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Eleições 2024

Lula torna trabalho de Haddad mais difícil nas duas pontas do cobertor

Presidente dá espaço a aliados que querem gastar e reduz pressão sobre Congresso por arrecadação

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Brasília

Lula (PT) desfez um segredo mal guardado. Pouca gente em Brasília acreditava na promessa de zerar o déficit das contas do governo em 2024. O silêncio do presidente sobre o assunto, no entanto, ajudava Fernando Haddad (Fazenda) a manter o compromisso de que haveria um esforço concreto para alcançar a meta, mesmo que ela não fosse atingida.

Se aquele era um teatro para controlar as expectativas sobre a economia, Lula fez questão de acabar com a encenação. Ao afirmar que "dificilmente chegaremos à meta zero", o presidente afrouxou os parâmetros de despesas e receitas, tornando o trabalho de Haddad duas vezes mais difícil.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao fundo. - Marcelo Camargo - 09.dez.2022 / Agência Brasil

O ministro da Fazenda estava de olho nas duas pontas do cobertor. De um lado, travava disputas com auxiliares de Lula interessados em ampliar despesas para gerar ganhos políticos e estimular a atividade econômica. De outro, tentava dobrar a resistência do Congresso a propostas amargas para aumentar a arrecadação.

A meta zerada para o ano que vem era o argumento principal de Haddad para manter o equilíbrio entre essas duas pontas. Ainda que o ministro não conseguisse garantir que ela seria alcançada, mantê-la no mesmo lugar contava a favor nas negociações.

As declarações de Lula no café da manhã com jornalistas desta sexta-feira (27) tiram o alvo das mãos de Haddad. O presidente disse que a meta fiscal "não precisa ser zero", citou a possibilidade de um déficit de 0,25% ou 0,5% do PIB e, na prática, evitou se comprometer com um número fixo: "Vamos fazer aquilo que vai ser melhor para o Brasil".

De uma só vez, Lula abriu espaço para aliados que querem gastar mais e reduziu a pressão feita por Haddad sobre os parlamentares para ampliar as receitas.

O primeiro impacto deve ser medido no Congresso. Deputados e senadores já vinham fazendo jogo duro com a agenda econômica do governo, baseada em medidas de aumento de arrecadação com objetivo de alcançar o equilíbrio das contas. Se o presidente abriu mão dessa meta, nenhum parlamentar fará o trabalho por ele (não de graça).

Haddad faz uma corrida contra o tempo para aprovar propostas que aumentem as receitas de 2024. O Congresso apoia boa parte das medidas, mas quase sempre dá uma mordida nos textos enviados pela Fazenda. A taxação de offshores, por exemplo, saiu do ministério com uma alíquota de 22,5% sobre os lucros; a versão aprovada pela Câmara ficou em 15%.

A partir de agora, a negociação pode ser mais desfavorável para o ministro. Na próxima semana, ele tentará convencer líderes partidários a aprovarem a medida provisória que trata da subvenção do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e que renderia R$ 35 bilhões aos cofres públicos no ano que vem. A reunião ocorrerá sob a repercussão das declarações de Lula.

Diversos fatores explicam a resistência do Congresso ao esforço de Haddad para esticar essa ponta do cobertor. Eles incluem a grande influência de setores empresariais sobre os parlamentares, convicções ideológicas sobre o tamanho da arrecadação do Estado e, também, razões políticas imediatas.

Liderado pelo centrão, o grupo que dá as cartas no Congresso acredita que zerar o déficit com um aumento de receitas pode favorecer Lula, uma vez que mantém preservado o espaço que o presidente teria para executar investimentos e fortalecer seu governo.

Lula, inclusive, abandonou o plano de equilíbrio das contas no ano que vem com o argumento de que a meta obrigaria o governo a conter suas despesas. "Eu não vou estabelecer uma meta fiscal que me obrigue a começar o ano fazendo corte de bilhões nas obras que são prioritárias nesse país", declarou.

O Congresso não deve ter muita dificuldade para embarcar na mudança de posicionamento do governo, mas deve cobrar um preço. Se a revisão da meta abrir espaço no Orçamento, o centrão deve cobrar um bônus para as emendas parlamentares e uma conta mais gorda para os ministérios controlados pelo grupo.

Além do centrão, ministros de Lula e aliados do presidente na esquerda também reclamavam da ideia de zerar o déficit no ano que vem. Eles citavam os prejuízos políticos que o PT poderia sofrer caso fosse preciso cortar despesas, especialmente em ano de eleições municipais.

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