Congresso dos EUA eleva pressão por respeito a resultado das urnas no Brasil

Propostas apresentadas no Parlamento pedem que Biden reconsidere relações em caso de golpe

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Washington

Em meio às tensões após a sequência de manifestações de caráter golpista do presidente brasileiro, Jair Bolsonaro (PL), parlamentares nos Estados Unidos lançaram nesta quarta-feira (7) uma ofensiva no Senado e na Câmara com projetos para pressionar pelo respeito ao resultado das eleições de outubro.

No Senado, a iniciativa é capitaneada por Bernie Sanders e pede que o governo do democrata Joe Biden reconheça automaticamente o resultado do pleito no Brasil e suspenda relações em caso de golpe. O texto define uma espécie de opinião formal da Casa —se aprovada, a resolução define que o Senado defenderá que seja empossado como presidente quem for reconhecido vencedor pela Justiça Eleitoral.

O instrumento não tem força de lei nem obrigaria o Executivo a adotar a mesma posição. A proposta precisa ser aprovada pela maioria simples dos parlamentares presentes na sessão de votação, e ainda não há previsão para que ela seja colocada em pauta.

O senador americano Bernie Sanders discursa em protesto de trabalhadores de transporte em Londres - Peter Nicholls - 31.ago.22/Reuters

Assinam ainda a moção os senadores democratas Elizabeth Warren (que concorreu nas primárias democratas de 2020), Tim Kaine (chefe do subcomitê de Relações Exteriores para o hemisfério Ocidental), Richard Blumenthal, Patrick Leahy (presidente pro tempore do Senado) e Jeff Merkley. Na Câmara, o texto leva os nomes dos deputados Jamie Raskin, que integra a comissão de inquérito sobre a invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021, Sara Jacobs e Raúl M. Grijalva.

Apesar de apresentadas neste 7 de Setembro, dia em que Bolsonaro usou eventos do Bicentenário da Independência para fazer campanha e repetir ameaças, as propostas não estão diretamente ligadas aos eventos desta quarta. O independente Bernie já tinha anunciado em agosto a intenção de sugerir a moção assim que o Senado voltasse do recesso de verão, o que ocorreu nesta terça (6).

O texto, de toda forma, faz referência à Independência ao destacar que os EUA foram o primeiro país a reconhecer o movimento, em 1822. A proposta é que Washington "reveja e reconsidere o relacionamento com qualquer governo que chegue ao poder por meios não democráticos, incluindo um golpe militar".

Embora o texto não cite o nome de Bolsonaro, Merkley afirmou em nota que "as comemorações do Dia da Independência em meio a tensão e polarização ressaltam o quão frágil é a democracia e os esforços continuados necessários para preservá-la". Ele defendeu que os EUA condenem tentativas de incitação a violência política e intimidação contra o processo eleitoral.

"O destino da democracia brasileira, que está sob ataque diário do presidente Bolsonaro, e das relações entre EUA e Brasil será decidido nas próximas eleições", disse Leahy em comunicado. "O governo Biden deve deixar inequivocamente claro que os custos de subverter uma eleição livre e justa serão imediatos e severos."

Raskin comparou o atual momento do Brasil ao ataque ao Capitólio. "Enquanto o povo brasileiro se prepara para votar, as forças de direita estão tentando minar a integridade do sistema eleitoral e envenenar o processo com uma retórica autoritária que ecoa a incitação violenta que ouvimos nos EUA antes de 6 de Janeiro", disse. "A democracia está sob ataque em todo o mundo, e devemos defendê-la vigorosamente em todos os lugares contra a autocracia, a insurreição e a desinformação."

No fim do dia, questionada sobre as resoluções apresentadas no Congresso, a porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, afirmou que o país está monitorando as eleições, mas reforçou que Washington confia nas instituições democráticas brasileiras.

"O Brasil tem um histórico de eleições livres e justas, conduzidas com transparência e alto nível de participação", disse. "Como parceiros da democracia no Brasil, os EUA vão acompanhar as eleições de outubro com grande interesse. Temos grandes expectativas de que serão conduzidas de maneira livre e justa, com todas as instituições relevantes operando de acordo com a ordem constitucional."

Pela manhã, em nota para celebrar os 200 anos da Independência, o secretário de Estado Antony Blinken havia realçado a importância do comprometimento com a democracia. "Como as duas maiores democracias no hemisfério ocidental, EUA e Brasil compartilham um comprometimento em apoiar a democracia e demonstrar seus benefícios à população", disse, destacando que as nações continuam a trabalhar no aprofundamento do relacionamento estratégico e econômico.

Em entrevista à Folha no fim do mês passado, Bernie evitou fazer críticas diretas a Bolsonaro, mas afirmou que "se o resultado [da eleição] se desdobrar em algo ilegal, se houver um golpe militar que coloque no lugar um governo ilegal, os EUA têm que deixar isso muito claro: o Brasil não terá apoio, financeiro ou de qualquer outro modo".

No passado, o parlamentar já criticou Bolsonaro e elogiou o ex-presidente Lula (PT), que lidera as pesquisas. Mas, em tentativa de se blindar, ele fez questão de dizer que sua defesa da democracia brasileira no Congresso americano não é partidária. "O que estou fazendo não é contra ou a favor de Lula, contra ou a favor de Bolsonaro. Só quero garantir que os EUA jamais apoiem um governo ilegal", disse.

O mandatário brasileiro tem colocado como condição para aceitar uma eventual derrota a garantia de as eleições serem transparentes —o que o TSE e órgãos observadores afirmam que já ocorre. Quando se reuniu com Joe Biden na Cúpula das Américas, Bolsonaro repetiu que queria "eleições limpas, confiáveis e auditáveis". Na ocasião, o americano respondeu, segundo o Departamento de Estado, que "os EUA não toleram e não aceitam intervenção no sistema eleitoral em nenhum lugar".

Bernie passou a dedicar mais atenção ao pleito de outubro depois de receber, em julho, uma comitiva de entidades da sociedade civil brasileira, liderada pelo grupo Washington Brazil Office.

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