O embaixador dos Estados Unidos na África do Sul afirmou nesta quinta-feira (11) que um navio russo partiu carregado de armas e munições da base naval de Simon's Town, perto da Cidade do Cabo, no início de dezembro do ano passado —o que colocaria em xeque a neutralidade do país na Guerra da Ucrânia.
"A África do Sul armar a Rússia com uma embarcação é fundamentalmente inaceitável", disse o representante americano na nação africana, Reuben Brigety. As autoridades dos EUA, acrescentou, têm "profundas preocupações" com o fato de o país não respeitar a própria política declarada de neutralidade em relação ao conflito em curso. A postura "não nos sugere as ações de um país não alinhado", disse ele.
Desde o início da guerra, Washington vem alertando que o apoio material à Rússia poderia ser punido com bloqueio aos principais mercados do mundo. A mera conjectura de um cenário como esse fez o rand sul-africano se desvalorizar nesta sexta —negociadores disseram estar preocupados com possíveis sanções.
Tal risco fez as autoridades do país se mobilizarem para tentar apagar o incêndio nesta sexta-feira (12).
A princípio, o presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, não confirmou nem negou o carregamento ao ser questionado no Parlamento por um líder da oposição. Mais tarde, porém, seu gabinete informou que o governo está abrindo um inquérito independente liderado por um juiz aposentado sobre a alegação.
A Presidência disse ainda que o suposto carregamento já havia sido discutido com os EUA, que teriam concordado com uma apuração. O chefe do Executivo sustenta, porém, que nenhuma evidência foi dada por Washington. "Os comentários do embaixador minam o espírito de parceria que caracteriza os recentes compromissos entre funcionários dos EUA e uma delegação sul-africana", disse o gabinete em nota.
O presidente foi seguido por membros do alto escalão do governo. Nesta sexta, o ministro das Comunicações, Mondli Gungubele, que presidia o comitê de controle de armas quando ocorreu o suposto embarque para a Rússia, disse à rádio 702 que nenhum envio foi aprovado para Moscou. Clayson Monyela, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, disse no Twitter que falaria com o embaixador dos EUA.
Nem Gungbele nem Monyela confirmaram se uma remessa clandestina havia saído da África do Sul.
Segundo o Tesouro dos EUA, o navio que atracou em Simon's Town se chama Lady R e está na lista de sanções de Washington desde maio do ano passado por supostos embarques de armas. Em dezembro, na época do episódio, o político da oposição Kobus Marais afirmou que havia evidências de uma atividade incomum no porto envolvendo um navio comercial russo.
A África do Sul, um dos aliados mais importantes da Rússia num continente dividido em razão da invasão da Ucrânia, diz ser imparcial no conflito e se absteve de votar na ONU em resoluções sobre a guerra.
Esse não é o primeiro imbróglio em que o país entra devido ao conflito. Em abril, Ramaphosa afirmou a jornalistas que o país estava se retirando do TPI (Tribunal Penal Internacional) devido ao que chamou de "tratamento injusto" só para, horas depois, o porta-voz da Presidência recuar da declaração.
Por trás da falha de comunicação estava a possível visita do presidente russo, Vladimir Putin, em agosto —como membro do TPI, o país africano teria a obrigação de prender uma pessoa que está em seu território e foi alvo de mandado de prisão pelo tribunal, caso do líder russo.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.