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Kirchneristas vão à loucura com lavada em Macri nas primárias argentinas

Votação neste domingo (11) teve vitória da chapa de Alberto Fernández e Cristina Kirchner

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Buenos Aires

O nível de exaltação que se sentiu nos arredores do "bunker" —como os argentinos se referem aos comitês de campanha— kirchnerista quando o presidente Mauricio Macri terminou o discurso, cabisbaixo, em que admitia a derrota nas primárias argentinas deste domingo (11) de lavada (quase 15 pontos de diferença), espantou até quem não estava muito interessado nesta votação.

Um ruído catártico foi, então, ouvido em vários cantos da capital argentina. Buzinas e panelas batendo começaram a soar, e pareciam vir de todos os lados. No local, onde havia sido colocado um telão gigante, na avenida Corrientes, uma multidão foi se agrupando diante do palco, embora o frio estivesse cortante.

"Tchau, Mauricio" e "Vamos a volver" (vamos voltar) eram os gritos mais ouvidos pelos que caminhavam ou gritavam da janela dos carros. Nos cantos da avenida, havia vendedores de choripán (pão com linguiça), de churrasco e cerveja.

A vitória do vencedor deste pleito, Alberto Fernández, contra o atual presidente, Mauricio Macri, já era esperada. Porém, as pesquisas que haviam circulado no sábado (10) entre os partidos políticos, sem poder ser divulgadas, mas que vazavam aqui e ali, falavam em uma diferença entre 2 e 4 pontos percentuais a favor do kirchnerismo.

Algo que a própria Casa Rosada considerava quase uma vitória, pois talvez não fosse tão difícil de reverter.

Agora, o placar tão largo mostra que a partida que se jogará no primeiro turno, em 27 de outubro, será outra. E o governo terá de pensar numa estratégia de emergência muito eficaz para reverter um resultado tão difícil.

Afinal, os 47% conquistados pela dupla Alberto-Cristina nessas primárias são suficientes para ganhar a disputa já no primeiro turno (na Argentina, mais de 45% dos votos bastam para evitar o segundo turno, ou uma combinação de 40% e mais de 10 pontos de vantagem sobre o segundo colocado).

Ou seja, Macri precisará conquistar todos os votos do terceiro colocado, Roberto Lavagna (8,45%), o que é improvável, porque, apesar de ser uma chapa de centro, muitos de seus eleitores são peronistas, e certa porcentagem deve migrar a Alberto e Cristina.

Macri contará, assim, talvez, com o apoio dos eleitores de nanicos da direita, Jose Luis Espert (2,55%) e J.G. Centurión (2,66%). Ainda assim é pouco. É certo, por outro lado, que a perspectiva de uma vitória kirchnerista pode ter "assustado" quem não foi votar e, com isso, resolva mudar sua escolha.

Até aqui, os dois discursos eram: Macri pela "continuação da mudança" que havia iniciado em 2015 contra Alberto e sua narrativa de "chega de ajuste e inflação".

Macri não convenceu, ainda que, visivelmente, tenha se esforçado para reintegrar a Argentina ao mundo, derrubando travas protecionistas, cumprimentando líderes de todo o planeta liberal e alinhando-se com líderes como Donald Trump e Juan Guaidó.

Mesmo assim, não cuidou da casa dos argentinos, que estava em desordem: as contas não fechavam no fim do mês e os ajustes e aumentos de tarifas simplesmente atacaram o eleitor onde mais dói: o bolso.

Já Alberto, com o discurso de quem viveu a crise de 2001, a pior da história recente, e a superou, ao lado do hoje mítico para a militância peronista, Néstor Kirchner (1950-2010), o marido morto de sua vice, Cristina, convenceu.

Também não se pode ignorar o poder de congregação que a própria Cristina ainda exerce sobre seu núcleo duro de apoiadores. Vale lembrar o que o guru de marketing de Macri havia lhe dito em 2011, quando convenceu o atual presidente a não disputar a eleição: "Você não vai ganhar de uma viúva, não de uma viúva como ela".

Até alguns de seus antigos opositores sentiram uma ponta de nostalgia ao vê-la voltar ao cenário, nos últimos meses, e a elevar a voz para falar do poder popular, evocando o general Perón em sua versão mais crua.

Uma das canções que se cantava no "bunker" por volta das 23h30 era a famosa "marcha peronista".

Macri insistirá que o jogo não acabou, chamará reuniões de emergência, "peronizará" seu discurso como fez para ganhar em 2015. Seguramente adotará um discurso que ataque o ponto mais fraco da aliança kirchnerista, que são os mais de dez processos judiciais por corrupção a que Cristina responde.

E tentará mostrar que a economia está melhorando —de fato está, a inflação tem baixado, mas parece que tarde demais. Porém, o argentino é pouco sensível, até hoje, ao tema da corrupção. Exemplo disso é que o ultracorrupto ex-presidente Carlos Menem, 89, com sete condenações, é hoje um senador. E está livre.

Macri ainda poderá mudar o jogo, mas terá de mudar de discurso e de atitude. Até sábado (10), posava com ar tranquilo ao lado de seu amuleto mágico, sua linda esposa, Juliana Awada, na Quinta de los Abrojos. 

A corrida é longa até outubro e nada está definido. Mas a derrota deste domingo (11) foi mais dura do que o governo esperava. E a bola está, de novo, do lado do peronismo. Quando a bola está desse lado do campo, costuma ficar por algum tempo.

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