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Rachel Sheherazade perde recurso, e STF nega de novo carteira assinada por Silvio Santos

Ex-apresentadora move processo contra o SBT para reconhecimento de vínculo trabalhista; defesa diz que vai recorrer

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São Paulo

A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) negou a existência de vínculo trabalhista entre a jornalista Rachel Sheherazade e o SBT, emissora de Silvio Santos, em decisão publicada nesta quarta-feira (20).

O julgamento avaliou um recurso da ex-apresentadora, que tentava reverter a determinação do ministro Alexandre de Moraes de dezembro do ano passado.

À época, ele derrubou a decisão que obrigava a emissora a indenizar Sheherazade no valor de R$ 8 milhões, arbitrada pelo TRT-2 (Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região) em 2022 e levada ao STF pelo próprio SBT.

Rachel Sheherazade
Rachel Sheherazade no estúdio do SBT - Lourival Ribeiro-20.fev.2020 /SBT

A justificativa de Moraes era de que o reconhecimento do vínculo contrariava a legalidade de terceirizar toda e qualquer atividade-fim, avalizada pelo STF e pela reforma trabalhista de 2017.

À exceção do ministro Flávio Dino, todos os outros integrantes da Primeira Turma —Cármen Lúcia, Luiz Fux e Cristiano Zanin— votaram com Moraes, o relator do processo, na decisão desta semana.

Sheherazade, admitida pelo SBT em março de 2011 e demitida em outubro de 2020, argumenta que não teria recebido benefícios como décimo terceiro, férias e FGTS, tampouco tido reajustes salariais, durante o período em que passou na empresa. Ela foi âncora do principal jornal da casa por quase dez anos, o SBT Brasil.

O argumento do STF para negar o vínculo –e, portanto, a indenização– é que a jornalista foi contratada como pessoa jurídica, em nome da empresa Sheherazade Produções Jornalísticas.

"Ao reconhecer o suposto vínculo empregatício, o acórdão [do TRT-2] ignorou o fato devidamente comprovado de que a sra. Rachel Sheherazade Barbosa efetivamente atuou em nome da Sheherazade Produções Jornalísticas Ltda., da qual é sócia com 99% das quotas no período entre 13/03/2011 a 31/10/2020 para a prestação de serviços para realização de programas de televisão e outras avenças", diz a decisão.

O texto ainda diz que os contratos firmados entre Sheherazade e o SBT estavam "devidamente preenchidos" e que a decisão do TRT-2 optou por desconsiderá-los "sem qualquer fundamentação".

A defesa de Sheherazade, em nota enviada à Folha, afirma que vai recorrer da decisão com mais um recurso. O instrumento a ser usado será o chamado "embargos de declaração", que mira esclarecimento de contradições ou omissões em uma decisão.

Os advogados dizem que o contrato de pejotização foi celebrado em março de 2018, portanto sete anos depois do início da jornalista no SBT. "Ou seja, desde a prestação de serviço de 13 de março de 2011, ela era pessoa física, de sorte que a decisão admitiu ser verídico um fato inexistente", dizem André Froes e Ricardo Calcini.

"Logo, deveria o agravo regimental [recurso] ter sido ao menos provido para limitar os efeitos da decisão monocrática ao período posterior à 13.3.2018 até 31.10.2020, quando houve a rescisão contratual [desligamento da emissora]."

A defesa ainda espera que, com a oposição de Flávio Dino, uma "futura mudança de entendimento" ocorra. O SBT afirmou que não vai se pronunciar.

Entenda o caso

A ex-apresentadora entrou com um pedido de vínculo trabalhista no TRT-2, em março de 2021. Na corte, a 14ª Turma do TRT-2 reconheceu o direito à carteira assinada por unanimidade, de 2011 a 2020.

Inicialmente, Sheherazade exigia uma indenização de R$ 20 milhões, mas a Justiça reduziu o valor.

Na sentença, o magistrado trabalhista também reconheceu que Silvio Santos foi misógino com Rachel durante entrega do Troféu Imprensa em 2017, ao dizer que "que a sua contratação se deu por sua beleza e por sua voz, apenas para ler notícias, e não dar a sua opinião".

O SBT recorreu no próprio tribunal regional, mas teve o recurso negado. Segundo os magistrados, havia relação de trabalho que indicaria vínculo pela CLT.

"Concluiu o regional que a relação jurídica intrínseca estabelecida pelas partes foi caracterizada pela pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação jurídica, o contrato de prestação de serviços juntado aos autos não é válido", disse o órgão, com base em súmula do TST (Tribunal Superior do Trabalho).

O SBT levou o caso ao TST, mas não houve julgamento. Durante essa tramitação, a emissora foi ao STF.

Segundo a decisão do Supremo, há testemunhas de que não havia subordinação entre a apresentadora e a empresa, o que descaracterizaria a carteira assinada.

Além disso, o STF entende ser constitucional outras formas de contrato, como no caso da terceirização e na relação de trabalho entre salões de beleza e profissionais da área.

Embates entre STF e Justiça trabalhista

Na análise da advogada trabalhista Priscila Kirchhoff, sócia do escritório Trench Rossi Watanabe, o entendimento do STF vem na esteira de uma série de outras decisões da corte que "reconhecem a possibilidade de reorganizar a divisão do trabalho de outras formas, não só pela CLT".

"Se o contrato é válido, não tem vícios, não é fraudulento e todas as partes consentiram com o escrito, o STF entende que não há vinculo trabalhista, não há questionamento do STF sobre a natureza do contrato, se ele é trabalhista ou não", explica.

"Na Justiça trabalhista, o entendimento é outro, porque pressupõe a hipossuficiência negocial, isto é, que a maior parte das pessoas não tem compreensão das complexidades dos contratos de trabalho, não tem poder de barganha e aceitam tudo, porque precisam de dinheiro. Por isso, ela acaba sendo mais pró-trabalhador do que pró-empregador."

Mas, no caso de Sheherazade, o princípio é da hipersufiência —ou seja, alguém com capacidade de entendimento da lei. Ela dispõe de ensino superior e recebia, no SBT, um salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social (artigo 444, parágrafo único, da CLT).

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