Economia chinesa já está em declínio, diz principal analista de geopolítica dos EUA

Em Dubai, George Friedman afirma que desdobramentos da guerra mostram que Rússia já não é mais uma potência

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Dubai

Logo após dizer que o mundo já observa o declínio da economia chinesa, George Friedman liberou a plateia para rir. E muitos dos presentes no World Government Summit, em Dubai, nesta terça (29), riram.

Um dos principais analistas de geopolítica nos EUA, Friedman, 73, argumenta que Pequim passará, nos próximos 50 anos, por um processo de diminuição de sua influência global, como ocorreu com outras potências —os americanos na Grande Depressão, nos anos 1930, e os japoneses na década de 1990. Para ele, antes de verem sua economia colapsar, os países experimentam décadas de muita prosperidade.

O analista George Friedman durante palestra no World Government Summit, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos
O analista George Friedman durante palestra no World Government Summit, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos - Daigo Oliva/Folhapress

E, no passado, diz ele, quem enxergou esse cenário também foi alvo de risadas. Só que Friedman errou há pouco. Aos clientes de sua consultoria, a Geopolitical Futures, escreveu um pedido de desculpas por não ter previsto que a Rússia invadiria a Ucrânia, como aconteceu em 24 de fevereiro. Poucos previram.

Apesar do erro, apostar que Vladimir Putin não entraria numa guerra no Leste Europeu era o palpite mais óbvio, e as dificuldades não esperadas de Moscou para apresentar vitórias significativas mostram que a escolha do presidente russo provavelmente não foi mesmo a melhor. Para Friedman, o conflito contra Kiev escancarou que a Rússia não é mais uma grande potência e que sua economia está encolhendo.

"Seus militares se mostraram incapazes de planejar adequadamente a execução de uma guerra com um país tão fraco quanto a Ucrânia. Também sabemos que os russos não podem sobreviver às sanções impostas a eles sem tropeçar", disse o analista, que participou de dois painéis nesta terça.

Antes de fazer uma fala de 20 minutos, Friedman integrou uma mesa com Anwar Gargash, conselheiro para política externa dos Emirados Árabes Unidos, Frederick Kempe, CEO do think tank americano Atlantic Council, e Pippa Malmgren, ex-assessora de George W. Bush, presidente americano entre 2001 e 2009.

Convidado a discorrer sobre o mundo em 2050 e as características de novas potências emergentes, Friedman se dedicou mais a falar sobre a importância da tecnologia na geopolítica. Para tal, lembrou algo óbvio: as guerras provocam crises humanitárias, mortos e feridos, mas também são fonte de inovação, porque encaram problemas militares, cujas soluções são depois absorvidas pela iniciativa privada.

Sem se delongar sobre o tema que dava nome ao painel do qual era protagonista, ele apostou em Polônia, Turquia e Japão como candidatos a potências daqui a 50 anos. A inclusão de Tóquio, hoje a terceira economia global, mostra que até os países que sofreram crises severas há poucas décadas podem reverter o quadro. Em alguma medida, a aposta contradiz o pitaco pessimista sobre a China.

O ceticismo de Friedman em torno de Pequim já havia sido expresso numa análise de sua consultoria, de outubro. No texto, ele diz que as políticas chinesas são moldadas mais pelo Estado do que pelo mercado e que o governo deveria tomar decisões de longo prazo "independentemente das dores de curto prazo".

Friedman também cita no artigo a Iniciativa Cinturão e Rota, o maior programa de política externa do líder Xi Jinping, com grandes empréstimos para a construção de infraestrutura em países emergentes, sobretudo na África. "Ao longo dos anos, essa rota não se concretizou totalmente. Mas o que se materializou foi um sistema de dependências financeiras que fez a China parecer muito mais rica do que era. O dinheiro compra amigos. Mas os empréstimos geralmente precisam ser reembolsados, e muitos países beneficiários estão tão endividados que estão tendo dificuldade em acertar as contas", escreveu.

Na mesma toada, lembrou nesta terça-feira que a economia chinesa é 35% composta por imóveis e que "estamos vendo empresas chinesas começando a dar calote em suas dívidas", como aconteceu com o rumoroso caso da incorporadora Evergrande, cujo risco de falência derrubou bolsas pelo mundo.

Ainda no campo econômico, o analista viu na reação americana ao conflito deflagrado pela Rússia um sinal de que "o poder do dólar ficou à vista de todos", numa referência aos efeitos das sanções que tiraram Moscou de parte do sistema internacional de pagamentos. "Isso esmagou a capacidade de a Rússia realizar a guerra, porque guerras são caras. Os EUA descobriram que podiam fazer uma guerra sem atirar."

O que ainda precisa ser confirmado é como os europeus, dependentes do gás e do petróleo russos, vão se comportar frente à exigência de Moscou de que os itens agora sejam pagos em rublos, não em dólares.

Seja como for, diferentemente do que aconteceu em fevereiro, quando Friedman caiu do cavalo diante da ação moscovita na Ucrânia, as previsões em torno do futuro da economia chinesa ainda vão demorar ao menos 28 anos para serem checadas. Aí então saberemos quem riu por último.

O jornalista viajou a convite da Emirates News Agency (WAM)

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