Descrição de chapéu The New York Times China

Xi troca líderes da Força de Foguetes e gera suspeita de corrupção em Pequim

Especialistas preveem obstáculos à modernização de armas nucleares em meio a instabilidade no alto escalão

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Chris Buckley
Taipé | The New York Times

Nos anos passados desde que Xi Jinping transformou o Exército de Libertação Popular (ELP), uma de suas criações mais bem-sucedidas foi a Força de Foguetes, guardiã do crescente arsenal nuclear chinês. Com seus mísseis e silos de lançamento, a força encarnava as ambições de Xi de elevar seu país à condição de uma grande potência respeitada, temida e preparada para fazer frente à supremacia dos Estados Unidos na região.

Nsta semana, porém, Xi afastou repentinamente os dois principais comandantes da Força de Foguetes, colocando em seus lugares figuras externas sem experiência alguma na força nuclear. Foi a reorganização de mais alto nível promovida nas Forças Armadas chinesas em mais de cinco anos. A iniciativa foi tomada no momento em que a China também enfrenta perguntas sobre o paradeiro de seu ex-chanceler, Qin Gang, que desapareceu das vistas públicas no final de junho e então foi substituído sem explicações.

Xi Jinping rodeado de líderes militares em foto oficial
Xi Jinping, o líder da China, revelou o novo comandante da Força de Foguetes, Wang Houbin (canto superior esquerdo), e seu novo comissário político, Xu Xisheng (canto superior direito), em Pequim - Li Gang - 31.jul.23/Xinhua

A reorganização da Força de Foguetes indicou que sua expansão foi acompanhada por problemas sérios em escalões superiores. Suspeitas de corrupção ou de falta de lealdade a Xi Jinping podem atrasar ou complicar a modernização dos mísseis convencionais e nucleares da China, disseram vários especialistas.

"Imagino que isso possa tumultuar a modernização", disse David C. Logan, professor assistente na Escola Fletcher da Universidade Tufts, nos EUA, que estuda a Força de Foguetes e a modernização das armas nucleares chinesas. "A instabilidade nos escalões seniores nunca é uma coisa boa quando você está promovendo transformações de grande escala, e as mudanças que estão sendo efetuadas na Força de Foguetes são significativas. Além disso, sua liderança sênior agora parece possuir pouca experiência relevante às forças de mísseis."

As razões do afastamento dos ex-comandantes da Força de Foguetes chinesa –o general Li Yuchao e seu vice, general Liu Guangbin— não estão claras. A Força divulga pouquíssima informação, mesmo para os padrões de opacidade dos militares chineses. Os dois homens não haviam sido mencionados na mídia oficial havia meses.

A ausência deles desencadeou uma onda de especulação, incluindo rumores de que um deles ou ambos teriam sido recrutados como espiões e alegações de corrupção que foram divulgadas na semana passada no South China Morning Post, um jornal de Hong Kong. Vários analistas disseram que corrupção envolvendo os grandes gastos da Força com mísseis, silos e tecnologia parecia a causa mais provável da queda dos dois líderes.

"Há muito dinheiro sendo direcionado à Força de Foguetes do Exército de Libertação Popular neste momento, quando ela ampliou sua infraestrutura, especialmente seus silos nucleares", comentou Matt Bruzzese, analista da consultoria BluePath Labs, de Washington, que escreveu um estudo recente sobre a Força de Foguetes. "Historicamente falando, o uso de colaboradores externos para realizar trabalhos tem sido uma via importante de corrupção no ELP."

Lançamento de míssil em meio a paisagem florestal
Lançamento de míssil do Comando do Teatro Oriental do Exército de Libertação Popular (ELP), em Nanjing, na China - 4.ago.22/Xinhua

Além do desaparecimento de Li e Liu, a notícia da morte de Wu Guohua, ex-vice-comandante da Força, também alimentou as especulações sobre investigações sobre corrupção. Um site de notícias chinês divulgou reportagem dizendo que Wu teria morrido de câncer, mas a reportagem foi tirada do ar, inspirando mais especulações não corroboradas de que a morte de Wu teria sido suspeita.

E na semana passada o departamento responsável pela aquisição de equipamentos e materiais para as Forças Armadas chinesas lançou um pedido de informação sobre possível corrupção em contratos firmados de 2017 em diante.

Seja qual for a causa, a iniciativa de Xi de substituir os líderes da Força sugere que ele está ansioso para reforçar seu domínio sobre ela. Xi instalou os dois novos chefes na última segunda-feira (31). O novo comandante, Wang Houbin, foi vice-comandante na Marinha; o novo vice, Xu Xisheng –comissário político da Força que é responsável por questões disciplinares e de pessoal— veio da Força Aérea.

"Quando os dois vêm de fora da Força de Foguetes, e isso na esteira de um expurgo, isso é claramente sinal de que Xi considera que a corrupção tem raízes profundas e que ele não pode confiar em nenhum dos nomes subalternos da Força para assumirem o comando", disse Bruzzese.

A possibilidade de corrupção ou deslealdade no alto escalão da Força de Foguetes provavelmente será especialmente dolorosa para Xi Jinping. Depois de chegar ao poder, em 2012, ele converteu em prioridade de sua liderança o esforço de acabar com a corrupção deslavada nas Forças Armadas e declarou esse esforço uma de suas grandes vitórias.

Agora é possível que o mesmo tipo de má conduta tenha voltado à tona, e isso em um ramo especialmente sensível das Forças Armadas. Dúvidas sobre a integridade dos comandantes da Força de Foguetes poderiam levar a questionamentos sobre a possibilidade de os mísseis nucleares e a infraestrutura chineses terem sido comprometidos.

"Uma mudança tão drástica de pessoal é altamente fora do normal", comentou Ying Yu Lin, professor adjunto na Universidade Tamkang, em Taiwan, que estuda as Forças Armadas chinesas. Ele acrescentou que Xi viu como os fracassos da Rússia em sua invasão da Ucrânia refletiram em parte a corrupção e bravatas infundadas de generais russos. "Com a Força de Foguetes virando alvo de atenção renovada, será que vão descobrir mais e mais problemas também?"

Tradução de Clara Allain

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