Como a China reage ao desgaste público provocado pela Covid zero

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Igor Patrick
Washington

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Após a série de protestos no país, o regime chinês reagiu ao desgaste público provocado pela Covid zero e indicou que vai caminhar rumo a uma flexibilização da política sanitária.

Pela primeira vez, a vice-primeira ministra e uma das principais articuladoras da Covid zero, Sun Chunlan, falou em um "novo momento" no combate ao vírus, focando sobretudo idosos não vacinados. As declarações foram relatadas pela imprensa local durante a participação dela em um simpósio da Comissão Nacional de Saúde.

Sun afirmou que com "uma medicina eficaz —especialmente a medicina tradicional chinesa—, vacinação de mais de 90% de toda a população e o declínio da patogenicidade da variante ômicron há condições para otimizar ainda mais as respostas à Covid".

Agentes sanitários examinam população nas ruas do país.
China acelera relaxamento de restrições da Covid zero - Gilles Sabrié/The New York Times

O presidente honorário da Academia Chinesa de Ciências Médicas Chinesas, Zhang Boli, participou do mesmo evento na condição de especialista. Às autoridades presentes disse que a ômicron será "difícil de erradicar completamente", reportou o estatal Beijing Daily.

A reunião encerrou com Pequim definindo metas ambiciosas: até o final de janeiro de 2023, 90% das pessoas com mais de 80 anos devem estar totalmente vacinadas com duas doses (atualmente, a taxa é de 68,7%). Governos provinciais foram orientados a "evitar respostas excessivas" no controle da pandemia.

Em Guangzhou, uma das cidades mais impactadas pela nova onda de infecções, autoridades anunciaram que os bloqueios em metade da cidade seriam cancelados, e as ordens de testes em massa, encerradas. Já em Chongqing, maior metrópole do país, contatos próximos de pessoas com Covid poderão fazer quarentena em casa.

Por que importa: Na semana passada, mostrei na Folha que o partido já preparava nos bastidores uma ampla campanha de propaganda para iniciar a mudança de percepção sobre a doença no país. Os protestos podem ter acelerado o processo, e a China agora dá sinais de que pode considerar uma reabertura num futuro próximo.

Fazer isso, porém, segue como uma aposta arriscada. O país perdeu a oportunidade de equipar a infraestrutura hospitalar em quase dois anos sem casos da doença, contando com o cenário em que a vacinação no resto do mundo extinguiria a circulação do vírus. Mesmo com altas taxas de vacinação, o volume de infectados será grande.

o que também importa

Sumido desde 2020, o bilionário dono do conglomerado chinês Alibaba, Jack Ma, reapareceu. O jornal nipo-britânico Financial Times descobriu que Ma se mudou há quase seis meses para o Japão, onde desfruta de uma vida fora dos holofotes após críticas ao regime chinês que quase levaram sua empresa à ruína.

Em 2020, às vésperas do aguardado IPO (oferta inicial de ações) da Ant Group, Ma fez declarações públicas criticando os reguladores chineses e chamando bancos estatais de "casa de penhores". O bilionário defendeu que a Ant, empresa subsidiária do Alibaba que controla a popular carteira de pagamentos AliPay e um robusto sistema de microempréstimos, oferecia a pessoas mais pobres crédito colateralizado, modelo em que quem pega o empréstimo dá um bem como garantia.

O fundador do Alibaba, Jack Ma, durante evento em Paris - Philippe Lopez/AFP - 16.mai.2019

As declarações deram início a uma tempestade com o regime, que imediatamente bloqueou o IPO e lançou várias investigações contra as empresas de Ma. O caso foi resolvido com o pagamento de US$ 2,8 bilhões em multas. Segundo o Financial Times, Ma ainda viaja frequentemente aos EUA e a Israel, mas tenta não chamar a atenção da mídia para evitar problemas com a China.

O mercado imobiliário chinês continua a mostrar sinais de esgotamento e deve encolher até 44% na comparação com o ano passado, reportou a revista Caixin. Segundo a publicação, após responder por ¥ 18 trilhões (R$ 13,25 trilhões) em 2021, as vendas do setor devem ficar entre ¥ 10 trilhões e ¥ 13 trilhões até dezembro.

As vendas de imóveis na China caíram cerca de 26% até outubro em relação a 2021, segundo dados do Escritório Nacional de Estatística. A tendência é causada por crises nas grandes incorporadoras, como a Evergrande, e a demanda fraca, provocada pelo desaquecimento na economia. As perdas preocupam o setor, que passou a pedir subsídios do governo para continuar a incentivar a compra de imóveis.

Área residencial da Zona de Desenvolvimento Econômico de Yangpu, na província de Hainan, no sul da China - Xinhua/Pu Xiaoxu - 10.out.2022

fique de olho

Com o banimento americano de importações de novos equipamentos de telecomunicação fabricados por Huawei e ZTE, o Ministério do Comércio chinês anunciou que vai estudar medidas para proteger "os direitos legítimos de empresas chinesas".

A porta-voz da pasta, Shu Jueting, disse à imprensa que os chineses vão adotar "todas as medidas necessárias" para responder à decisão, anunciada pela Comissão Federal de Comunicações dos EUA com o aval do governo Biden.

Por que importa: A medida tomada pelos EUA não chega a ser grande surpresa, dado que os americanos acusam as duas empresas há anos de colaborarem com serviços de inteligência da China e, portanto, representarem riscos à segurança nacional.

A resposta chinesa à questão, contudo, merece ser mais bem observada. Na última vez em que Washington anunciou sanções à Huawei, nacionalistas chineses pediram sanções às operações da Apple em território chinês. O país asiático é o segundo maior mercado da empresa e responde por cerca de 25% de todo o seu lucro anual.

para ir a fundo

  • Com a morte do ex-líder chinês Jiang Zemin, o South China Morning Post escreveu um ótimo perfil sobre o político, relembrando como ele conseguiu restaurar a normalidade das relações sino-americanas após o massacre da praça da Paz Celestial. (gratuito)
  • O Ibrachina lança na próxima quinta (8) mais um produto da parceria com a Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de SP. No canal da organização estará disponível o clipe de "Meu Querido Amigo", versão nacional de um clássico da música chinesa. (gratuito, em português)

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