Otan acusa China de buscar controle de infraestruturas cruciais do Ocidente

Declarações de Jens Stoltenberg ecoam discurso da UE sobre revisão da parceria comercial com potência asiática

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Países do Ocidente devem ter cuidado para não criar novas dependências da China enquanto se afastam da Rússia devido à Guerra da Ucrânia, afirmou nesta segunda-feira (21), Jens Stoltenberg, secretário-geral da Otan, a aliança militar ocidental, durante visita à Espanha.

A declaração do norueguês expressa o discurso que vem sendo adotado por nações europeias em relação a Pequim. Em outubro, líderes da União Europeia (UE) subiram o tom e pediram que a relação com o regime liderado por Xi Jinping seja urgentemente recalculada.

Jens Stoltenberg, secretário-geral da Otan, em Madri, na Espanha, para encontro da aliança militar
Jens Stoltenberg, secretário-geral da Otan, em Madri, na Espanha, para encontro da aliança militar - Juan Medina/Reuters

Stoltenberg afirmou que há crescentes esforços chineses para controlar infraestruturas cruciais, cadeias de suprimentos e setores industriais importantes do Ocidente. "Não podemos dar aos regimes autoritários chances de explorar nossas vulnerabilidades."

O discurso incisivo contra a ditadura chinesa, de certo modo, ecoa aprendizados da Europa com Moscou. A guerra no Leste Europeu, afinal, expôs a dependência europeia do gás russo, que, ao deixar de ser fornecido nas mesmas quantidades de antes, abriu uma crise energética e econômica na região.

O fator complicador é que a China é a principal parceira comercial da UE desde 2020, quando desbancou os EUA. Em 2019, a potência asiática foi descrita pelo bloco como uma "parceira para objetivos comuns", uma "rival sistêmica que propaga outro tipo de regime" e uma "concorrente econômica".

Um dos primeiros líderes europeus a lidar com o imbróglio foi o premiê da Alemanha, Olaf Scholz, que esteve com Xi no início do mês. O encontro teve na pauta questões geopolíticas, como Ucrânia e Taiwan, mas também a agenda econômica, com Scholz sendo criticado inclusive por alguns de seus ministros.

Ainda assim, poucos dias após a conversa entre os líderes, Berlim bloqueou a venda de uma fábrica de semicondutores para uma empresa chinesa devido a possíveis ameaças de segurança. O grupo sueco Silex, do conglomerado chinês Sai Micro Electronics, queria comprar a alemã Elmos, que produz um tipo de chip conhecido como wafers.

O ministro da Economia alemão, Robert Habeck, afirmou na ocasião que a China deve seguir como uma importante parceira comercial. "Mas não devemos ser ingênuos, temos de ver se os interesses comerciais e de mercado correm o risco de serem usados para políticas de poder contra os interesses da Alemanha."

Os serviços de inteligência alemães, ligados ao Ministério do Interior, desaconselharam a compra, que o governo inicialmente era favorável a aprovar. Depois, Scholz acabou chancelando a recomendação para cancelar a negociação junto a seu Conselho de Ministros.

Durante entrevista coletiva na última quarta (16), Stoltenberg foi questionado sobre a possibilidade de a China desempenhar um papel maior na mediação da Guerra da Ucrânia —o país, afinal, tem fortalecido laços econômicos com Moscou em meio ao conflito.

O chefe do clube militar, então, criticou o país por não ter condenado publicamente a invasão russa, ainda que diga defender o diálogo e a paz. "A China, na verdade, compartilha de parte da narrativa russa sobre a guerra, e essa narrativa não é correta. A Rússia e Vladimir Putin são os responsáveis pela guerra."

Pequim, por sua vez, também já direcionou críticas à Otan. Em abril, a chancelaria chinesa acusou a aliança de "bagunçar a Europa" e tentar criar conflitos na região da Ásia-Pacífico, onde os EUA disputam influência militar e econômica com o regime liderado por Xi.

O próprio Xi fez críticas durante reunião virtual do Brics, bloco que o Brasil também integra, em junho, quando disse que "países acabarão em dificuldades se depositarem fé cega na expansão de alianças militares e na busca de sua segurança às custas dos outros".

O dirigente assegurou no mês passado o terceiro mandato à frente da ditadura comunista. Ainda que com o poder consolidado, ele vê seu país dependente economicamente dos EUA, dado que o crescimento chinês será menor que o projetado para este ano. Também há o temor de que Pequim seja punida com sanções como as que se abateram sobre Moscou em caso de apoio mais enfático aos russos no conflito.

Insistindo na política de Covid zero, a China deve registrar um crescimento de 3,5% em 2022, bem abaixo dos 5,5% projetados pelo próprio PC no início do ano e dos 8,1% de 2021, quando o país conseguiu lucrar ao manter o motor ligado enquanto o mundo desacelerava devido à pandemia.

Investimentos em infraestrutura de outros países são um tema central na política de Xi. Nos últimos anos, Pequim lançou a Iniciativa Cinturão e Rota, programa ousado para o setor de países em desenvolvimento, inclusive da África e da Ásia. O projeto já despejou cerca de US$ 1 trilhão, em valores não corrigidos, em 149 países e 30 órgãos internacionais.

Também nesta segunda, Stoltenberg afirmou que, diante do cenário global ainda instável, os aliados da Otan analisam aumentar a meta mínima para gastos de defesa —atualmente em 2% do PIB. O tema deverá ser discutido na próxima cúpula da aliança, em julho de 2023.

"Espero que, mesmo que os 2% sejam mantidos, eles sejam mais como uma espécie de piso que como teto para gastos com defesa", disse o norueguês. "São negociações que vão continuar, mas estou absolutamente confiante de que as ambições vão aumentar de uma forma ou de outra —porque todos agora veem a necessidade de investir mais".

Com AFP e Reuters

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