Irã derruba drone americano, e Trump fala em 'erro muito grande'

Teerã diz que aparelho sobrevoava o país; EUA afirmam que veículo estava em espaço aéreo internacional

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Dubai, Washington e Bruxelas | Reuters e AFP

A Guarda Revolucionária do Irã derrubou nesta quinta-feira (20) um “drone espião americano” que teria violado o seu espaço aéreo, advertindo que suas fronteiras constituem uma “linha vermelha”, em um contexto de tensão crescente na região e temores de um conflito entre os EUA e a república islâmica.

Segundo comunicado da guarda, o aparelho, de modelo Global Hawk da fabricante americana Northrop Grumman, foi derrubado às 4h05 locais (20h35 de quarta-feira em Brasília), no sul do país.

O drone foi atingido por um míssil da força aeroespacial da guarda sobre a província de Hormozgan, às margens do golfo de Omã, “após violar o espaço aéreo iraniano”, assinala o texto.

O drone MQ-4C Triton, capaz de voar por mais de 24 horas em altitudes superiores a 16 mil metros - US Navy/Northrop Grumman/Bob Brown/Reuters

Washington confirmou a derrubada do drone, mas negou que tenha violado o espaço aéreo iraniano. 

“Trata-se de um ataque injustificado a um aparelho de vigilância americano no espaço aéreo internacional”, afirmou Bill Urban, porta-voz da Marinha no Pentágono. Segundo os EUA, o modelo era, na verdade, um MQ-4C Triton.

O presidente americano, Donald Trump, reagiu e escreveu em uma rede social que o Irã “cometeu um erro muito grande”, pouco depois da confirmação da notícia pelo Pentágono. 

Após a declaração de Trump, os preços do petróleo dispararam. Já em alta, o barril de WTI em Nova York aumentou 6,3%, a US$ 57,13, enquanto em Londres o brent subia 4,66%, a US$ 64,69.

Mais tarde, antes de um encontro com o premiê canadense, Justin Trudeau, Trump afirmou que “um general ou alguém estúpido” pode ter cometido um equívoco ao derrubar o drone. 

Segundo o presidente, o episódio foi como “uma nova mosca na pomada”, expressão em inglês para se referir a um contratempo diante de uma situação que poderia estar melhor.

Trump disse aos jornalistas que eles vão “descobrir” como Washington vai reagir à ação de Teerã, mas manteve aberta a possibilidade de diálogo.

Segundo a Guarda Revolucionária, o drone decolou de uma base americana “na costa sul do golfo Pérsico, apagou todos os seus dispositivos de reconhecimento” após passar pelo estreito de Hormuz e se dirigiu para o leste, em direção ao porto iraniano de Chabahar. 

“A violação das fronteiras iranianas é a linha vermelha que não deve ser ultrapassada”, alertou o general de divisão Hosein Salami, comandante em chefe da guarda. “Nossa reação é e será categórica e absoluta”, enfatizou.

Mais tarde, o chanceler Mohammad Javad Zarif  afirmou que o drone partiu dos Emirados Árabes Unidos.
“Recuperamos partes do drone militar americano em nossas águas territoriais onde ele foi abatido”, afirmou. 

“Protestamos contra todas as ações provocativas que atentem contra a integridade territorial do nosso país”, disse o porta-voz da chancelaria iraniana, Abas Musavi, advertindo que “a responsabilidade pelas eventuais consequências destas ações cabe exclusivamente aos agressores”.

A imprensa iraniana não divulgou nenhuma imagem do aparelho destruído. O incidente acontece em um contexto de aprofundamento da tensão entre Irã e EUA. 

As Forças Armadas americanas intensificaram ontem suas acusações contra o Irã, a quem responsabilizam pelos ataques contra dois navios petroleiros no golfo de Omã, na semana passada .

O Irã negou envolvimento no ataque e insinuou que poderia se tratar de uma armação dos EUA para justificar o uso da força contra o seu país.

Um mês antes, outras quatro embarcações haviam sido atingidas na entrada do golfo, episódios pelos quais Washington também responsabilizou o Irã.

Nos dois casos, os petroleiros estavam perto do estreito de Hormuz, canal pelo qual passam cerca de 20% do petróleo consumido no mundo. 

A situação se agravou quando Trump decidiu, em maio de 2018, retirar os EUA do acordo nuclear assinado com o Irã em 2015 e restabelecer duras sanções contra Teerã, privando-a dos benefícios econômicos esperados deste pacto internacional.

Os EUA enviaram mais mil soldados para o Oriente Médio esta semana. No entanto, Trump disse que não procura guerra com o Irã.

Autoridades de França, Alemanha, Reino Unido, China, Rússia e Irã irão se encontrar no próximo dia 28, em Viena, para discutir maneiras de salvar o acordo nuclear iraniano, informou a União Europeia nesta quinta. 

O encontro vai discutir “como lidar com os desafios advindos da retirada [americana] e da reimposição de sanções pelos EUA contra o Irã”, afirmou em nota. 

 
 
 

Entenda o que está em jogo

O que significam as explosões nos petroleiros?

Um aumento de tensões na região. Há uma “Guerra Fria” entre a Arábia Saudita, a maior exportadora de petróleo do mundo, apoiada pelos EUA, e o Irã, rival dos americanos há 40 anos e que luta pela supremacia da região com os sauditas.

Quando tudo começou?

Os primeiros ataques a petroleiros foram em 12 de maio, na costa dos Emirados Árabes.

Quem está por trás dos ataques de maio e de junho?

Nos dois casos, não se sabe. Os EUA e a Arábia Saudita culpam o Irã, que nega.

O que o Irã ganharia atacando petroleiros?

O Irã pode ter conduzido os ataques numa tentativa de alavancar seu poder de negociação e fazer aumentar a pressão global para o retorno de conversas com os EUA, com quem é rompido. Além disso, as explosões seriam uma demonstração de que o Irã é capaz de afetar o comércio mundial de petróleo. Contudo, não há confirmação de que os ataques partiram do Irã.

Qual o papel do Irã na região?

O Irã era o maior aliado americano no Golfo Pérsico até 1979. Depois da Revolução Islâmica daquele ano e da invasão da embaixada americana em Teerã, a relação dos países foi rompida e os EUA passaram a apoiar a Arábia Saudita, que se tornaria a maior potência regional nas décadas seguintes.

O Irã volta a ter influência com a eleição de Mahmoud Ahmadinejad, em 2005. Também aumentou seu poder político com a queda de Saddam Hussein. Em paralelo, o Irã detém certo controle do Estreito de Hormuz, por possuir mísseis supersônicos capazes de atingir navios comerciais (petroleiros) e militares. O petróleo é a principal fonte de renda do país.

E o papel da Arábia Saudita?

O país é forte aliado americano —a Arábia Saudita foi a primeira nação visitada por Trump depois de assumir como presidente. Trump apoia os sauditas contra a influência do Irã na região.

O que os EUA querem?

EUA querem estrangular a economia do Irã, impedindo que o país exporte petróleo. O suprimento seria fornecido por outros países, entre eles a Arábia Saudita (que tem petróleo de altíssima qualidade, melhor que o do Irã e um pouco mais caro) e os Emirados Árabes.

O que os EUA vêm fazendo para bloquear o Irã?

O país se retirou, em 2018, de um acordo nuclear assinado em 2015 com o Irã e outras potências. No final do ano passado, impôs sanções econômicas ao país. Em 2019, proibiu aliados de importarem petróleo iraniano

Como o Irã está sendo afetado?

Com as sanções impostas pelos EUA, as exportações caíram de 2,5 milhões de barris/dia em abril de 2018 para 400 mil barris/dia em maio de 2019.

Como o Irã responde?

O país ameaça fechar o Estreito de Hormuz. Para isso, tem mísseis supersônicos capazes de atingir navios comerciais (petroleiros) e militares. Também ameaça expandir o enriquecimento de urânio, que pode ser usado em armas nucleares 

Como os ataques influenciam o preço do petróleo?

Ataques a petroleiros fazem o preço da commodity subir. Antes das explosões do dia 13 de junho, o barril valia US$ 59,97; no dia dos ataques, fechou em US$ 61,31; um dia depois, era vendido a US$ 62,08. Um confronto na região afetaria o escoamento para países do Ocidente, fazendo o preço disparar.

Fontes: Reuters, NY Times e Gunther Rudzit (coordenador do Núcleo de Estudos em Negócios do Oriente Médio da ESPM e doutor em Ciência Política pela USP)

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