Descrição de chapéu Congresso Nacional

Não vamos a Brasília dialogar, mas nos defender, diz Haddad após avanço do PL antiaborto

Em meio a derrotas na agenda econômica, ministro diz que 'Brasil é uma encrenca'

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São Paulo

Em meio a derrotas do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Congresso e após o avanço do PL Antiaborto por Estupro, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) disse que não há diálogo em Brasília, o que leva o governo a ter que se defender de questões movidas pelo Legislativo.

"Quando vamos para Brasília, não dialogamos com o serviço público propriamente dito. Vamos nos defender do que está acontecendo. A todo momento você fica apreensivo. Que lei vão aprovar? O que vamos fazer? Que maluquice é essa? O que estão falando? Por que não se dedicam a coisas sérias que vão mudar a vida das pessoas? Para quê essa espuma toda? Para criar cizânia na sociedade?", afirmou durante evento do ICL (Instituto Conhecimento Liberta) em São Paulo neste sábado (15).

Haddad está sentado, de jeans, camisa e paletó cinza e segura o microfone enquanto palestra
Fernando Haddad palestra no evento Despertar Empreendedor, do ICL (Instituto Conhecimento Liberta), em São Paulo neste sábado (15) - Divulgação

A mais recente derrota do governo Lula foi a aprovação de um requerimento de urgência do PL Antiaborto por Estupro na última quarta (12). O projeto foi classificado como "insanidade" pelo presidente, que se diz contra o aborto.

De acordo com reportagem da Folha, a chamada "pauta de costumes" do bolsonarismo, que engloba questões como aborto e drogas, avança mais nesta primeira metade do governo Lula do que nos quatro anos de Jair Bolsonaro (PL).

Antes, a falha na articulação política já havia levado parlamentares a derrubaram o veto de Lula a trecho da lei que acaba com as saídas temporárias de presos.

"O Brasil é uma encrenca. Um negócio difícil de administrar. Às vezes quem está numa posição de poder não está fazendo a coisa certa pelo país. Isso é a coisa mais triste e difícil de lidar na vida pública no Brasil", disse o ministro.

Ainda na última semana, o Congresso recusou uma MP (medida provisória) do governo que diminuiria créditos fiscais, elevando o pagamento de impostos por parte de empresas, de modo a compensar a desoneração concedida a 17 setores da economia. Entre eles está o de comunicação, no qual se insere o Grupo Folha, empresa que edita a Folha. Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, entre outros.

A derrubada da MP é um entrave no plano de ajuste fiscal de Haddad via aumento na arrecadação. Agora, o governo trabalha em alternativas para cortar gastos, como a revisão do dispêndio com determinados benefícios previdenciários e a flexibilização das despesas mínimas com saúde e educação, propostas criticadas por Lula.

Ao comentar sobre a vida como ministro, Haddad diz que os momentos difíceis têm um lado positivo, pois mostram quem são seus verdadeiros aliados.

"Eu gosto da hora dura. Ela depura. Muitas vezes, você começa a perder a noção de quem gosta de você e de quem está te bajulando. Na hora dura, só aparece quem gosta de você. Só aparece o seu amigo de fé", disse.

Segundo o ministro, seus dois filhos ligam para ele quase que diariamente para se certificarem que ele está bem.

"Quando eles leem um negócio que está espirrando do lado do ministro Haddad, eles passam a mão no telefone e [ligam] no dia: 'Está tudo bem? Você está bem? Você precisa de alguma coisa?' Isso é muito importante."

Apesar de sua carreira política, Haddad diz ainda considerar sua profissão como professor. "A sala de aula está sempre ali para mim. Posso voltar para ela daqui um ano, dois anos, dez anos. Voltar para a sala de aula é voltar para casa", disse.

Em meio a críticas de aliados do governo Lula e de membros do PT, a possibilidade de Haddad deixar o governo passou a ser debatida na última semana.

Na última quarta (12), porém, os líderes do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), e no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), defenderam o ministro da Fazenda e afirmaram que ele está firme no cargo.

Lula, em viagem à Europa, defendeu o ministro e neste sábado afirmou que ele "jamais ficará enfraquecido" enquanto for presidente.

Em meio à percepção de enfraquecimento político de Haddad e aumento no risco fiscal brasileiro, o dólar superou os R$ 5,40 na última semana.

Na sexta (14), o presidente da Febrabran (Federação Brasileira de Bancos), Isaac Sidney, reiterou o apoio do setor bancário a Haddad, após reunião do ministro com bancos privados.

Em relação à economia brasileira, o ministro afirmou neste sábado que o país deve aproveitar o momento de incentivo aos investimentos verdes.

"Estamos em um contexto internacional muito desafiador, mas esses momentos desafiadores é que são, às vezes, a janela que se precisa para despontar com uma liderança. E o Brasil pode liderar processos muito significativos", disse Haddad.

Segundo o ministro, o país precisa deixar sua cadeia produtiva mais sustentável para poder se defender do protecionismo estrangeiro.

"Nós estamos recuperando o pasto degradado para produzir carne? Para produzir soja? Os nossos fertilizantes são biofertilizantes? Os nossos defensivos agrícolas são biodefensivos? Essas perguntas estão sendo feitas no mundo. E é assim que, por esperteza ou não, não vem ao caso, que o mundo desenvolvido vai se proteger das exportações brasileiras."

Esses questionamentos travaram o acordo comercial entre União Europeia e Mercosul. O presidente da França, Emmanuel Macron se disse contrário ao tratado por ele não incorporar questões de clima, descarbonização e biodiversidade. Neste sábado, no entanto, Lula disse que o acordo está pronto para ser assinado.

"Se não aproveitarmos [o movimento verde], o mundo vai acabar superando as nossas vantagens naturais com tecnologia", disse Haddad.

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