Leila Barros vai apresentar novo relatório no Senado para regular mercado de carbono

Texto apresentado no final de agosto com apoio do governo federal recebeu críticas de entidades privadas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

A senadora Leila Barros (PDT-DF) deve juntar sugestões recebidas e apresentar na próxima semana um novo relatório do projeto de lei que regulamenta o mercado de carbono no Brasil. O primeiro texto foi entregue no final de agosto à Comissão de Meio Ambiente do Senado.

Nos últimos dias, a senadora se reuniu com governadores, além de representantes do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável e da Febraban.

Antes de fechar o novo texto, ela vai ainda conversar com representantes do agronegócio, setor com mais ressalvas públicas ao projeto. O novo texto vai incluir sugestões.

Senadora Leila Barros (PDT-DF) discursa no plenário do Senado Federal, em Brasília
Senadora Leila Barros (PDT-DF) discursa no plenário do Senado Federal, em Brasília - Roque de Sá - 15.ago.23/Agência Senado

O relatório original apresentado por Barros foi baseado em sugestões do grupo de trabalho do governo, coordenado pelo Ministério da Fazenda em conjunto com outras nove pastas.

"Entendemos que a relatora e sua equipe estão realizando aprimoramentos para tornar a lei mais conciliatória, de forma que nossas manifestações têm sido no sentido de preservar a isonomia, credibilidade e integridade do SBCE [Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa]", diz a pasta, em nota.

Em resumo, o texto instala o SBCE como o mercado de carbono no país passará a ser chamado.

De acordo com a proposta, o órgão gestor desse mercado será responsável por definir os limites de emissão de CO2 na atmosfera por setor da economia. O relatório prevê que os números sejam divulgados todo ano, mas a Folha apurou que o governo federal estuda ampliar o prazo para até cinco anos.

A metodologia, ainda não divulgada, deve considerar a natureza de cada atividade e a média de emissões dos últimos anos por setor. Segundo o relatório, estarão sujeitas obrigatoriamente ao mercado regulado empresas que emitam acima de 10 mil toneladas de CO2 por ano.

As empresas que conseguirem conter suas emissões para além do necessário poderão vender suas cotas para aquelas que ultrapassarem o teto estipulado. A ideia, porém, é que haja um limite na compra dessas cotas para incentivar que as companhias cumpram suas metas por conta própria.

Esse limite, estipulado posteriormente, pode chegar a 20% do teto de emissões, segundo quem participa das conversas sobre o tema. Haverá também a possibilidade de comprar créditos do mercado voluntário de carbono —que não deixará de existir.

No setor privado, com exceção do agronegócio, há consenso de que a base do relatório original é boa, ainda que haja discordâncias sobre alguns pontos.

A principal delas, por exemplo, passa por quem será o responsável por aprovar os tetos de emissões e estabelecer as diretrizes gerais do mercado regulado.

O texto apresentado pela senadora atribui esse papel ao Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima, criado pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em junho e formado por 18 ministros.

Empresários e entidades privadas defendem que essa função seja de algum órgão menos político, com participação da sociedade civil e das próprias empresas reguladas.

"Houve um retrocesso na discussão sobre o tema. Entendemos que o projeto concentra poder na mão do Executivo, e todas as questões principais ficam para regulamentação após a aprovação do projeto. Não há clareza", diz Rodrigo Justus, assessor técnico de meio ambiente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil).

O setor é reticente à entrada a esse mercado como agente regulado e deseja que as regras de sua participação sejam mencionadas ainda no projeto de lei.

Outro ponto de destaque nos debates sobre o projeto é em relação à natureza jurídica dos ativos criados pelo sistema. O relatório os define como mobiliários, o que os coloca sob a alçada da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) e sujeitos à tributação como tal. Hoje, a legislação define uma alíquota de 15% no Imposto de Renda sobre o lucro mensal superior a R$ 20 mil em vendas de ações.

A preocupação das empresas é que a alíquota torne o desenvolvimento de projetos de carbono menos atraente. "Atualmente, para aqueles que estão no lucro presumido, a grande maioria dos proprietários e parte dos desenvolvedores paga uma tributação menor que a proposta no PL pelo ganho de capital, o que na prática significaria uma majoração dos tributos incidentes e não um incentivo às transações", afirma Annie Groth, vice-presidente da Aliança Brasil NBS, que representa entidades com mais de 70% dos créditos relacionados ao uso da terra emitidos no Brasil.

À Folha, as queixas foram postas também pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS).

A Aliança enviou à reportagem uma nota de quatro páginas, enumerando os pontos que considera mais preocupantes. No topo está a falta de clareza quanto às metodologias que serão aceitas no mercado regulado. A aliança tem receio de que aquelas hoje adotadas pelo mercado voluntário não sejam válidas.

Além disso, a indústria cobra que o texto no Congresso crie incentivos para facilitar o cumprimento das metas pelas companhias. O setor deve ser o maior impactado com a regulamentação do crédito de carbono.

Até por isso, a CNI (Confederação Nacional da Indústria) está preocupada com as penalidades impostas no relatório. O texto original da senadora estipula multas por não cumprir as obrigações de até R$ 5 milhões, além de proibir que empresas participem de linhas de financiamento ou de contratos com o Estado.

"É claro que precisamos estabelecer consequências, mas precisamos ter no radar essa curva de aprendizagem. Não podemos inviabilizar o sistema. Primeiro precisamos sentir a demanda e as dificuldades", diz Davi Bomtempo, gerente executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI.

Se aprovado na Comissão de Meio Ambiente, o projeto de lei vai direto para a Câmara dos Deputados, sem necessidade de passar pelo plenário do Senado.


Entenda o relatório

Teto de emissões
O órgão regulador do mercado de carbono do Brasil estipulará tetos de emissões de CO2 para cada setor e atividade

Comercialização de cotas
Empresas que conseguirem cumprir as metas com folga poderão comercializar as cotas que sobraram de sua carteira com empresas que não conseguiram cumprir suas metas

Limite
O relatório não estipula, mas a ideia é que haja um limite de quantas cotas as empresas poderão comprar

Mercado voluntário
O mercado voluntário continuará operante. Os créditos deste mercado, porém, só serão válidos para a compensação de emissões se seguirem as normas do órgão regulador

Controle de preços
O órgão regulador será responsável por controlar o preço das cotas. Para isso, ele pode disponibilizá-las gratuitamente no mercado, caso a oferta esteja baixa

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.