FBI investiga George Santos em suposto esquema de verba para cães rejeitados

Órgãos dizem não ter registros da instituição de caridade criada pelo hoje deputado dos EUA pelo Partido Republicano

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Nova York | The New York Times

O dinheiro vinha de rifas e vendas de cestas, e animais de estimação encontraram novos lares. O evento de adoção em Staten Island foi um sucesso. Até que o líder da instituição de caridade fez um pedido estranho: insistiu que o dono da loja lhe desse o dinheiro em um cheque em seu nome, Anthony Devolder.

O proprietário se recusou e passou o cheque para a instituição beneficente Friends of Pets United (amigos dos pets unidos). Dias depois, percebeu que o nome da instituição havia sido apagado. "Quando foi sacado, estava riscado e tinha ‘Anthony Devolder’ escrito no cheque", conta o proprietário, Daniel Avissato.

Deputado americano George Santos durante sessão do Congresso em Washington
Deputado americano George Santos durante sessão do Congresso em Washington - Saul Loeb - 7.fev.23/AFP

Anthony Devolder é agora conhecido como o deputado republicano George Santos, de Nova York, cuja eleição para o Congresso dos EUA em novembro foi acompanhada por revelações de mentiras em seu passado e irregularidades em suas finanças pessoais e de campanha. Promotores estão investigando se as mentiras de Santos merecem acusações criminais. E os agentes do FBI, a polícia federal americana, agora estão investigando alguns de seus trabalhos com o Friends of Pets United, revelou o site Politico.

Santos disse que fundou e administrou a instituição de caridade de 2013 a 2018. Na época, afirmava a biografia de sua campanha, a organização resgatou mais de 2.500 animais. Recentemente, ele caracterizou seu envolvimento como uma "missão de amor e trabalho duro". Santos não comprovou as afirmações. Existem poucos registros para corroborá-las, e as operações da Friends of Pets United parecem ter se concentrado em um grupo do Facebook já extinto. Só vestígios da organização estão em postagens públicas e campanhas GoFundMe, e a biografia da campanha de Santos não a menciona mais.

O advogado de Santos, Joe Murray, não respondeu a perguntas sobre a Friends of Pets United. Mas capturas de tela do grupo do Facebook e entrevistas com ex-voluntários e amigos de Santos ajudam a obter uma imagem mais completa das operações da instituição beneficente.

Elas lembraram iniciativas dispersas: alguns animais de estimação foram resgatados, e dinheiro e suprimentos foram doados para grupos de animais. Mas também sugerem que a propensão de Santos para mentiras e exageros se estendeu ao Friends of Pets United.

Vários dizem que Santos afirmou que operava uma organização sem fins lucrativos registrada, mas não existem registros que o confirmem. Eles dizem que o grupo resgatou muito menos animais de estimação do que os mais de 2.500 que Santos alega ter salvo.

O grupo não estava registrado como uma organização de resgate no estado de Nova York e não havia registro de que estivesse autorizado a retirar cães de abrigos da Prefeitura de Nova York. E várias pessoas questionam a forma como Santos lidou com os recursos de seu grupo, dizendo que nunca receberam os milhares de dólares que ele levantou em seu nome, muitas vezes por meio do GoFundMe.

Regina Spadavecchia, que dirige o abrigo animal Adore-a-Bullie Paws and Claws, no Bronx, diz que Santos se vangloriava de sua capacidade de arrecadar verba, dizendo ser um gerente financeiro com conexões. Na verdade, ele tinha trabalhado para uma empresa hoteleira com sede na Turquia, passando a trabalhar em uma pequena empresa que organizava conferências para investidores e gestores de fundos.

Spadavecchia acreditou em suas afirmações e, com pelo menos uma dúzia de cães sob seus cuidados, estava ansiosa pela ajuda. Em março de 2017, Santos publicou que estava arrecadando dinheiro para a Adore-a-Bullie, por meio de uma rifa de US$ 5 para um cruzeiro com jantar e ingressos para a Broadway.

Mas ele nunca cumpriu totalmente suas promessas, diz Spadavecchia, enviando a ela cerca de US$ 400 em vez dos milhares de dólares que havia sugerido. Ela decidiu cortar relações. "Se você está arrecadando verba em meu nome e afirma que pode ganhar alguns milhares e me envia US$ 400, algo está errado. Ou você está se gabando de coisas que não pode fazer ou está pegando o dinheiro. Não sei."

Cães e gatos carentes

Em outubro de 2015, Santos usou uma das primeiras postagens da instituição no Facebook para se gabar de que o grupo havia participado de 20 adoções em seus dois meses de operação —sua biografia indicava que o grupo começou a trabalhar em 2013.

Capturas de tela do grupo do Facebook fornecidas ao The New York Times mostram que Santos com frequência republicava fotos de outros resgates ou de outras páginas do Facebook, implorando aos membros do grupo que ajudassem a salvar cães e gatos necessitados.

Monica Cunha, que se conectou pela primeira vez com Santos por uma página para fãs de animais de estimação brasileiros, lembrou que ele pegava cães cujos donos não podiam mais cuidar deles e tentava encontrar novos lares. Mas ela disse que ele raramente publicava detalhes de adoções bem-sucedidas.

Postagens também mostram que Santos arrecadava fundos por meio de páginas do GoFundMe, solicitações diretas para uma conta do PayPal e sorteios. Nessas solicitações, ele sempre se referiu à instituição de caridade como uma organização isenta de impostos.

No entanto, autoridades federais e estaduais não encontraram registros de uma instituição de caridade registrada como Friends of Pets United. O Departamento de Agricultura e Mercados de Nova York disse não ter informações de que a organização foi registrada como um abrigo, como seria exigido a partir de setembro de 2017.

O Animal Care Centers of NYC, empresa contratada pela prefeitura para serviços relacionados a animais, disse que não tinha registro de trabalho com a Friends of Pets United nem qualquer indicação de que tal grupo estivesse autorizado a retirar cães de seus abrigos.

Santos não explicou suas descrições sobre o status da instituição beneficente. Ele também tinha ligações com um abrigo de animais na Carolina do Sul, o Berkeley Animal Center. Jenna-Ley Jamison, porta-voz da entidade, diz que os registros do abrigo mostram que ele enviou apenas dois cães para o Friends of Pets United, em dezembro de 2017.

Judi Eskenazi, que já ajudou a administrar um abrigo de animais em Nova Jersey, afirma que Santos lhe pediu em 2018 para ajudá-lo com seis cães que ele havia tirado de um abrigo na Carolina do Sul. Uma amiga dela em outro abrigo levou os animais. Na época, Santos disse que estava fechando seu abrigo. Meses depois, ele voltou com uma história parecida: estava prestes a fechar e precisava colocar seus últimos animais restantes. Ele repetiria o discurso ao longo do ano.

Em dezembro, Eskenazi estava cansada dos pedidos e começou a falar sobre isso com uma amiga que dirigia um abrigo de animais e tinha experiências semelhantes. Essa amiga decidiu investigar o Friends of Pets United e o homem por trás dele, Anthony Devolder. Dias depois, enviou uma mensagem para Eskenazi. "Espere, isso é muito estranho. Tenho quase certeza de que o nome dele, na verdade, é George."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves 

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