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Financial Times China

Ambições de Xi Jinping para Taiwan põem ascensão da China em risco

Pequim está visivelmente se preparando para invadir a ilha que considera uma província rebelde

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Gideon Rachman

Colunista-chefe de relações exteriores do jornal nipo-britânico Financial Times

Financial Times

"Esconda seu brilho, aguarde a hora certa." Esse conselho famoso de Deng Xiaoping tem sido útil para a China nos últimos 40 anos. Deng, o líder cuja política econômica transformou a China, entendeu que, para seu país ficar mais rico e forte, precisava evitar um confronto com o Ocidente.

Mas Xi Jinping, que lidera a China desde 2012, decidiu que o tempo de "aguardar a hora certa" acabou. Ele fala de uma China que "ousa lutar". Mesmo que não queira dizer literalmente que seu país deve ir à guerra, já assinalou com palavras e atos que Pequim está preparada para enfrentar seus rivais internacionais.

O presidente dos EUA, Joe Biden, e o líder chinês, Xi Jinping, se encontram na Cúpula do G20, na Indonésia
O presidente dos EUA, Joe Biden, e o líder chinês, Xi Jinping, se encontram na Cúpula do G20, na Indonésia - Saul Loeb - 14.nov.22/AFP

Xi argumenta que sua política é uma resposta à agressão americana. No discurso em que exortou os chineses a "ousar lutar", acusou os EUA de seguirem a política de "contenção e supressão" da China.

Mas o diagnóstico que Xi faz da situação da China está equivocado em três pontos cruciais. Ele faz uma leitura equivocada das intenções dos Estados Unidos. Superestima a ameaça que as políticas de Washington representam à economia chinesa. E subestima os riscos de um confronto.

Autoridades e estudiosos chineses frequentemente argumentam reservadamente que os EUA estariam tentando frustrar a ascensão de seu país, atraindo a China para uma guerra em torno de Taiwan. Mas, mesmo que tal armadilha estivesse sendo armada por Washington (não está), haveria uma maneira fácil de evitá-la. Xi simplesmente precisa se abster de atacar Taiwan ou submeter a ilha a um bloqueio.

Como os japoneses antes da Segunda Guerra Mundial, os chineses reclamam que os EUA estariam tentando estrangular sua economia. Washington nega qualquer intenção desse tipo, argumentando que suas restrições a exportações de tecnologia visam estritamente a capacidade bélica chinesa. Mas, mesmo que a Casa Branca tivesse um plano mais amplo para frustrar o crescimento econômico da China, qualquer esforço nesse sentido provavelmente seria infrutífero.

Como a maioria dos países, a China tem sua devida parcela de problemas. Mas sua ascensão econômica é impressionante, mesmo assim. Neste ano a China está projetada para se tornar a maior exportadora mundial de carros, passando à frente do Japão. A China está se saindo especialmente bem com os veículos eletrônicos que vão dominar o futuro. Bill Gates argumenta que as proibições americanas à exportação de tecnologia provavelmente serão contraproducentes, incentivando a China a desenvolver suas próprias capacidades em muito menos tempo. O fundador da Microsoft me disse recentemente: "Acho que os Estados Unidos nunca vão conseguir impedir a China de produzir ótimos chips".

Os CEOs de algumas das empresas mais poderosas do Ocidente, como Tim Cook, da Apple, já deixaram muito claro que não pretendem se afastar da China. Como marxista autodeclarado, Xi deveria entender que o poder político global deriva do poder econômico. A China não precisa vencer uma guerra de tiros para ampliar seu poder e influência internacionais. O comércio, a assistência e os investimentos darão conta disso, sem envolver os riscos e o derramamento de sangue de uma guerra.

Há mais de 120 países pelo mundo afora cujo maior parceiro comercial é a China –muito mais que os Estados Unidos. Esse fato confere influência considerável à China.

Os EUA estão frustrados porque muitos países do Sul Global estão em cima do muro com relação à Guerra da Ucrânia. Mas os países que procuram a China cada vez mais para comércio e investimentos, como Brasil ou Indonésia, vão ouvir Pequim pelo menos tão atentamente quanto ouvem Washington em grandes questões internacionais. E isso se aplica ainda mais a países que já estão fortemente endividados com a China, como Sri Lanka, Paquistão, Angola ou Zâmbia.

A capacidade chinesa de construção de nova infraestrutura também constrói influência. Um representante dos EUA lamenta que Washington não pode competir com as grandes somas de dinheiro que Pequim desembolsa no Sudeste Asiático. E a influência da China se estende para muito mais longe que sua vizinhança. Empresas chinesas estão construindo redes de metrô nas capitais do Egito e da Colômbia.

Então o que poderia dar errado? A resposta é evidente: uma guerra. A China está visivelmente se preparando para invadir Taiwan. O discurso nacionalista de Xi está criando um misto perigoso de soberba e paranoia em Pequim. O acadêmico Tong Zhao receia que o líder chinês esteja encurralando a si mesmo.

Mas, se Xi puxasse o gatilho em Taiwan –e se os EUA interviessem no conflito, como o presidente Joe Biden já prometeu—, o líder chinês terá dado início a uma Terceira Guerra Mundial, com consequências incalculáveis para seu próprio país e para o mundo mais amplo.

Mesmo que Taiwan capitulasse em pouco tempo ou que os EUA não interviessem, a imagem global da China seria transformada para sempre. Todo país ou empresa ocidental que atualmente está em cima do muro em relação à China teria de participar de um regime de sanções rigorosas. A economia globalizada se dividiria em pedaços, com custos imensos para todos os envolvidos.

Apesar dos riscos, é possível que Xi pense que uma conquista bem-sucedida de Taiwan lhe garantiria um lugar nos livros de história como o líder que completou o "grande rejuvenescimento do povo chinês".

Mas os líderes preocupados com seus legados frequentemente constatam que os acontecimentos avançam e saem de seu controle. Vladimir Putin é o mais recente líder ditatorial a ver suas esperanças de uma guerra curta e gloriosa darem tremendamente errado. Putin liderava um país que já não pode aspirar ao status de grande potência com base em seu poderio econômico. Xi ainda tem esse caminho econômico à grandeza nacional aberto à sua frente. Ele deveria segui-lo.

Tradução de Clara Allain

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