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Em meio a balões e óvnis, China e EUA veem aumento de casos de espionagem

Agentes secretos, ataques hacker e até TikTok estão entre acusações trocadas por Washington e Pequim

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Washington

Após terem abatido um balão chinês que dizem servir para espionagem, os EUA ajustaram seus radares para identificar objetos menores, e pelo menos três óvnis foram descobertos nos últimos dias.

Diferentemente do que ocorreu com o balão, Pequim desta vez não assumiu a responsabilidade, e a Casa Branca disse nesta terça-feira (14) não ter encontrado indícios de que os itens tivessem origem chinesa.

Em resposta às acusações em torno do balão, a chancelaria chinesa afirmou que, desde 2022, ao menos dez balões americanos entraram no espaço aéreo do país. Mais uma vez as duas nações disputam a narrativa sobre o episódio, mas fato é que a espionagem faz parte da história das relações entre elas —que se tornaram mais tensas desde que Pequim passou a disputar o posto de maior potência global.

Membros da Marinha dos EUA recuperam partes de balão de alta altitude da China, que Washington alega ser instrumento de espionagem
Membros da Marinha dos EUA recuperam partes de balão de alta altitude da China, que Washington alega ser instrumento de espionagem - 13.fev.23/Divulgação Marinha dos EUA via Reuters

Levantamento do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS, na sigla em inglês), baseado em Washington, identificou 160 episódios de conhecimento público de espionagem pelos chineses de 2000 a 2021. A pesquisa mostra um aumento recente: apenas um quarto desses episódios ocorreu na primeira década dos anos 2000, enquanto 76% deles foram identificados de 2010 a 2021. A lista não contabiliza 1.200 casos de roubo de propriedade intelectual, 50 de tentativa de contrabando de tecnologia controlada e de munição dos EUA para a China e ações contra cidadãos e empresas americanas baseadas na China.

Dentre os casos identificados, 42% dos autores foram militares ou autoridades do governo chinês, e 26%, pessoas de outras nacionalidades —a maioria dos quais cidadãos americanos recrutados por Pequim.

A maior parte dos episódios mirava tecnologias comerciais, mas também houve casos de espionagem para obter informações de agências e políticos (16%) e tecnologia militar (34%). Para os EUA, "a maior ameaça de longo prazo às informações, à propriedade intelectual e à vitalidade econômica é aquela de contraespionagem e espionagem econômica da China", disse em 2020 o diretor do FBI, Christopher Wray.

Para Pequim, o perigo não é menor, e a espionagem americana "ameaça seriamente a segurança nacional da China", disse uma porta-voz da chancelaria no ano passado ao acusar a NSA (Agência de Segurança Nacional dos EUA) de promover "dezenas de milhares" de ciberataques e roubar dados sensíveis.

James Andrew Lewis, vice-presidente do CSIS e especialista em segurança, afirma que, além do aumento de casos em si, os EUA ficaram melhores em detectá-los. "Muito do esforço dos EUA para melhorar a cibersegurança nos últimos anos diz respeito ao desejo de se proteger da China", diz ele, citando a ameaça cibernética como a mais preocupante entre as diferentes formas de espionagem. O aumento da regulação da exportação de tecnologia americana também se deve à necessidade de controlar o acesso chinês, afirma Lewis, e os EUA passaram a agir mais firmemente para identificar espionagem humana.

Não é só de drones altamente tecnológicos ou balões de vigilância que a espionagem é feita. No fim de janeiro, a Justiça condenou a oito anos de prisão um cidadão chinês que atuava, de acordo com a sentença, como aliciador de engenheiros e cientistas americanos em um programa para obter tecnologia aeroespacial e de satélites desenvolvida nos EUA. Ji Chaoqun, 31, mudou-se aos EUA em 2013 com um visto de estudante e se alistou no Exército em 2016, até ser preso dois anos depois. Segundo a apuração, ele atuava sob supervisão de outro agente de inteligência, Xu Yanjun, condenado a 20 anos de prisão.

O uso de agentes secretos remonta à Guerra Fria, e o caso mais emblemático é o de Larry Wu-tai Chin, nascido na China e naturalizado americano. Ele trabalhou por mais de 30 anos para o governo dos EUA.

Contratado como tradutor no consulado americano em Xangai, em 1945, foi para a CIA nos anos 1950, até se aposentar, em 1981. Foi só em 1985 que a real atividade de Chin foi revelada: um oficial de inteligência de Pequim desertou e contou que o tradutor era um espião a serviço do Partido Comunista Chinês.

Com acesso a relatórios ultrassecretos, ele compartilhava informações com Pequim sobre agentes americanos, que eram presos e executados. Chin também adiantou ao regime, em 1970, que o então presidente Richard Nixon planejava retomar relações com os chineses, num movimento para enfraquecer a União Soviética —Nixon só foi à China em 1972. Preso e condenado, Chin se suicidou na prisão em 1986.

Do lado americano, o uso de espiões na China também é constante. Em 2019, Sun Bo, executivo do conglomerado da indústria naval China Shipbuilding Industry Corporation, foi condenado a 12 anos de prisão acusado de fornecer à CIA informações confidenciais sobre o desenvolvimento de um porta-aviões.

Reportagem de 2021 do jornal The New York Times mostrou que oficiais de inteligência do governo americano dispararam um telegrama à CIA alertando sobre o alto número de espiões e informantes presos e mortos em uma série de países nos últimos anos, entre os quais a China.

O avanço da tecnologia chinesa trouxe a espionagem para dentro de lares americanos, acusa Washington. Wray, diretor do FBI, já afirmou que Pequim pode usar dados coletados pelo TikTok, app mais baixado no mundo em 2022 —em dezembro, o governo de Joe Biden baniu a plataforma de aparelhos do governo alegando problemas de segurança nacional. Os EUA também avançam sobre o gigante chinês Huawei, porque as tecnologias da companhia facilitam, segundo a Casa Branca, a espionagem. A empresa nega.

Não fica de fora, também, certo pânico moral. O governo Donald Trump lançou em 2018 um programa conhecido como Iniciativa China, que avançava contra o que via como espionagem chinesa em universidades. Após uma série de casos em que pesquisadores foram processados e até demitidos para depois serem inocentados, o programa foi descontinuado em meio a acusações de racismo.

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