Macron vira alvo de críticas ao receber príncipe saudita em turnê para romper isolamento

Necessidade de garantir petróleo leva líderes de países ocidentais a procurar MbS, acusado de mandar matar jornalista

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Paris | Reuters e AFP

O presidente francês, Emmanuel Macron, recebeu nesta quinta (28) o príncipe saudita Mohammed bin Salman, que faz uma turnê pela Europa para tentar romper o isolamento imposto a ele após acusações de desrespeito aos direitos humanos e de ser o mandante do assassinato do jornalista Jamal Khashoggi.

Países ocidentais têm procurado o sucessor do trono da Arábia Saudita, um dos maiores produtores de petróleo do mundo, em meio à Guerra da Ucrânia e ao aumento dos preços de energia. A visita a Paris ocorre duas semanas depois da viagem do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, ao país do Oriente Médio; meses antes, Boris Johnson, atual primeiro-ministro do Reino Unido, fez o mesmo movimento.

O presidente da França, Emmanuel Macron, à esq., cumprimenta o príncipe saudita Mohammed bin Salman no Palácio do Eliseu, em Paris
O presidente da França, Emmanuel Macron, à esq., cumprimenta o príncipe saudita Mohammed bin Salman no Palácio do Eliseu, em Paris - Bertrand Guay/AFP

A decisão de receber MbS, como o príncipe é conhecido, no Palácio do Eliseu, sede do governo francês, rendeu a Macron críticas de organizações de direitos humanos e da oposição.

A secretária-geral da ONG Anistia Internacional, Agnès Callamard, escreveu no Twitter que o fim do isolamento do príncipe será justificado na França e nos EUA "com argumentos da 'realpolitik'", referência à necessidade de potências ocidentais de diminuir os preços de combustíveis depois de a inflação subir com intensidade em razão do conflito no Leste Europeu. "Mas na verdade é a barganha que predomina."

Após a invasão da Ucrânia, países contrários a Moscou, um importante exportador de energia, procuraram diversificar suas fontes, pedindo a Riad que aumente a produção de petróleo para deter a dependência do gás russo. A Arábia Saudita, entretanto, resiste à pressão, argumentando seguir à risca os compromissos assumidos com a Opep+ (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), liderada junto ao Kremlin.

Olivier Véran, porta-voz do governo francês, minimizou as preocupações das ONGs em torno da visita, dizendo que Macron não deixaria de lado os valores de seu país em conversas com o líder saudita, mas que eles "seriam retidos enquanto o governo trabalha para garantir petróleo para o mundo inteiro".

Fontes no Eliseu afirmam que o presidente francês abordará a questão dos direitos humanos com o príncipe, "como sempre faz com Mohammed bin Salman". De acordo com um de seus assessores, Macron "falará [sobre o tema] de maneira geral, mas aproveitará a chance para levantar casos individuais".

O discurso é semelhante ao de Biden, que disse ter confrontado o saudita em reunião que os dois tiveram em Jidá. "Eu disse muito francamente que um presidente americano ficar em silêncio sobre uma questão de direitos humanos é inconsistente com quem somos e com quem sou eu", afirmou o americano.

O assassinato de Khashoggi, colunista do jornal americano The Washington Post, no consulado saudita em Istambul provocou furor internacional. A inteligência dos EUA concluiu que MbS havia aprovado diretamente o assassinato —o príncipe nega qualquer participação no crime.

As organizações Democracy for the Arab World Now, Open Society Justice Initiative e Trial disseram nesta quinta ter apresentado uma nova queixa para pedir às autoridades francesas a abertura de uma investigação sobre o caso. A ONU considerou o episódio um "assassinato extrajudicial pelo qual a Arábia Saudita é a responsável".

"A visita de MbS à França ou a de Biden à Arábia Saudita não muda o fato de que ele é um assassino", disse Callamard, que também foi relatora especial da ONU e investigou o crime.

Macron, que em dezembro visitou a Arábia Saudita, disse que o país é importante demais para ser ignorado no cenário internacional.

O príncipe saudita, que iniciou sua turnê pela Grécia na terça-feira, chegou a Paris na noite de quarta e foi recebido pelo ministro da Economia, Bruno Le Maire. Callamard denunciou um duplo padrão com a recepção, pois, lembrou ela, muitos líderes expressaram condenação ao assassinato e se comprometeram a não integrar MbS à comunidade internacional.

O brasileiro Jair Bolsonaro (PL), que foi a Riad em 2019, tenta viabilizar uma visita de MbS a Brasília. Os planos de viagem já foram suspensos ao menos duas vezes.

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