da política habitacional nas gestões petistas sob Lula e Dilma.

Fábio Tadeu Araújo, sócio-diretor da Brain Inteligência Estratégica, vê o Minha Casa sendo afetado também pela revisão do Plano Diretor em São Paulo e pela nova Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo, essa última ainda em discussão.

"O novo Plano Diretor cria regras para o aluguel social, que pode mudar a dinâmica da produção para baixa renda, ampliando os incentivos para que empresas produzam mais projetos Minha Casa, Minha Vida", afirma Araújo.

Para o setor de incorporação, a revisão do Plano Diretor corrigiu distorções da regra anterior e poderá "desengessar" negócios.

Na incorporadora Benx, três projetos voltados ao altíssimo padrão estão sendo alterados para aplicação das novas regras para vagas de garagens, revisadas no plano. Na regra anterior, os imóveis no entorno dos eixos de transporte podiam ter até uma vaga por apartamento.

Empresários do setor dizem que limitação levou à necessidade de combinar em um mesmo imóvel apartamentos de diferentes tamanhos e perfis para que fosse possível, por exemplo, ceder a vaga de um studio para outro de metragem superior. "Até a gestão do condomínio ficava mais difícil, porque você tinha perfis muito diferentes de famílias no mesmo lugar", diz Luciano Amaral, CEO da Benx.

Indicadores de confiança da indústria da construção mostram melhora nos dois últimos meses. O ICST (Índice de Confiança da Construção), do Ibre-FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), subiu 1,3 ponto em julho depois de dois meses queda.

Segundo a coordenadora de projetos de construção do Ibre-FGV, Ana Maria Castelo, houve recuperação no indicador de demanda futura e aumento no quadro de pessoal. Esse último item poderá sustentar um aquecimento do mercado de trabalho no setor.

O indicador da CNI (Confederação Nacional da Indústria) registrou aumento de 2,7 pontos em agosto na comparação com julho —são quatro meses consecutivos de alta. A pesquisa da entidade também indicou otimismo do setor no próximo semestre.

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