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Sergio Duarte

Mundo deve se manter consciente do enorme risco nuclear em meio à Guerra da Ucrânia

Única garantia contra o uso desse tipo de armamento é sua completa eliminação

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Sergio Duarte

Embaixador, foi alto representante das Nações Unidas para Assuntos de Desarmamento. É presidente das Conferências Pugwash sobre Ciência e Assuntos Mundiais

A chamada "operação militar especial" desencadeada pela Rússia contra a Ucrânia já dura oito meses, sem sinal de negociações sérias entre as partes envolvidas. A agressão armada é claramente proibida no Artigo 2º da Carta das Nações Unidas, mas o direito de veto impede o Conselho de Segurança de agir à revelia de qualquer de seus cinco membros permanentes, um dos quais é a Rússia.

Declarações do presidente russo, Vladimir Putin, e do secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, aumentaram a preocupação internacional de que venham a ser utilizadas armas nucleares no conflito.

No entanto, embora as doutrinas de defesa da Rússia e dos EUA, assim como a da Otan, contemplem o uso em certas condições, não parecem dadas as circunstâncias extremas em que estaria previsto o emprego dessas armas pelos beligerantes. Na guerra de versões, Moscou acusa a Ucrânia —com escassa credibilidade— de pretender detonar em seu próprio território uma bomba convencional "suja", de elevado poder de radiação, de cujo uso Kiev culparia a Rússia.

Reprodução de vídeo mostra alegado míssil balístico russo em exercícios das forças estratégicas nucleares do país em Plesetsk - Divulgação Ministério da Defesa da Rússia - 26.out.22/Reuters

Existe no Ocidente o receio de que para reverter insucessos militares a Rússia lance mão de armas nucleares de baixa potência, conhecidas como não estratégicas ou táticas, destinadas a ações de alcance limitado. Outras hipóteses, consideradas mais remotas, seriam uma detonação "de demonstração" em área não habitada, uma operação de "contraforça" em campo de batalha ou ainda um ataque contra um centro habitado.

Nesses casos haveria, sem dúvida, o risco de uma resposta nuclear capaz de levar a uma escalada e a uma conflagração mais ampla, certamente catastrófica para ambos os lados, assim como para o restante do planeta. Não se pode, além disso, excluir a ocorrência de erros de avaliação ou de interpretação de dados transmitidos pelos sistemas de alerta de um lado ou do outro, nem tampouco a de acidentes.

Deve-se levar em consideração, porém, a existência de uma poderosa norma moral não escrita, comumente denominada "tabu nuclear", que em caso de violação por qualquer país acarretaria o opróbrio da comunidade internacional.

O uso de armas nucleares pela Rússia poderia levar ao envolvimento de outros países no apoio à Ucrânia e aumentar o isolamento de Moscou. As vantagens militares seriam limitadas em relação ao imenso risco inerente ao uso de tais armas e muito provavelmente a determinação da Ucrânia a resistir e a decisão da Otan de sustentar seu esforço se veriam reforçadas.

A razão e o bom senso nem sempre governam as ações dos indivíduos, inclusive líderes e dirigentes políticos. É importante que o mundo permaneça consciente dos enormes riscos nucleares atuais e redobre os esforços em favor de um urgente diálogo entre os contendores em busca de um cessar-fogo seguido de negociações de paz.

Além disso, toda a comunidade internacional deve exigir com veemência o cumprimento dos compromissos de segurança e desarmamento contidos nos instrumentos multilaterais em vigor, assim como seu aperfeiçoamento.

A opinião pública tem papel fundamental nesse esforço. A humanidade não pode permanecer perpetuamente refém do instável e imprevisível equilíbrio nas relações entre as potências nuclearmente armadas. A única garantia contra o uso de armas nucleares é a sua completa eliminação.

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