Uma mulher de 97 anos que trabalhava como secretária de um campo de concentração nazista foi condenada nesta terça-feira (20) por seu papel no assassinato de milhares de pessoas, no que pode ser um dos últimos julgamentos relacionados ao Holocausto.
O tribunal da cidade de Itzehoe, no norte da Alemanha, condenou Irmgard Furchner a uma pena suspensa de dois anos de prisão por ajudar e ser cúmplice no assassinato de 10.505 pessoas e pela tentativa de assassinato de outras cinco, segundo um porta-voz da corte.
Nesse tipo de arranjo jurídico, a pessoa considerada culpada não é condenada à prisão, mas pode ser detida no futuro caso cometa um outro crime durante um período específico de tempo.
A promotoria originalmente acusou Furchner de ajudar no assassinatos de 11.412 pessoas. Após tomar conhecimento da sentença, destacou o "significado histórico excepcional" do processo, com um veredito sobretudo "simbólico".
Ela foi condenada pela lei juvenil, pelo fato de ter entre 18 e 19 anos na época dos crimes.
Furchner foi levada ao tribunal vestindo um casaco de inverno de cor creme e boina, com um cobertor sobre o colo. Ela ouviu o veredito em uma cadeira de rodas.
Em uma declaração no encerramento do julgamento no início deste mês, Furchner disse que sentia muito pelo que havia acontecido e lamentava ter trabalhado no campo de concentração de Stutthof, localizado perto de Gdansk, na Polônia.
Entre junho de 1943 e abril de 1945, Furchner trabalhou no escritório do comandante do campo, Paul Werner Hoppe. De acordo com a acusação, ela anotou e redigiu as ordens do oficial nazista e entregou sua correspondência.
A promotora destacou aos juízes que o trabalho administrativo da acusada "assegurou o bom funcionamento do campo" e deu a ela "conhecimento de todos os acontecimentos em Stutthof".
Cerca de 65 mil pessoas, entre prisioneiros de guerra e judeus capturados na campanha de extermínio nazista, morreram de fome e doenças ou na câmara de gás em Stutthof.
Os advogados haviam pedido a absolvição da idosa, alegando que as evidências apresentadas durante o julgamento não provaram sem margem para dúvida que a mulher tinha conhecimento dos assassinatos.
O início do julgamento de Furchner estava previso para setembro de 2021, mas acabou adiado depois de a acusada fugir da casa de repouso em que mora e seguir para uma estação de metrô, em uma tentativa de escapar do tribunal. Ela foi detida na cidade vizinha de Hamburgo, horas depois, e ficou presa por cinco dias.
Durante as audiências do julgamento, sobreviventes do campo de Stutthof apresentaram relatos comoventes de seu sofrimento. A promotora Maxi Wantzen agradeceu a coragem das testemunhas, incluindo algumas que também compareceram como co-requerentes, e afirmou que estas falaram sobre o "inferno absoluto" do campo.
"Sentem que é seu dever, embora tenham de invocar a dor de maneira repetida para fazer isto", disse ela.
Setenta e sete anos após o fim da Segunda Guerra Mundial, o tempo é cada vez mais curto para levar à justiça os criminosos vinculados ao Holocausto. Nos últimos anos vários processos foram abandonados porque os acusados faleceram ou não tiveram condições de comparecer ao tribunal.
A condenação em 2011 do guarda John Demjanjuk, com base no fato de que integrou a máquina de matar do regime de Hitler, estabeleceu um precedente legal e abriu o caminho para vários julgamentos.
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