Descrição de chapéu forças armadas

Exército do Níger apoia golpe e reduz expectativa de presidente voltar ao poder

Postagem da Presidência depois apagada afirmava que Forças Armadas estavam prontas para agir em sua defesa

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Niamei (Níger) | AFP e Reuters

As Forças Armadas do Níger declararam nesta quinta (27) apoio ao golpe de Estado que depôs o presidente Mohamed Bazoum na véspera, diminuindo as chances de que o líder, o primeiro eleito democraticamente no país do Sahel, retome o poder.

O anúncio foi feito num comunicado assinado pelo chefe do Estado-Maior do Exército. O órgão afirma que decidiu apoiar o golpe buscando "preservar a integridade física" do presidente e de sua família e "evitar um confronto" que poderia levar a um "banho de sangue e afetar a segurança da população".

Em frente à Assembleia Nacional na capital do país, Niamei, apoiadores das Forças Armadas do Níger se manifestam a favor do golpe que retirou o presidente Mohamed Bazoum
Em frente à Assembleia Nacional na capital do país, Niamei, apoiadores das Forças Armadas do Níger se manifestam a favor do golpe que retirou o presidente Mohamed Bazoum - AFP

O golpe se deu na quarta-feira, quando membros da Guarda Presidencial isolaram o palácio que funciona como sede do governo e impediram a saída de Bazoum. À noite, o coronel Amadou Abdramane, da Força Aérea, fez um pronunciamento na TV no qual afirmou que as forças de segurança haviam tomado o poder, segundo ele uma reação ao aumento da violência e à má governança da atual gestão.

Em um escritório e cercado por nove soldados fardados, ele ainda decretou o fechamento das fronteiras do país e suspendeu todas as atividades políticas, além de ter estabelecido um toque de recolher.

Militares no Níger, com Amadou Adramane à frente, fazem pronunciamento em rede nacional de TV para anunciar que depuseram o presidente
Militares no Níger, com Amadou Adramane à frente, fazem pronunciamento em rede nacional de TV para anunciar que depuseram o presidente - 26.jul.23/ORTN via Reuters

Na manhã daquele mesmo dia, a Presidência do Níger havia publicado um post nas redes sociais em que afirmava que o Exército estava pronto para agir caso os guardas se recusassem a mudar de postura. A publicação posteriormente foi apagada.

Nesta quinta-feira, os militares anunciaram que respeitarão o bem-estar de Bazoum e desaconselharam qualquer tentativa de intervenção estrangeira. Entre os órgãos multilaterais que haviam condenado o golpe na véspera estavam a ONU, a União Europeia, a União Africana e a Cedeao (Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental). Em nota, o Brasil se juntou às duas últimas entidades e pediu que o país retome plenamente sua institucionalidade democrática.

Enquanto isso, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, exigiu a liberação imediata de Bazoum e afirmou que a cooperação dos Estados Unidos com o país africano exigia que ele continuasse a ser uma democracia. E o presidente do Benin, Patrice Talon, voou até a nação vizinha para tentar mediar um acordo entre os militares e a Presidência —não se sabe o resultado da conversa.

Internamente, a situação segue incerta. Nesta quinta, Bazoum se comprometeu a proteger a democracia do país, "tão arduamente conquistada", em post em rede social. Hassoumi Massoudou, chefe do governo interino e também chanceler, apoiou o presidente deposto e disse que "o poder legal e legítimo" ainda é exercido por ele.

No mesmo dia, porém, centenas de apoiadores dos militares se reuniram em frente à Assembleia Nacional e tocaram canções do Exército. Em seguida, invadiram e atearam fogo à sede do partido governista. Colunas de fumaça preta surgiram sobre o edifício, e os manifestantes foram dispersados pela polícia com bombas de gás lacrimogêneo.

Alguns dos presentes no ato entoavam slogans contra a França, reflexo da crescente onda local de ressentimento em relação à sua antiga metrópole. O golpe no Níger, o sétimo na região desde 2020, pode dificultar ainda mais as ações do governo de Emmanuel Macron e de outras potências ocidentais na área —a nação era o maior parceiro do Ocidente no combate à migração irregular na África Subsaariana.

O governo Bazoum ainda era um aliado importante da Europa e dos EUA na luta contra os ataques de grupos terroristas islâmicos que se espalharam pela região nos últimos anos. O presidente da Cedeao, Omar Touray, afirmou ao Conselho de Segurança da ONU esta semana que os países que compõem o bloco registraram, juntos, ao menos 1.800 ataques terroristas no primeiro semestre deste ano, causando mais de 4.000 mortes e forçando 6,5 milhões de pessoas a saírem de seus lares, seja mudando-se dentro de seus próprios países ou para o exterior.

"Bazoum era a única esperança do Ocidente na região", resumiu Ulf Laessing, chefe do programa para o Sahel do think tank alemão Konrad-Adenauer-Stiftung, à agência de notícias Reuters. "França, EUA e União Europeia gastaram muitos dos recursos voltados para a região para fortalecer o Níger e suas forças de segurança."

O Níger estaria trilhando o mesmo caminho que Mali e Burkina Fasso, tomados por militares em 2020 e 2022, respectivamente. Ambos cortaram laços com seus tradicionais aliados ocidentais desde então. A França, que mantinha tropas em ambos os países, por exemplo, retirou-as de lá após crescentes tensões com autoridades interinas —os soldados alocados no Mali haviam sido enviados justamente para o Níger no ano passado.

Abdramane afirmou que, na manhã desta quinta-feira, uma aeronave militar francesa aterrissou no país a despeito do fechamento do espaço aéreo que ele havia imposto na véspera. Os ministérios da Defesa e das Relações Exteriores da França não comentaram a afirmação.

Não se sabe, no entanto, se assim como Mali e Burkina Fasso, o Níger se aproximará da Rússia. Embora vários dos presentes na manifestação em frente à Assembleia Nacional desta quinta portassem bandeiras do país de Vladimir Putin, seu chanceler, Serguei Lavrov, afirmou à agência de notícias estatal Tass que a ordem constitucional do país precisa ser restaurada.

Moscou se faz presente em muitas das nações do Sahel especialmente por meio da atuação do grupo mercenário Wagner, o mesmo que, no final de junho passado, capitaneou um motim armado na Rússia, abrindo a maior crise doméstica já enfrentada por Vladimir Putin em suas duas décadas no poder.

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