Mísseis dos EUA para a Ucrânia diluem ainda mais a linha vermelha de Putin

Depois de tanques, Zelenski deve ganhar armas que podem atingir Crimeia; ele quer agora caças

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São Paulo

Os Estados Unidos voltaram a diluir a linha vermelha estabelecida pelo governo de Vladimir Putin acerca de seu apoio militar à Ucrânia no combate à invasão russa, que completa um ano no próximo dia 24. A reação do Kremlin mostra que a aposta ocidental parece estar dando certo até aqui.

De acordo com a agência de notícias Reuters, um novo pacote de US$ 1,75 bilhão (R$ 8,8 bilhões) em armamentos está sendo montado nos EUA. Ele inclui uma nova arma desenvolvida pela Boeing americana e pela Saab sueca, a GLSDB (sigla em inglês para bomba de pequeno diâmetro lançada do solo).

Ucranianos em blindados de infantaria soviéticos BMP-2 em estada da região de Donetsk
Ucranianos em blindados de infantaria soviéticos BMP-2 em estada da região de Donetsk - Yasuyoshi Chiba - 30.jan.2023/AFP

Trata-se de uma arma inovadora: um foguete é acoplado a munições antigas, transformando-se em um pequeno míssil que pode atingir alvos a até 150 km —suficiente para, se disparados das principais linhas de frente do conflito, acertar todas as áreas ocupadas por Moscou, a fronteira da Crimeia anexada e, algo que Kiev sempre promete não fazer, cidades na Rússia.

Hoje, os foguetes lançados pelos sistemas americanos Himars são de modelos com até 80 km de alcance, o máximo que a Ucrânia opera. Os GLSDB não chegam ao nível dos ATACMS (Sistema de Míssil Tático do Exército), com 300 km de alcance, mas em teoria violariam a linha estabelecida pelo Kremlin em setembro.

As novas armas têm uma vantagem crucial. Como são feitas com munições antigas, seu custo é baixo, de US$ 40 mil (R$ 203 mil) por peça —um míssil ATACMS custa US$ 1 milhão (R$ 5 milhões). A Ucrânia já dispõe das plataformas de lançamento do GLSDB, como o sistema M270 americano.

O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, foi instado a comentar o tema. A resposta começou pela usual crítica à escalada militar ocidental, mas ele completou: "Isso não vai mudar o rumo dos eventos".

Das duas, uma. Ou a Rússia está confiante de que sua ofensiva no leste do país pode gerar um avanço definitivo para tomar Donetsk, a menos controlada das quatro áreas anexadas ilegalmente em setembro, ou apenas está aceitando realidades.

Ao longo dos meses, a resposta padrão de Moscou foi a de se queixar da escalada ocidental e, aqui e ali, fazer ameaça do risco de um conflito nuclear com as forças da Otan, a aliança militar ocidental.

Assim, o fornecimento de armas foi de mísseis portáteis antitanques para sistemas de artilharia, baterias antiaéreas e, na semana passada, a formação de uma coalizão de países dispostos a entregar tanques de guerra para Kiev. Na terça-feira (31), o governo de Volodimir Zelenski estimou em 140 blindados do tipo o tamanho do envio em uma primeira leva, mas é preciso um grão de sal para avaliar essa projeção.

Tudo dependerá do tempo de preparo dos tanques, da formação de equipes, levando em conta que a maioria deles será de alemães Leopard-2 usados por países europeus, mas que britânicos prometem 14 Challenger-2, e americanos, 31 complexos M1 Abrams. Ou seja, treinamentos e logísticas à parte.

Como o rugido russo tem ficado nisso, contudo, o Ocidente está acelerando suas tratativas para transformar a Ucrânia numa fortaleza armada. Resta saber se o objetivo é forçar uma negociação com os russos, o que é mais provável, ou para de fato tentar dar uma vitória militar a Kiev —algo mais difícil, em especial quando Zelenski diz que isso só viria com o retorno da Crimeia, anexada há nove anos.

O próximo passo são caças. Como disse o secretário de Defesa britânico, Ben Wallace, o lobby ucraniano por armas sempre passa por três etapas no Ocidente: o "não", o "vamos estudar" e o "concordamos".

EUA, Reino Unido e Alemanha já disseram ser contra o plano polonês de enviar alguns de seus 48 caças americanos F-16 para Kiev —algo que também demandaria treinamento e logística cara. No ano passado, Washington já havia vetado a transferência de 28 caças soviéticos MiG-29, que os ucranianos já operam.

A Força Aérea de Kiev sobrevive aos trancos e barrancos. Segundo o site de observação de dados abertos holandês Oryx, os ucranianos já perderam 57 dos seus 124 aviões de combate no conflito.

A França, por outro lado, está na etapa dois da conversa, tendo dito que estuda a possibilidade de fornecer caças mais antigos, talvez do modelo Mirage. Mas não há nenhum acerto, disse Emmanuel Macron, que condicionou qualquer avanço à promessa irrealista de que Kiev não avançaria sobre o espaço aéreo russo.

Na sexta (3), Zelenski fará o que chamou de cúpula com representantes da União Europeia, bloco no qual gostaria de ingressar. Lá, prometerá reformas na corrupta estrutura política de seu país, que passou por um expurgo na semana passada. Será mais uma oportunidade para reforçar seu lobby por armas, que até aqui já levou só dos EUA quase US$ 30 bilhões —quase dez vezes seu orçamento de defesa pré-guerra.

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