Americanas se agarra ao varejo físico com crise de confiança no online, mas ainda vai fechar lojas

Com consumidor temendo comprar no site e app, fatia do digital nas vendas brutas caiu de 59% em 2022 para 16% neste primeiro semestre

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Uma companhia menor, essencialmente do varejo físico, com venda de guloseimas, cosméticos, utilidades domésticas e brinquedos como carro-chefe, que deve continuar encolhendo pelo menos até o final de 2025. Em 2026, talvez, saia da recuperação judicial.

Este foi o quadro pintado para a Lojas Americanas em apresentação feita na manhã desta quinta-feira (15) pelo presidente da companhia, Leonardo Coelho, e pela diretora financeira e de relações com investidores, Camille Faria, que comentaram os balanços do último trimestre de 2023 e dos primeiros seis meses de 2024 da companhia, divulgados na noite desta quarta (14).

A empresa, em recuperação judicial desde janeiro de 2023, após vir à tona uma fraude contábil de R$ 25,3 bilhões, registrou um prejuízo de R$ 2,3 bilhões no ano passado, bem inferior às perdas de R$ 12,2 bilhões de 2022. Nos primeiros seis meses deste ano, o prejuízo somou R$ 1,4 bilhão, um recuo de 53% sobre as perdas verificadas de janeiro a junho de 2023, da ordem de R$ 3,2 bilhões.

Uma cesta de compras vermelha da rede 'Americanas' está cheia de produtos, como alimentos e bebidas. A cesta está posicionada em uma superfície vermelha, com prateleiras de produtos ao fundo, desfocadas.
Cesta com chocolates em loja da Americanas - Americanas/Divulgação

Entre os fatores que estancaram a crise, segundo Leonardo Coelho, está a melhora do mix e da distribuição de produtos nas lojas físicas, assim como a negociação cada vez mais próxima com fornecedores, para garantir preços baixos. "Passamos ter o produto certo, na loja certa, no momento certo, o que diminuiu a ruptura", disse o executivo, referindo-se à falta de produtos nas gôndolas, um problema verificado no início da recuperação judicial.

"O varejo físico começa a se consolidar como o coração da Americanas", disse Coelho, uma vez que 71% das vendas brutas se concentraram nas lojas físicas no primeiro semestre. Em 2022, esse percentual era de 34%, uma vez que a Americanas era uma varejista majoritariamente online em faturamento, com 59% das vendas no digital.

No ano passado, as vendas no canal digital caíram mais de 75%, em função da "crise de credibilidade" que se abateu tanto sobre consumidores quanto sobre "sellers", os varejistas que oferecem seus produtos no marketplace e pagam uma comissão à Americanas, disse Coelho. "Uma coisa é você comprar na loja, colocar o produto debaixo do braço, passar no caixa e levar o seu produto para casa. Uma outra que envolve um grau maior de confiança, quando você pela pela plataforma digital e espera receber em casa", afirmou.

O executivo disse, porém, que o principal motivo para a queda nas vendas do digital foi porque a empresa decidiu descontinuar a operação chamada de "1P", que consiste na compra de produtos para venda no site, uma vez que a atividade demandava muito capital de giro. Dessa forma, a Americanas deixou site e aplicativo apenas como marketplace, oferecendo produtos de terceiros.

Apesar de as lojas passarem a ter um papel de destaque na nova fase da Americanas, o enxugamento do tamanho da rede ainda não acabou. O primeiro semestre deste ano encerrou com 1.622 lojas, uma queda de 10% sore as 1.803 existentes antes da recuperação judicial. "Devemos fechar lojas, não muitas, mas todas as que forem necessárias, que não sejam rentáveis", afirmou Coelho.

Mas disse que a empresa também pode abrir pontos de vendas. "Mas o saldo [entre aberturas e fechamentos] ainda deve ser negativo pelos próximos 12 a 15 meses", afirmou.

Para o consultor André Pimentel, sócio da Performa Partners –que esteve à frente da primeira reestruturação da Americanas no final dos anos 1990, capitaneada pela Galeazzi & Associados– os números da empresa ainda não inspiram confiança.

"No balanço do primeiro semestre, o resultado foi beneficiado por R$ 1,1 bilhão em 'outras receitas/despesas operacionais'", afirma. "Será que acharam alguma mina de ouro que vai ficar produzindo operacionalmente essa receita todo semestre?", ironiza.

Questionada, a Americanas respondeu que a cifra de R$ 1,1 bilhão se refere a "despesas da RJ e investigação, impairment, baixa de ativos, haircuts decorrentes da aprovação do PRJ e efeitos da autorregularização de imposto."

Ainda segundo Pimentel, o desembolso com os aluguéis de lojas e centros de distribuição não estão todos computados no balanço. "Por questões contábeis, uma parte relevante desse total entra como depreciação, mas outra parte relevante entra como despesa financeira. Mas isso acaba impactando a geração de caixa operacional recorrente, que deve ter sido bem negativa no semestre."

Empresa diz que recuperação judicial só termina em 2026

Questionada sobre o fim da recuperação judicial, Camille Faria afirmou que isso não deve acontecer "antes do início de 2026". "Estamos agora em supervisão judicial. Em geral, o juízo acompanha a execução do plano por mais ou menos dois anos, a partir da sua homologação", afirmou.

Segundo a executiva, a varejista já executou "a maior parte do nosso plano nos últimos seis meses", e a empresa poderia tentar antecipar a saída da recuperação judicial. "Mas existe a obrigatoriedade de conduzir o processo organizado de venda para HNT [Hortifruti Natural da Terra] e Unico na forma de UPI [Unidade Produtiva Isolada], o que só acontece se a companhia ainda estiver em supervisão judicial".

Na opinião do advogado especialista em recuperação judicial Filipe Denki, da Lara Martins Advogados, a empresa está "otimista". "Mesmo com a recuperação judicial, a Americanas tem tido sucessivos prejuízos. Somente a venda de ativos e emissões de novas ações não serão suficientes para a empresa superar sua crise econômica financeira. É possível que os controladores precisem fazer outros aportes", afirma.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.