Henry Kissinger foi secretário de Estado dos EUA há meio século, mas nunca deixou o cargo

Diplomata, que morreu aos 100 anos, manteve até o fim contato com várias autoridades

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Pequim | The New York Times

Quando Henry Kissinger completou 100 anos em maio, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, brindou a ele numa celebração de aniversário em Nova York, e o diretor da CIA, William Burns, fez o mesmo em outra celebração em Washington.

Havia uma razão: Kissinger conseguiu manter seu papel como conselheiro dos principais formuladores de políticas de Washington meio século depois de deixar o cargo, muitas vezes porque o que ele fez décadas atrás continuava relevante para as crises de hoje.

Henry Kissinger sorri durante cerimônia em sua homenagem na cidade de Washington
Henry Kissinger sorri durante cerimônia em sua homenagem na cidade de Washington - Brendan Smialowski - 9.mai.2016/AFP

Kissinger falava regularmente com Blinken, inclusive até o mês passado. Ele também havia aconselhado secretários de Estado anteriores, incluindo Condoleezza Rice, Hillary Clinton (que foi criticada por essas conversas durante sua campanha presidencial), John Kerry e Mike Pompeo. Mas ele não era um aposentado relembrando os bons tempos. Em vez disso, permaneceu como uma espécie de intermediário supremo, especialmente para líderes na China.

Em julho, Kissinger voou secretamente para a China —de jato particular, já que é um voo árduo mesmo se você não tiver 100 anos— a convite do líder Xi Jinping, que o chamou de "velho amigo" e, durante um longo jantar, disse a ele que "as relações entre Pequim e Washington estarão para sempre ligadas ao nome 'Kissinger'".

Foi um movimento calculado. Xi estava deixando claro que queria voltar à proximidade que cercou a abertura do presidente Richard Nixon a Pequim no início dos anos 1970, engendrada por Kissinger em intercâmbios secretos e uma notável viagem também secreta à China. E a visita de julho ajudou a preparar a cúpula de Xi com o presidente Joe Biden na Califórnia, neste mês.

Na mesma viagem, Kissinger foi celebrado na embaixada dos Estados Unidos, onde Nicholas Burns, o atual embaixador, mora em uma casa em que o ex-secretário de Estado ajudou a construir quando Washington tinha um representante na China, mas o reconhecimento diplomático completo ainda não havia acontecido.

Kissinger se encontrou com a vasta equipe da embaixada, falando sobre como foi o processo de abertura do relacionamento —em uma época em que parecia inconcebível que a China se tornasse a segunda maior economia do mundo.

As conversas de Kissinger com secretários de Estado e presidentes não se limitaram a navegar na espiral descendente das relações com Pequim. Ele estava envolvido em discussões estratégicas sobre a Rússia, com quem negociou o Salt-1, um importante tratado de controle de armas. Também opinou sobre inteligência artificial, uma de suas paixões nos últimos anos e um assunto sobre o qual escreveu extensivamente, muitas vezes com Eric Schmidt, ex-CEO do Google que se aproximou do ex-secretário de Estado.

Para muitos críticos de Kissinger, esse fervor em permanecer envolvido, décadas depois de se aposentar, mostrava uma sede de poder ou um esforço para melhorar sua reputação, que ele sabia estar manchada por acusações de ter perdoado massacres, bombardeios e a morte de milhares quando isso servia a seus propósitos diplomáticos.

Mas a razão pela qual seu conselho era procurado vai à profundidade de sua experiência: quando Kissinger morreu na quarta-feira (29), Blinken estava a caminho de Israel na tentativa de obter uma pausa mais longa em um conflito sangrento. Kissinger havia voado pelo mesmo caminho, em novembro de 1973, exatamente 50 anos atrás, durante sua famosa diplomacia de vaivém.

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