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A corrida global pelo público que está mudando o esporte no mundo

Fãs podem estar esfriando em relação às Olimpíadas, mas a tecnologia está transformando a forma como o esporte é assistido pelo mundo

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The Economist

Uma robusta armada de atletas de mais de 200 países navegou pelo rio Sena na sexta-feira (26), na cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Paris. Da equipe da Mongólia em kaftans bordados aos canadenses em jaquetas bomber da Lululemon, a procissão é projetada para simbolizar a reunião de todos os cantos da humanidade. A mensagem para o público (e para os patrocinadores corporativos) é clara: em um mundo fraturado e dividido, nada une as pessoas como o esporte.

A ideia é inspiradora, mas falsa em uma dimensão surpreendente. Embora as Olimpíadas quadrienais e a Copa do Mundo de futebol masculino tenham audiências que abrangem o planeta, a maioria das propriedades esportivas mais valiosas do mundo resistem teimosamente à globalização.

Cenário movimento mostra tum estádio cheio de torcedores. Eles levantam faixas de apoio ao time da França. É possível ver bandeiras da França ao fundo.
Torcedores franceses durante jogo de handebol feminino nos Jogos Olimpícos de Paris - Bernadett Szabo - 25.jul.2024/Reuters

A NFL (National Football League, liga nacional de futebol americano dos Estados Unidos), a maior de todas, gera 98% de sua receita de direitos de mídia em casa. A Indian Premier League, liga nacional de críquete da Índia, cujos direitos de mídia valem mais do que os das Olimpíadas em uma base anualizada, gera 96% da receita dentro de seu país anfitrião. No futebol europeu, apenas a Premier League da Inglaterra ganha mais dinheiro no exterior do que em casa.

Mas agora, finalmente, a globalização está se espalhando pelas modalidades. A tecnologia está transformando a forma como o esporte é transmitido e como os fãs o desfrutam, dando a ligas de todos os tipos a chance de se tornarem globais.

Isso representa uma grande oportunidade para as empresas —bilhões de dólares aguardam aqueles que conquistarem mercados estrangeiros— e uma oportunidade ainda maior para o público, à medida que espetáculos que já encantam um país começam a emocionar fãs em outros. Uma onda de esportes estrangeiros fará com que alguns vaiem e outros assobiem. Ligas e empresas de mídia não devem se importar e devem mirar em um gol aberto.

O fracasso do esporte como exportação —e a escala de seu potencial— é melhor ilustrado por uma comparação com outras indústrias de entretenimento. Desde cerca do início do século, Hollywood ganhou mais da metade de sua receita de bilheteria no exterior. Artistas musicais americanos dependem de ouvintes estrangeiros para quase um terço de suas reproduções e uma grande parte das vendas de ingressos para shows (como Taylor Swift, que está em turnê pela Europa, pode atestar). Nos videogames, por outro lado, consoles japoneses e aplicativos chineses têm jogadores viciados em todo o mundo.

Duas mudanças estão ajudando o esporte a se tornar global. A primeira é uma revolução do lado da oferta, à medida que a transmissão esportiva se move tardiamente dos canais nacionais de televisão aberta e a cabo para plataformas globais de streaming.

A Netflix, que prendeu sua audiência mundial a filmes de terror sul-coreanos e comédias francesas, agora está fazendo o mesmo com o esporte. A série documental "Drive to Survive" apresentou os americanos à Fórmula 1. Em dezembro, ela dará para muitos de seus 270 milhões de assinantes o primeiro gostinho da NFL. A Apple começou a transmitir a MLS (Major League Soccer, principal liga masculina de futebol dos EUA) para mais de cem países no ano passado. À medida que a distribuição se torna global, os fãs terão a chance de assistir a novos esportes.

A segunda revolução está no lado da demanda. O maior obstáculo para um esporte ser adotado internacionalmente é que, ao contrário de outras formas de entretenimento, o público quer assistir ao seu time nacional, em vez de assistir o melhor. No entanto, a ligação dos fãs aos times está lentamente cedendo lugar à devoção aos atletas individuais. As redes sociais permitem que os melhores jogadores cultivem seguidores pessoais globais, atraindo fãs sem conexão com seu time e até mesmo com seu esporte.

Jogadores estrela têm atraído fãs de todo o mundo para a Premier League da Inglaterra. Lionel Messi trouxe novos públicos para a MLS, não apenas por causa das seis Chuteiras de Ouro conquistadas, mas também pelo meio bilhão de seguidores no Instagram. O basquete feminino está em alta graças a Caitlin Clark, jogadora cuja performance recorde atraiu fãs que nunca tinham assistido ao jogo, muito menos frequentado a Universidade de Iowa, onde ela começou a carreira.

Também ajuda o fato de que os jovens fãs, cujo conteúdo preferido é o vídeo de curta duração, são mais propensos do que os mais velhos a assistir a destaques e resumos das ações em uma liga, em vez de uma única partida com seu time favorito. As apostas esportivas, recentemente legalizadas em grande parte dos EUA e crescendo rapidamente no mundo, estão incentivando ainda mais o consumo de toda a competição e não só de um único time. À medida que o fanatismo se torna mais promíscuo e menos tribal, ele está sendo desvinculado de questões geográficas

Quem tem mais chances de vencer nesse novo jogo? Entre as empresas de mídia, as mais bem posicionadas são aquelas com a maior distribuição. As ligas querem alcance acima de tudo e estão dispostas a aceitar acordos menos lucrativos com serviços de streaming que podem colocar seus jogos diante de audiências em todos os lugares. Netflix, Amazon e outras plataformas globais têm vantagem sobre os incumbentes (embora o comentário recente da Netflix de que a transmissão de partidas da NFL custam o equivalente a um novo filme tenha sido o suficiente para fazer cinéfilos pouco esportivos chorarem).

Entre as organizações esportivas, as maiores ligas se beneficiarão mais da distribuição mais ampla, assim como o streaming de música direcionou ouvintes para mega estrelas, como Taylor Swift. Mas o streaming também promove saudáveis "caudas longas" de conteúdo nichado. O esporte feminino, muito negligenciado, representa quase metade da produção de streaming da ESPN. Os esportes mais em risco estão entre os sucessos e os nichos. Um acordo anêmico de direitos de mídia recentemente acordado pela liga de futebol da França mostra como a competição aperta as ligas médias. Há sinais de que os fãs estão se desinteressando das Olimpíadas, com ênfase em países em detrimento de indivíduos famosos —alguns dos quais, como Messi, optam por não participar.

À medida que se globalizam, os esportes enfrentarão uma reclamação antes direcionada a outras indústrias de entretenimento: que o conteúdo estrangeiro desmerecedor está substituindo favoritos locais. Há um século, políticos se preocupavam que as transmissões de rádio estivessem tentando os ouvintes a sintonizar bandas de grandes cidades em vez dos artistas locais. Mais recentemente, políticos europeus reclamaram que a televisão americana está distraindo os espectadores da programação local.

Espere ouvir mais do mesmo enquanto os fãs torcem por celebridades esportivas distantes em vez de estrelas locais —e prepare-se para ignorar isso. Cabe aos fãs escolher quais esportes acompanhar, assim como escolhem que música ou filmes querem ouvir ou assistir. No esporte, de todas as coisas, a competição é o que conta. Organizações esportivas preocupadas em perder fãs nesse novo jogo global devem prestar atenção ao lema olímpico: é hora de ficar mais rápido, mais alto e mais forte.

Texto de The Economist, traduzido por Helena Schuster, publicado sob licença. O artigo original, em inglês, pode ser encontrado em www.economist.com.

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