Lula eleva tom contra Israel após resgate de brasileiros e agravamento do conflito

Integrantes do governo citam ajuste de discurso por piora na crise humanitária; presidente também critica o Hamas por ataques terroristas

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Brasília

O presidente Lula (PT) elevou o tom contra Israel nos últimos dias, após o resgate de brasileiros que estavam impedidos de sair da Faixa de Gaza e diante do agravamento da crise humanitária no conflito entre o país e o grupo terrorista Hamas.

A reação do chefe do Executivo vem escalando, de acordo com integrantes do governo, conforme a guerra se arrasta e diante do aumento vertiginoso no número de mortos palestinos. Auxiliares usam reservadamente palavras como "massacre" e mencionam casos de desrespeito ao direito humanitário por parte de Israel.

Em 7 de outubro, o grupo terrorista Hamas matou ao menos 1.200 pessoas em Israel, dando início à nova guerra na região. A reação de Israel já deixou mais de 11,5 mil mortos palestinos, segundo autoridades locais. Há ainda mais de 200 reféns capturados pelo Hamas durante o ataque em território israelense.

O presidente Lula, na base aérea da FAB, em Brasília, para receber brasileiros que estavam na Faixa de Gaza - Ueslei Marcelino - 14.nov.23/Reuters

Logo no primeiro dia do conflito, Lula se disse chocado e classificou os ataques do Hamas de ações terroristas. Mas o chefe do Executivo também acumula declarações críticas a Israel. Na mais recente, disse que Tel Aviv também está cometendo atos de terrorismo.

Segundo auxiliares palacianos, a principal prioridade do governo era, desde o início do conflito, a retirada em segurança dos brasileiros da região. Mais de 1.400 pessoas foram repatriadas de Israel e da Cisjordânia, mas um grupo permanecia na Faixa de Gaza —centro do conflito— e estava impedida de deixar o território. Os 32 repatriados de Gaza finalmente chegaram na base aérea de Brasília no final da noite de segunda (13), após intensas negociações com os atores na região, principalmente com Israel e Egito.

Na avaliação de um interlocutor de Lula, agora se inicia uma nova fase no conflito para a comunidade internacional. Será o momento, diz, de vocalizar de forma mais assertiva o discurso diplomático sobre a guerra, com críticas ao que ferir a questão humanitária. Ele pondera que existe preocupação de não se exceder e perder a capacidade de atuar como potencial agente de mediação.

Essa expectativa, no entanto, pode ser prejudicada pela retórica cada vez mais crítica de Lula contra Israel.

Durante sua transmissão semanal nesta terça (14), Lula falou sobre a intenção de Israel de ocupar Gaza. "Estou percebendo que Israel parece que quer ocupar a Faixa de Gaza e expulsar os palestinos de lá. Isso não é correto, não é justo. Nós temos que garantir a criação do Estado palestino para que eles possam viver em paz junto com o povo judeu", afirmou o presidente, reiterando a posição histórica da diplomacia brasileira de defender a solução de dois Estados.

A percepção do presidente é, na verdade, um fato. O primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, já mencionou em mais de uma ocasião seu intuito de ocupar Gaza. Diante da repercussão negativa, chegou a recuar da afirmação, mas depois a reiterou.

Há uma avaliação de auxiliares do presidente que o seu discurso se intensificou diante de movimento semelhante da ofensiva israelense em Gaza e do aumento do número de vítimas civis.

A primeira declaração de Lula sobre o conflito foi ainda no dia 7 de outubro, após os ataques do Hamas. Ele foi às redes sociais para se dizer "chocado" e descreveu o ato como "terrorismo", porém sem citar a facção palestina.

"Fiquei chocado com os ataques terroristas realizados hoje contra civis em Israel, que causaram numerosas vítimas. Ao expressar minhas condolências aos familiares das vítimas, reafirmo meu repúdio ao terrorismo em qualquer de suas formas. O Brasil não poupará esforços para evitar a escalada do conflito, inclusive no exercício da Presidência do Conselho de Segurança da ONU", disse o presidente em uma rede social, em referência ao mês de outubro, em que Brasília comandou o colegiado das Nações Unidas.

Pouco mais de um mês depois, Lula disse que "se o Hamas cometeu um ato de terrorismo e fez o que fez, o Estado de Israel também está cometendo vários atos de terrorismo ao não levar em conta que as crianças não estão em guerra".

A declaração do presidente foi dada durante a chegada dos brasileiros que estavam em Gaza, que se queixaram de massacre e pediram ajuda do presidente no resgate de seus parentes na região.

A crítica à morte das crianças no conflito tem sido a tônica dos discursos de Lula sobre a guerra.

Em 20 de outubro, na sua primeira aparição por videoconferência pós-cirurgia, o petista disse que o Hamas cometeu terrorismo, mas que Israel reagiu de "forma insana" ao bombardear desde então a Faixa de Gaza de modo contínuo.

"Hoje quando o programa [Bolsa Família] completa 20 anos, fico lembrando que 1.500 crianças já morreram na Faixa de Gaza", afirmou Lula no vídeo, em referência ao balanço daquele dia, divulgado pelo Ministério da Saúde local, controlado pelo Hamas.

"[Crianças] Que não pediram para o Hamas fazer o ato de loucura que fez, de terrorismo, atacando Israel, mas também não pediram que Israel reagisse de forma insana e as matasse. Exatamente aqueles que não têm nada a ver com a guerra, que só querem viver, brincar, que não tiveram direito de ser crianças", afirmou na ocasião.

Quatro dias depois, ele voltou a mencionar a morte de inocentes em Gaza. Depois, durante café da manhã com imprensa no Palácio do Planalto, disse que Netanyahu, quer "acabar com a Faixa de Gaza".

Segundo o petista, o premiê se esquece que o território palestino não abriga apenas soldados do Hamas, mas também mulheres e crianças, "que são as grandes vítimas desta guerra."

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