Descrição de chapéu Governo Trump

Juiz indicado por Trump nega acusação e diz que processo é 'vergonha nacional'

Brett Kavanaugh falou depois de Christine Blasey Ford, que o acusa de tê-la atacado sexualmente

Júlia Zaremba
Washington

A professora de psicologia Christine Blasey Ford disse que tem 100% de certeza de que foi Brett Kavanaugh, indicado à Suprema Corte dos Estados Unidos, que a atacou sexualmente no início da década de 80. O juiz, por sua vez, negou veementemente essa e qualquer outra acusação do tipo.

Os dois sustentaram suas posições até o fim das audiências nesta quinta (27) no Comitê Judiciário do Senado dos EUA, como parte do processo de nomeação do juiz para a mais alta corte do país. As mais de oito horas de depoimentos foram marcadas por nervosismo, choro e embate entre senadores.

Ford, que dá aulas na Universidade de Palo Alto e é pesquisadora na Universidade de Stanford, ambas na Califórnia, foi a primeira a falar.

Brett Kavanaugh chora ao falar ao comitê do Senado sobre as acusações de Christine Blasey Ford
Brett Kavanaugh chora ao falar ao comitê do Senado sobre as acusações de Christine Blasey Ford - Jim Bourg/Reuters

Com a voz embargada e aparentando nervosismo, disse que estava "aterrorizada", mas que era seu dever cívico informar o que aconteceu enquanto ela e o juiz estavam no ensino médio. "Nós não nos conhecíamos bem, mas eu fui a várias festas para as quais Brett também foi", afirmou. 

O incidente teria ocorrido em um encontro de jovens em Maryland. Ela conta que foi empurrada para um quarto e que Kavanaugh e um amigo, Mark Judge, entraram e trancaram a porta. O primeiro teria a bolinado e tentado tirar as suas roupas.

"Acreditei que ele fosse me estuprar", disse. Tentou gritar por ajuda, mas Kavanaugh colocou a mão em sua boca. "Não conseguia respirar. Achei que ele fosse me matar acidentalmente".

Questionada pelo democrata Patrick Leahy sobre o que mais a marcou durante o ataque, ela citou as risadas de Kavanaugh e de Mark Judge, amigo do juiz que também estaria no quarto onde foi atacada.

"Os dois pareciam estar se divertindo", afirmou. "Algumas vezes eu fiz contato visual com Mark e pensei que ele poderia tentar me ajudar, mas ele não o fez". Conseguiu sair depois que Judge pulou em cima dos dois.

Ela explicou que não se lembra de todos os detalhes do encontro e onde o ataque teria ocorrido, mas que alguns detalhes ficaram em sua memória e a "assombraram episodicamente enquanto adulta". "O ataque mudou drasticamente a minha vida", afirmou.

Foi só em 2012 que se abriu sobre o episódio, em uma sessão de terapia de casal. Decidiu levar a história a público depois de se sentir pressionada "“ela conta que repórteres apareceram em sua casa e trabalho e que colegas começaram a receber ligações.

As últimas semanas foram as mais difíceis de sua vida, segundo ela "“a história veio à tona em 16 de setembro, em reportagem do The Washington Post. Ela foi ameaçada de morte, teve o email invadido e foi chamada "dos nomes mais vis e odiáveis" possíveis.

Kavanaugh começou a falar por volta das 16h10. Em um discurso inflamado, entremeado por momentos de choro, ele negou as acusações de ataque sexual que pensam contra ele, posição que tem adotado desde que a história veio à tona, e disse que o processo de confirmação era uma "vergonha nacional."

"Eu não estou questionando que ela tenha sido atacada sexualmente, mas eu nunca fiz isso com ela ou qualquer pessoa", disse.

Segundo ele, os dois não frequentavam o mesmo círculo social, mas não descarta ter cruzado com ela. Ele admitiu que costumava beber cerveja com amigos, "às vezes muitas cervejas" —Ford diz que ele estava bêbado quando a atacou. E também reconheceu que, quando era estudante, fez "coisas bobas e estúpidas".

Ele criticou senadores democratas, a quem acusou de tentar achar razões para dificultar sua aprovação. "O processo de confirmação se tornou uma vergonha nacional", disse. "Desde a minha indicação, houve um frenesi na esquerda para surgir com alguma coisa, qualquer coisa, para bloquear a minha nomeação."

Para ele, trata-se de "um golpe político calculado e orquestrado". "Eu não serei intimidado a desistir do processo", afirmou.

Os senadores e a procuradora Rachel Mitchell, especializada em crimes sexuais, começaram a questioná-lo por volta das 17h. Nessa etapa, Kavanaugh também negou as alegações de Julie Swetnick, que o acusa de ter participado de uma festa onde ela teria sido vítima de um estupro coletivo, chamando-as de uma "piada" e uma "farsa".

Um dos momentos mais tensos foi quando o republicano Lindsey Graham, um dos maiores defensores de Kavanaugh, atacou democratas. "O que vocês querem é destruir a vida desse cara, manter o assento vago [da Suprema Corte] e esperar vencer em 2020", disse.

Afirmou ainda que quem votasse contra a nomeação do juiz estaria "legitimando a coisa mais desprezível" que já viu em sua carreira política.

Outro momento marcante foi quando o democrata Richard Durbin perguntou se o magistrado apoiava uma investigação do FBI sobre as acusações de Ford, medida que havia sido solicitada pela vítima nas últimas semanas.

Kavanaugh mostrou certa relutância, mas disse que apoiaria o que o comitê decidisse fazer. Chegou a ficar em silêncio quando o senador o questionou se considerava a melhor coisa a se fazer.

Ao fim da audiência, Trump escreveu em uma rede social que o juiz "mostrou à América exatamente porque ele o nomeou" e que seu discurso foi "poderoso e honesto". 

Três mulheres já acusaram o juiz de algum tipo de delito sexual, o que tem levado a um atraso no processo de nomeação de Kavanaugh para a Suprema Corte, segundo nome indicado por Trump para o órgão. O primeiro foi Neil Gorsuch, conservador moderado.

Caso Kavanaugh seja aprovado, o equilíbrio da corte será alterado. Ela passará a ter quatro progressistas e cinco conservadores.

Caso a nomeação seja rejeitada ou trocada, e os democratas consigam maioria em ao menos uma das casas do Congresso nas eleições legislativas de novembro, o processo pode se estender para até depois de 1º de janeiro, quando começa a nova legislatura, o que complicaria a vida de Trump.

Erramos: o texto foi alterado

Brett Kavanaugh disse que o processo de confirmação era uma "vergonha nacional", e não uma "desgraça nacional". O texto foi corrigido.

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