Descrição de chapéu Financial Times casamento

A decisão mais importante que você fará sobre sua carreira é com quem vai se casar

Apoio de um parceiro tem influência importante sobre a vida profissional

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Emma Jacobs
Financial Times

O drama-comédia "You Hurt My Feelings" (lançado neste ano nos EUA) gira em torno do que parece ser um acontecimento sem importância maior. Beth, escritora nova-iorquina representada por Julia Louis-Dreyfus, ouve por acaso seu marido dizendo que não gosta do manuscrito do romance dela. "Nunca mais vou poder olhá-lo na cara", ela diz, profundamente magoada.

Minha primeira reação ao filme escrito e dirigido por Nicole Holofcener foi "sorte dela!". Não por tratar-se de um problema de primeiro mundo (para usar o jargão do momento), fato que Beth reconhece. "Sei que o mundo inteiro está indo para o buraco", ela diz. "Mas isto daqui é o meu mundo. Meu próprio mundinho pequeno e narcisista."

"Sorte dela!" é porque Beth fazia um trabalho que seu marido conseguia entender.

Muitos trabalhos de escritório são opacos para quem é de fora –e provavelmente até para algumas das pessoas que os realizam. Na série "Friends", o mistério da profissão de Chandler Bing dá lugar a muitas piadinhas. "Alguma coisa a ver com números", palpita Rachel em um quiz, para então adivinhar: "Transpônster!". "Isso não existe", responde Monica. Muitas pessoas acharam graça porque se identificaram com a situação.

Ilustração vetorial colorida de namorada ou colega ajudando e compreendendo homem com nuvem escura e chuva sobre a cabeça
Ilustração de mulher apoiando amigo deprimido - Bro Vector/Adobe Stock

Outro desafio comum que Beth, a personagem central, evita: pelo fato de trabalhar em um projeto solo, ela não é obrigada a mapear as personalidades e os processos em seu local de trabalho. A política do escritório só é interessante para pessoas envolvidas na intriga. E tentar acompanhar o que está acontecendo pode ser exaustivo e chato.

Mas desconfio que a compreensão dessas realidades tenha aumentado devido aos lockdowns, que obrigaram muitas pessoas a habitar o mundo de colarinho branco de seu parceiro. Algumas foram às redes sociais para compartilhar suas revelações. "Meu marido descobriu que eu sou a pessoa que diz ‘vamos assegurar que isso se alinhe com a marca’, e ele está pasmo", escreveu uma mulher. "E eu fiquei sabendo que ele é o cara que diz ‘ok, a gente acerta os detalhes quando eu te ligar mais tarde’."

O filme de Holofcener chama a atenção para uma questão profissional importante: o apoio do parceiro. "A decisão mais importante que você fará sobre sua carreira é com quem vai se casar e que tipo de relacionamento terá com essa pessoa", diz o livro "Dinheiro e Amor: Um guia inteligente para as grandes decisões da vida", publicado este ano e um dos poucos a tratar desse tópico.

Não se trata apenas de finanças, dividir o cuidado dos filhos e as tarefas da casa. Quando Blake Dustin Mathias, professor de empreendedorismo na Kelley School of Business, da Indiana University, analisou o impacto dos cônjuges sobre os empreendedores, constatou que "o apoio emocional é crucial", ele me disse, mais crucial do que apoios palpáveis, incluindo dinheiro.

Esse tema é algo que surge com frequência em sessões com a coach executiva Kate Franklin. Mas ela diz que poucos clientes sabem como é esse tipo de apoio, porque é algo tão particular. "As pessoas que recebem apoio de seu cônjuge não costumam sair dizendo ‘sou uma pessoa de sorte’. Isso pareceria arrogância."

Alguns dos comportamentos que Mathias identificou entre parceiros empreendedores parecem ser amplamente aplicáveis –como demonstrar empatia com os desafios, ouvir o outro, festejar as conquistas e propor distrações--, especialmente quando o parceiro está passando por uma fase difícil no trabalho ou sentindo solidão no topo de sua organização.

Amor mais trabalho dá um campo minado emocional. Os casais que trabalham no mesmo setor podem entender a substância do trabalho um do outro, podem oferecer redes de contato e oportunidades de trabalho um ao outro, mas outras pressões entram em jogo que têm o potencial de criar ciúmes. Um amigo ator observa: "A infelicidade adora companhia"; contudo, se um dos cônjuges começar a ter sucesso profissional enquanto o outro não tem, o outro "pode sentir-se arrasado".

Para Beth, em "You Hurt My Feelings", há uma questão existencial: pode seu marido amá-la se ele não respeita seu trabalho? Pode ser necessário que os parceiros assumam as ambições de longo prazo um do outro. Ou, como diz meu amigo ator, que entendam que os bicos distribuindo folhetos no parque fantasiado de galinha são trampolins para algo melhor no futuro.

O respeito é uma questão que aparece nas sessões de terapia com Philippa Richardson, fundadora de The Circle Line, que oferece terapia a clientes corporativos. Isso se aplica não apenas a artistas e profissionais criativos, mas também a advogados, chefes de cozinha e empresários cuja autoestima pode depender de seu trabalho. "É como se esquecessem todo o resto do que são", diz ela, que costuma recomendar que as pessoas se enxerguem como mais do que apenas o trabalho que fazem.

O sentimento de que um parceiro não respeita seu trabalho também pode refletir o sentimento da própria pessoa. Foi o caso de Chandler Bing em "Friends", que acabou admitindo que não estava feliz no trabalho e mudando de emprego.

Às vezes a solução é abandonar seu parceiro. E aqui há uma boa notícia. Pesquisa recente sobre pessoas que estão passando por um divórcio constatou que muitas pensam que o divórcio prejudicou seu trabalho. Mas uma parcela surpreendentemente grande (39%) achou que teve "um impacto positivo, por lhes dar mais tempo e energia" e aumentar sua motivação.

Às vezes a autossuficiência acaba ganhando.

Tradução de Clara Allain

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