Portugal reformará sistema de serviço migratório após receber 29 mi de ligações em 12 horas

Órgão da área quer ampliar volume de contatos direcionados para canais automáticos e agilizar processo de triagem para operadores

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Lisboa

Após receber mais de 29 milhões de ligações em apenas 12 horas, o SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras), órgão responsável pela imigração em Portugal, pretende reformular o seu serviço de atendimento telefônico, hoje a única forma de realizar agendamentos para vários serviços na entidade.

As quase 30 milhões de chamadas, referentes ao período entre as 8h e as 20h de 17 de outubro, refletem o caos vivido na gestão da crescente comunidade estrangeira no país. Depois de meses sem abrir novos agendamentos, o SEF disponibilizou no último mês mais de 60 mil vagas de atendimento, mas os números de telefone do órgão não suportaram a demanda e apresentaram instabilidade.

Pessoas esperam para embarcar em bonde elétrico no centro de Lisboa, em Portugal
Pessoas esperam para embarcar em bonde elétrico no centro de Lisboa, em Portugal - Patricia de Melo Moreira - 29.abr.22/AFP

Segundo a entidade, a maior parte das ligações foi feita de aplicativos e serviços na internet que realizam rediscagem automática, provocando sobrecarga no sistema. "Por se tratar de uma situação nova no nível de procura e correspondente pressão do sistema, o SEF está a estudar alternativas para implementar em breve uma nova solução, num modelo de atendimento em canais digitais, com tratamento mais célere, para a reduzir consideravelmente o número atual de ligações", diz o órgão, em nota.

A ideia, de acordo com o SEF, é ampliar o volume de contatos direcionados para canais automáticos de atendimento e agilizar o processo de triagem e encaminhamento para os operadores.

O anúncio das mudanças surge após uma série de relatos de advogados e imigrantes, que, mesmo tendo realizado milhares de ligações para o órgão migratório, não conseguiram ser atendidas. A brasileira Jéssica Cavalcanti, por exemplo, diz ter feito mais de 3.000 chamadas para o SEF com a ajuda de um app.

Casada com um brasileiro com cidadania italiana, ela tem direito a residência em Portugal, mas precisa do documento emitido pelo SEF para permanecer no país em situação regular. "É humilhante. Enquanto isso, nossa vida fica parada. Sem a autorização de residência não consigo participar de processos seletivos."

Assim como ela, muitos estrangeiros que têm o direito de residir no país devido a elos familiares —cônjuges de cidadãos da UE e filhos de imigrantes recém-regularizados— acabam em situação irregular.

Nesta semana, a imprensa portuguesa noticiou denúncias de venda de vagas para atendimento no SEF. Em um comunicado, o órgão português afirmou que, sempre que teve conhecimento de queixas sobre o sistema de agendamentos, comunicou os casos ao Ministério Público.

Apesar dos mais de 700 mil imigrantes legalmente residentes no país, o SEF tem só 50 operadores para receber ligações. Eles atendem, em média, 3.000 chamadas diárias. Para desobstruir o sistema, o órgão criou em 2020 um sistema de renovação automática para estrangeiros que já têm autorização de residência no país. Após mais de um ano de funcionamento, o serviço passou a ter seguidos atrasos.

A situação fica ainda mais indefinida para 2023, quando o governo português pretende dar seguimento à extinção do SEF, proposta há dois anos. O órgão será substituído pela Agência Portuguesa para Migração e Asilo, mas as mudanças ainda não têm data para acontecer. Os serviços migratórios também precisam lidar com a fila de 200 mil estrangeiros com processos de regularização pendentes junto ao SEF. São pessoas que apresentaram a chamada "manifestação de interesse" para permanecer legalmente no país.

Na maioria dos casos, são imigrantes que entraram em Portugal com status de turista e seguiram no país trabalhando sem permissão —essa é a principal via de migração para o país, sobretudo de brasileiros.

Portugal é um dos poucos países da União Europeia que permite a regularização por meio do trabalho, mas o processo é burocrático e, diante da atual sobrecarga dos serviços migratórios, cada vez mais lento.

Embora o risco de deportação seja baixo e os estrangeiros consigam trabalhar e ter acesso a educação e saúde públicas, a condição irregular deixa os migrantes em situação de vulnerabilidade social e laboral.

Para tentar resolver esse problema, o governo socialista do premiê, António Costa, criou um visto voltado para quem procura trabalho no país. A permissão cria uma via legal de imigração para suprir as demandas de empresas portuguesas, sobretudo no setor de restaurantes e de serviços ligados ao turismo.

O visto, que pode ser pedido por brasileiros desde o último domingo (6), é válido por 120 dias, prorrogáveis por mais 60. Quem não conseguir emprego após esse período é obrigado a deixar o país. Embora melhore as garantias legais para os estrangeiros e ajude a desafogar a fila de regularização, a nova permissão jogará ainda mais pressão nos serviços de autorização de residência e atendimento telefônico.

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