Tribunal paquistanês liberta estuprador após ele aceitar se casar com a vítima

Dawlat Khan, 25, havia sido condenado a prisão perpétua por estuprar mulher com deficiência auditiva

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São Paulo

A Justiça do Paquistão soltou um estuprador do presídio depois que ele aceitou se casar com a vítima, informou a agência de notícias AFP nesta quarta-feira (28). A decisão, acordada com a família da mulher, reforça o histórico de impunidade no país asiático em casos desse tipo.

Dawlat Khan, 25, foi condenado em maio a prisão perpétua por um tribunal de Buner, na província de Khyber-Pakhtunkhwa, pelo estupro de uma mulher com deficiência auditiva. Ele já havia sido preso semanas antes, quando a vítima comprovou que Khan era o pai biológico do bebê que tivera meses antes.

Ativistas pelos direitos das mulheres carregam cartazes durante manifestação em Karachi, no Paquistão
Ativistas pelos direitos das mulheres carregam cartazes durante manifestação em Karachi, no Paquistão - Asif Hassan - 8.mar.22/AFP

Desde então, a defesa tentava um acordo extrajudicial com a família da vítima, mediado por um conselho de anciãos. Em áreas rurais, esses órgãos, conhecidos como 'jirgas', são formados por idosos e seguem um código moral –as decisões não têm valor jurídico, mas são levadas em conta pelos tribunais.

Na segunda, a Suprema Corte de Peshawar, capital da província onde o crime ocorreu, aceitou o pacto mediado pelo conselho e decidiu pela libertação de Khan. "O estuprador e a vítima são da mesma família", disse à AFP Amjad Ali, advogado de Khan, referindo-se ao agora status de marido e mulher dos dois.

A decisão provocou indignação de ativistas dos direitos humanos, que afirmaram que o episódio legitima a violência sexual contra as mulheres num país onde a maioria dos estupros não é denunciada.

Investigação da TV Samaa, uma das principais emissoras do país, apontou que 21,9 mil mulheres foram estupradas no Paquistão de 2017 a 2021, ou seja: uma paquistanesa é estuprada a cada duas horas.

Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, uma mulher foi estuprada, em média, a cada dez minutos no Brasil em 2021. A diferença se daria pelo receio das paquistanesas em denunciar o crime.

Devido à vergonha social associada, poucos casos são registrados, e as baixas taxas de condenação são, em parte, resultado de erros das investigações, más técnicas de acusação e acordos extrajudiciais.

De acordo com a Asma Jahangir Legal Aid Cell, grupo que presta assistência jurídica a mulheres vulneráveis, a taxa de condenações por estupro fica abaixo de 3% dos casos que vão a julgamento. Em 2020, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) colocou o Paquistão em primeiro lugar entre os 75 países com viés antimulheres nos tribunais de Justiça.

"Este caso significa a aprovação do estupro, da facilitação de estupradores e da mentalidade do estupro pelo tribunal", afirmou Imaan Zainab Mazari-Hazir, advogada e defensora dos direitos humanos. "É algo contrário aos princípios básicos de Justiça e da lei do país, que não reconhece tal acordo", completou.

A Comissão de Direitos Humanos do Paquistão, por sua vez, declarou-se horrorizada com a decisão.

Com AFP

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