Descrição de chapéu Coronavírus

Índices mostram como mundo virou de cabeça para baixo por causa do coronavírus

Mais de 110 gráficos, mapas e tabelas com dados de vários países revelam impacto da pandemia

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Bruxelas

Abril foi o mais cruel dos meses em 2020, mostram 114 gráficos, mapas e tabelas recém-publicados pelo CCSA (comitê de coordenação de atividades estatísticas), 10 deles reproduzidos nesta reportagem.

Enquanto no Brasil o governo do presidente Jair Bolsonaro restringe as informações sobre o coronavírus, 36 entidades internacionais se mobilizaram para consolidar um retrato de como a pandemia afetou o mundo não só na saúde, mas na economia, na educação, na violência, na mobilidade e até no próprio trabalho de recolher e relacionar dados para transformá-los em informações.

O resultado é “um mundo virado de cabeça para baixo”, afirmam os coordenadores da publicação, Angela Me, da UNODC (Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime), e Heishan Fu, do Banco Mundial.

Ativista mostra máscaras descartadas recolhidas em uma praia na área residencial de Discovery Bay, em Hong Kong
Ativista mostra máscaras descartadas recolhidas em uma praia na área residencial de Discovery Bay, em Hong Kong - Anthony Wallace - 21.mar.20/AFP

Foi em abril, no dia 17, que o coronavírus matou 17 pessoas por minuto no mundo, na maior taxa diária registrada desde o começo da pandemia.

Em 24 horas, 12.532 foram as vítimas. De 20 países em janeiro, a Covid-19 se alastrou para 212 nações e territórios em todos os continentes, com exceção da Antártida (e de menos de 30 ilhas no Pacífico).

O Estados Unidos assumiram a liderança no número de casos diários, e só no final de abril países europeus que viveram um colapso hospitalar, como Itália, Espanha e França, começaram a dobrar suas curvas para baixo.

Em 164 nações, foram impostas 33.712 restrições diferentes à entrada ou saída de pessoas, o que derrubou o setor de aviação: a procura por passagens despencou 98,4% em relação ao mesmo mês do ano anterior, um desastre inédito para as companhias aéreas.

Os bloqueios, que tentavam frear o contágio enquanto os países reforçavam suas estruturas de vigilância e tratamento, se estenderam a quarentenas e confinamentos, nos quais os governos obrigaram (ou, em menor número, recomendaram) que as pessoas não saíssem de casa.

A paralisação nas atividades colocou 60 milhões de pessoas na rota da pobreza extrema, segundo o Banco Mundial.

As previsões da entidade, que antes apontavam para redução na porcentagem de pessoas que vivem com menos de US$ 1,90 por dia, de 8,1% para 7,8% neste ano, agora preveem alta para 8,6% (o primeiro retrocesso desde que os dados começaram a ser registrados, em 1981).

A emergência será maior na África, onde o impacto sanitário se soma ao econômico —ao sul do deserto de Saara, 56% da população mora em favelas, segundo a ONU Habitat—, mas a pobreza ameaça também alguns dos países mais ricos do mundo.

Números da OCDE (o clube de países ricos) mostram que, na média de seus membros, 36% das famílias ficariam sem recursos para se manter após três meses sem renda.

Na Lituânia, a parcela excede 60%; na Alemanha, no Reino Unido e na França, os maiores PIBs do continente, passam de 30%.

No começo de abril, 81% da força de trabalho global vivia em países com restrições de mobilidade, fazendo o número de horas trabalhadas cair mais de 10%, na estimativa da OIT (Organização Internacional do Trabalho).

São horas que representam em um trimestre a atividade de 305 milhões de pessoas com carga de 48 horas de trabalho por semana.

Amortecidos por esquemas de emergência bilionários nos países mais ricos, o desemprego e o empobrecimento afetarão com mais gravidade os não desenvolvidos, agravando a desigualdade.

Menos visível que os danos econômicos, uma tragédia humanitária também se acumulou nas fronteiras, onde ficaram barrados os que fugiam de perseguição, guerra ou fome.

O número de refugiados por semana encolheu 88% entre fevereiro e abril, de 17.422 para 3.154, e 83 países declararam que tinham interrompido ou cortado a análise de pedidos de refúgio, segundo a UNHCR (agência da ONU para refugiados).

Entre os que ficaram sem destino nem acolhimento, uma parcela importante faz parte do grupo de maior risco de morrer por causa do novo coronavírus.

Os refugiados com mais de 60 anos de idade são 27,4% na Sérvia e 19% na Armênia e na Geórgia.

Também menos visível que os danos econômicos, o impacto social é revelado pelas estatísticas compiladas.

Escolas foram fechadas em 192 países, atingindo em abril 1,6 bilhão de alunos, ou 9 em cada 10 estudantes, segundo a Unesco (braço da ONU para educação, cultura e ciência). O mais afetado foi o ensino primário: 691 milhão de crianças tiveram sua educação interrompida.

Aulas online, acessíveis a 82% dos franceses de menos de 15 anos, 71% dos marroquinos e 70% dos tailandeses, eram alternativa impossível na Bolívia, na Indonésia ou no Paraguai, países em que até 8 em cada 10 garotos e garotas não usam a internet.

A ruptura na educação é uma bomba-relógio para a desigualdade no futuro, mas as crianças também foram prejudicadas no presente, ao ficarem trancadas em casa com seus agressores.

Na média, 80% delas sofre castigo físico ao menos uma vez por mês por parte de seus cuidadores, de acordo com a Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância).

Vários países também registraram mais mulheres vítimas de violência doméstica, e o rastro da pandemia acompanhou as que saíram de casa para trabalhar.

No setor mais indispensável deste ano, o da saúde, são mulheres de 65% (África) a 86% (Américas) dos enfermeiros, e elas foram 2 de cada 3 casos de contágio por coronavírus entre os profissionais de saúde na Itália e na Espanha, dois dos países mais atingidos pela pandemia.

Em maio, os ventos passaram a soprar com menos crueldade nos locais em que a Covid-19 chegou primeiro, como a China, a Coreia do Sul, o Japão e a Europa —houve melhora em índices de desemprego e da indústria, reabertura das lojas e escolas, a volta dos restaurantes e bares e a possibilidade de sonhar com as férias de verão.

Junho será o mês da cautelosa mas progressiva abertura das fronteiras. No final desta semana, a maioria dos países da União Europeia deve ter retomado as viagens dentro do bloco.

Em outras regiões do planeta, porém, principalmente na América Latina, os gráficos e tabelas —quando revelados— não devem trazer otimismo tão cedo. O que não lhes tira a importância.

“Decisões feitas agora e nos próximos anos vão determinar a vida das próximas gerações. É indispensável que os governos se baseiem nas melhores informações possíveis”, dizem Me e Fu.

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