Coreografia feminista chilena contra estupro se espalha pelo mundo

Canção com verso que afirma 'o estuprador é você' virou hino de protestos contra feminicídio

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São Paulo

Ao ritmo de uma marcha rápida, marcado por tambores, batidas de pés, música eletrônica e às vezes até apitos, um grupo de mulheres denuncia a violência de gênero cantando. “O patriarcado é um juiz /Que nos julga por nascer /E nosso castigo /É a violência que não vês.”

A letra é acompanhada por uma coreografia repetida por manifestantes vendadas com um tecido preto. “E a culpa não era minha /Nem onde estava /Nem o que vestia.”

Com um momento emblemático em que as mulheres apontam para a frente e cantam “o estuprador é você”, a intervenção virou hino de protestos contra o feminicídio e a violência contra a mulher 
ao redor do mundo.

Criada pelo coletivo chileno Las Tesis, a performance começou em Valparaíso, em 20 de novembro. O intuito era estrear no Dia Internacional do Combate à Violência Contra a Mulher, em 25 de novembro, mas elas adiantaram a apresentação devido a denúncias de abusos durante os protestos que tomam as ruas do Chile desde 18 de outubro.

Ao menos 23 pessoas já foram mortas nas manifestações, e o Instituto Nacional de Direitos Humanos aponta cerca de 2.000 feridos. Organizações de saúde afirmam que mais de 280 pessoas tiveram dano ocular grave por disparos de balas de borracha.

mulheres dançam vendadas e de preto
Grupo feminista francês faz performance em Paris da música ‘O estuprador em seu caminho’, criada pelo coletivo chileno Las Tesis - Geoffroy Van Der Hasselt - 29.nov.19/AFP

Rapidamente, a canção e a coreografia do Las Tesis tomaram o mundo. Em menos de 48 horas, a música foi adaptada para o francês e vista também em Londres, Buenos Aires e Cidade do México. Há ainda vídeos gravados em Sydney, na Austrália, e Madri. 

Por trás do coletivo há quatro mulheres: as artistas Sibila Sotomayor e Dafne Valdés, a desenhista Paula Cometa e a figurinista Lea Cáceres, todas com 31 anos.

“Essa canção chega e se transforma nessa performance a partir de um chamado de diferentes artistas cênicas de Valparaíso para gerar intervenções nas ruas”, afirmou o coletivo em declaração publicada no jornal chileno The Clinic.

Nas redes sociais, o perfil do coletivo viu crescer sua repercussão. Elas passaram de cerca de uma dezena de comentários em publicações anteriores —que falavam de performances e pediam a renúncia do presidente chileno Sebastián Piñera— para centenas de opiniões nas postagens.

Apesar de se ver apoio maciço de mulheres de todo o mundo, as organizadoras denunciam comentários com ameaças. “A todas as pessoas que incitam ódio em nossas publicações, nos desejam entre outras coisas o estupro e a morte, queremos dizer que não temos medo, agora somos milhares.”

E são, mais precisamente, cerca de 245 mil seguidores. Era esse o alcance almejado pelas criadoras da canção, que tem na base textos da antropóloga feminista argentina Rita Segato.

A professora emérita aposentada da Universidade de Brasília realizou diferentes estudos sobre a violência contra a mulher. Há pesquisa sobre violências contra indígenas e a consequência do cárcere sobre as mulheres.

A popularização da canção ajuda a diminuir a lacuna que normalmente se vê entre a academia e o cotidiano, aproximação que está na essência do Las Tesis. Segundo as idealizadoras, o objetivo é traduzir “teses de autoras feministas em um formato performático com a finalidade de alcançar uma audiência múltipla.”

Com AFP

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